Este homem isolou-se numa gruta, sem noção do tempo, e os resultados são curiosos
Poderia ser um episódio (dos leves) de Black Mirror, mas Michel Siffre isolou-se, de facto, numa gruta, a 130 metros abaixo da superfície, sem luz, e sem contacto com o exterior. O curioso procurou perceber como a falta de luz e de noção do tempo afetaria o seu corpo.
Os humanos são seres de rotinas, guiados pelas horas do dia e orientados pelas oscilações comuns da luz do sol. Por estes motivos, Michel Siffre procurou perceber como sentimos verdadeiramente o tempo, isolando-se do mundo inteiro durante dois meses. Decorria o ano de 1962.
Agora com 85 anos, o então geólogo francês viu-se livre do seu relógio de pulso, muniu-se de uma lanterna e viveu, por 63 dias, a 130 metros abaixo da superfície, no fosso de Scarasson, nos Alpes Franceses.
O objetivo da aventura passava por estudar o glaciar, mas acabou por se tornar em algo mais curioso, pelo menos, para os comuns mortais: perceber como a ausência de sinais externos que lembrassem que era noite e dia poderia afetar os ritmos biológicos. O curioso comia e dormia apenas quando o seu corpo lhe dizia para o fazer, em vez de seguir os horários que o mundo segue, normalmente.
De facto, Michel Siffre conseguiu vivenciar uma série de descobertas muito interessantes sobre a forma como os humanos reagem ao facto de viverem sem qualquer informação sobre o tempo - sem relógios, calendários ou luz do sol. Em 1962, o geólogo francês percebeu que o corpo tem o seu próprio relógio, uma ciência atualmente apelidada "cronobiologia".
Surgiu-me uma ideia - uma ideia que se tornou a ideia da minha vida. Decidi viver como um animal, sem relógio, no escuro, sem saber as horas.
Em vez de estudar as grutas, acabei por estudar o tempo. Sim, inventei um protocolo científico simples. Coloquei uma equipa à entrada da gruta. Decidi que os chamaria quando acordasse, quando comesse e antes de ir dormir. A minha equipa não tinha o direito de me chamar, para que eu não fizesse ideia de que horas eram no exterior.
Partilhou Michel Siffre, em 2008, com a Cabinet Magazine, revelando que, "sem saber", criou o campo da cronobiologia humana.
Quais as conclusões deste "estudo"?
Conforme recordou o New Scientist, em 2018, este "estudo" nunca seria permitido hoje em dia. Porém, revelou algumas conclusões interessantes sobre como percecionamos o tempo.
Sob temperaturas negativas e humidade extremamente elevada, Siffre passou dois meses a "ler, escrever e fazer investigação" na gruta, ao mesmo tempo que sonhava acordado com o seu futuro, conforme se lê no LADBible, que recordou esta história, recentemente.
Segundo partilhado pelo próprio, o geólogo estudava-se, fazendo dois testes de cada vez que chamava a sua equipa à superfície. Estes consistiam em medir o pulso e fazer um "teste psicológico".
Tive de contar de 1 a 120, ao ritmo de um dígito por segundo. Com este teste fizemos uma grande descoberta: demorei cinco minutos a contar até 120. Por outras palavras, experimentei psicologicamente cinco minutos reais como se fossem dois.
Explicou Michel Siffre, indicando uma descoberta surpreendente sobre o resultado de viver sem indicações temporais: "O meu tempo psicológico tinha sido comprimido por um fator de dois".
A corroborar a sensação de "abrandamento" do tempo que experienciou, o francês só se apercebeu desta realidade quando os seus colegas o informaram de que tinha finalmente chegado o dia de terminar a experiência. Nesse momento, ele acreditava que ainda lhe restava um mês inteiro.
O geólogo já havia mergulhado, por várias décadas, na desconexão entre o tempo psicológico e um relógio real, e criou a sua própria teoria sobre a razão pela qual isto lhe tinha acontecido na gruta.
Acredito que quando estamos rodeados pela noite - a gruta estava completamente escura, apenas com uma lâmpada - a nossa memória não capta o tempo. Esquecemo-nos. Passados um ou dois dias, não nos lembramos do que fizemos um ou dois dias antes.
As únicas coisas que mudam são a hora de acordar e a hora de ir para a cama. Além disso, é tudo preto. É como se fosse um longo dia.
Partilhou.
Aventuras subterrâneas ajudaram a NASA
Uma vez que os 63 dias que passou abaixo da superfície não foram suficientes, Michel isolou-se, posteriormente, durante meio ano. Nessa experiência, verificou que, sem sinais de tempo, as pessoas se adaptavam a um ciclo de 48 horas em vez do ciclo de 24 horas a que estamos habituados.
Estas conclusões foram de tal forma relevantes que a NASA utilizou os resultados das experiências de Siffre para ajudar os astronautas. Afinal, este já haviam relatado problemas semelhantes de memória a curto prazo após terem sido isolados de referências temporais externas.
Imagem: Reddit
Neste artigo: cronobiologia, Michel Siffre, relógio biológico
Ouvi esta estória na rádio esta manhã. Excelente experiência.
Teriam que testar com mais pessoas antes de chegarem a uma conclusão.
Cada um tem o seu relógio biológico.
Já não é o primeiro estudo neste sentido. Lembro de uma Senhora também ter ficado isolada numa gruta com resultados similares de desconexão temporal.
Era bom era as aulas serem num buraco assim
Já tinha ouvido falar nesta História.