O mundo está numa enorme instabilidade que não se sente só ao nível do solo, mas já chegou mesmo ao espaço. Temos visto grande animosidade entre a Agência Espacial Roscosmos, da Rússia, e alguns ex-astronautas da NASA. No meio do calor da discussão houve mesmo a ameaça de destruição da Estação Espacial Internacional. Agora é a China que está com receios que possa haver uma colisão da ISS.
Um ex-engenheiro de mísseis da China Aerospace Science and Industry Corporation propôs que Pequim considere estabelecer canais de comunicação com a SpaceX e a NASA, talvez uma linha direta, para evitar colisões no espaço.
Espaço conturbado
Ao nível do espaço, as relações entre os países também não estão coerentes. Apesar de haver cooperação em vários projetos e missões, parece haver sim uma paz podre. Depois do caso mais recente entre Dmitry Rogozin da Roscosmos e astronautas da NASA, é a vez da China levantar questões sobre os satélites da rede Starlink, da SpaceX e de eventuais problemas com a Estação Espacial.
O ex-engenheiro de mísseis da China Aerospace Science and Industry Corporation, Wu Riqiang, atualmente professor associado da Escola de Estudos Internacionais da Universidade Renmin, temendo uma “colisão da estação espacial”, propõe que seja criada uma linha direta entre a Agência Espacial da China e a NASA, envolvendo também a SpaceX.
Riqiang sugere esta via direta de comunicação para uma gestão do espaço sideral. Ele refere que não está em causa outra qualquer ideia, rejeitando a teoria de que os militares dos EUA tentaram espiar a China quando os satélites Starlink da SpaceX chegaram muito perto da estação espacial chinesa em julho e outubro.
O que tem preocupado os responsáveis sobre assuntos espaciais são a “quase colisão com os satélites”. Houve já incidentes com estes satélites operados pela empresa aeroespacial SpaceX que foram apontados como “acidentes técnicos”, referiu o ex-engenheiro de mísseis chinês.
Estas preocupações com tais colisões surgiram em dezembro, quando Pequim – numa rara declaração – revelou que dois “encontros próximos” ocorreram em julho e outubro. Os astronautas da estação espacial chinesa Tiangong tiveram que tomar medidas de emergência todas as vezes para evitar a colisão com os satélites Starlink, disse Pequim na época.
Embora o suposto quase acidente tenha sido rejeitado por Musk e posteriormente negado pelos EUA, os incidentes lançam luz sobre as crescentes tensões entre a China e os EUA no espaço – uma nova fronteira na sua grande rivalidade de poder.
Além disso, também levantou questões sobre como os dois países, bem como outras nações que viajam pelo espaço e operadores comerciais, poderiam gerir melhor os riscos de colisão.
China e EUA têm de cooperar na gestão espacial
A China e os EUA estabeleceram um mecanismo de diálogo espacial civil em 2015 e, em 2016, funcionários do Departamento de Estado dos EUA e do Ministério das Relações Exteriores da China reuniram-se pela primeira vez para falar sobre segurança espacial. No entanto, nenhuma reunião foi realizada desde 2017.
À medida que a competição espacial aquece entre os principais rivais geopolíticos do mundo, há pedidos crescentes para que os seus diálogos espaciais sejam retomados, no meio de preocupações de que qualquer acidente se possa transformar num conflito quente entre as duas principais potências militares.
A NASA e os militares dos EUA acumularam uma enorme experiência na gestão de riscos de colisão e impactos potenciais. A China está relativamente atrasada na exploração espacial e, portanto, carece de experiência na partilha de informações detalhadas sobre voos espaciais. Isso também pode explicar em parte por que Pequim não respondeu imediatamente aos dois incidentes da Starlink, apresentando a sua reclamação apenas meses depois.
Escreveu Wu Riqiang num artigo publicado na última edição do World Affairs, jornal afiliado ao Ministério das Relações Externas chinês.
A SpaceX e a NASA assinaram em março passado um acordo de partilha de dados para segurança de voos espaciais – definindo as regras, responsabilidades e procedimentos para coordenação de posições orbitais e planos de manobra. Segundo Wu, a China deve coordenar-se com os EUA para estabelecer um mecanismo semelhante.
Sob o acordo, a NASA também exige que a SpaceX, que atualmente tem cerca de 2.000 satélites em órbita, planeie os lançamentos do Starlink de forma a que fiquem pelo menos 5 km acima ou abaixo dos pontos mais altos e mais baixos da órbita da Estação Espacial Internacional ao redor da Terra.
No mais recente sinal de progresso sobre o assunto, a China anunciou no mês passado que começou – pela primeira vez – a publicar posições orbitais básicas da sua estação espacial no site do China Manned Space office, a agência central encarregada de missões tripuladas.
As autoridades espaciais de ambos os lados até agora comunicaram-se por e-mail sob o Diálogo Estratégico e Económico China-EUA de 2014, um esforço emblemático do governo de Barack Obama para se envolver com Pequim.