O mundo vive tempos complicados e as duas superpotências mundiais estão de costas voltadas e crescem as tenções políticas entre China e EUA. Depois dos balões, agora são os cabos submarinos que poderão estar no centro de mais uma contenda. A primeira baixa parece ser o ambicioso projeto Sea-Me-We 6.
O que é o Sea-Me-We?
Sea-Me-We 6 é uma rede de fibra ótica de alta velocidade de transmissão de dados que liga o continente europeu ao continente asiático, via o continente africano. A sigla “Sea-Me-We” significa “South East Asia – Middle East – Western Europe”.
A Sea-Me-We 6 é uma das mais recentes redes de comunicação submarina que oferece serviços de telecomunicações para empresas, fornecedores de serviços de internet e outras organizações em todo o mundo. A rede fornece uma rota alternativa mais curta e mais confiável para a transferência de dados entre a Europa, Ásia e África, comparada a outras redes de comunicação submarinas existentes.
A obra irá ligar Singapura à França e terá uma largura de banda de 120 Tbps. Uma vez concluída, terá 19.200 km de extensão. O projeto começou já no início de 2022. A previsão é que entre em operação no primeiro trimestre de 2025.
O custo do projeto é de cerca de 500 milhões de dólares.
Tensões entre a China e EUA passam do ar para o fundo do mar
A China deu um passo atrás em relação ao projeto do cabo submarino Sea-Me-We 6, segundo o Financial Times, que relata um cenário complexo – marcado por tensões entre Washington e Pequim, para o qual o sector tecnológico não é de modo algum indiferente – dois dos principais grupos de telecomunicações do gigante asiático decidiram retirarem-se da iniciativa.
Como sempre, quando duas potências estão no centro das atenções, a impacto das suas decisões vai muito além da própria infraestrutura e abre uma nova “guerra” geoestratégica.
Nesse sentido importa entendermos os pormenores.
Então, o que aconteceu?
A China reduziu significativamente a sua participação no Sea-Me-We 6, um projeto de cabo de rede submarina que visa ligar a Ásia à Europa Ocidental. Para ser mais preciso, dois dos seus principais grupos de telecomunicações, China Telecom e China Mobile, decidiram retirar o seu investimento combinado de 20% no ano passado.
O consórcio por detrás da infraestrutura reconhece que a participação das empresas chinesas é “importante”, mas depois qualifica: “mas não crítica”.
Esta mudança de atitude resulta da mudança de estratégia do consórcio Sea-Me-We-6. A organização que incluiu a Microsoft, Orange e Telecom Egypt, optou pela empresa americana SubCom para construir a linha em vez da Hengtong Marine, o maior fabricante de cabos elétricos e fibras óticas do gigante asiático.
A China Unicom, uma empresa estatal muito mais pequena, permaneceria com uma participação não revelada. A informação foi avançada esta semana pelo Financial Times depois de contactar várias fontes próximas do projeto e dos seus desenvolvimentos.
Com mais pessoas a trabalhar e a viver remotamente, ajudará todas as partes a fornecer um acesso mais rápido à banda larga aos utilizadores ao longo desta super-estrada multi-regional de dados.
Disse Yue Meng Fai do comité de gestão do Sea-Me-We 6.
A construção já começou e o objetivo é que esteja concluída e pronta a funcionar até ao primeiro trimestre de 2025, ligando vários países da Ásia e da Europa através da Malásia, Bangladeche, Sri Lanka, Maldivas, Índia, Paquistão, Djibuti, Arábia Saudita e Egipto.
O ponto de rutura
Bem, o desinteresse dos chineses apareceu após a SubCom, com sede nos EUA, ter anunciado no ano passado que tinha um acordo com o consórcio Sea-Me-We 6 e ter mesmo iniciado a sua implementação. A empresa anunciou na altura que iria utilizar o cabo SL17-SDM, que suporta até 24 pares de fibras (FP) e que o projeto seria dividido em três segmentos: um submarino de Tuas (Singapura) a Ras Ghareb (Egipto), outro terrestre a Port Said (Egipto) e um terceiro também submerso que se estenderá até Marselha, em França.
Nessa altura, o consórcio internacional incluía BSCCL, Bharti Airtel, Dhirragu, Djibout Telecom, Mobily, Orange, Singtel, Sri Lanka Telecom, Telecom Egypt, Telin, TM e TWA.
Para além da guerra comercial, da mais recente “guerra dos chips“, assim como as tensões decorrentes dos conflitos na Ucrânia e em Taiwan, há apenas alguns dias, houve o choque causado pela deteção – e subsequente abate – de um alegado balão espião chinês em Montana. O episódio frustrou quase “in extremis” o que teria sido a primeira visita de um alto cargo da administração dos EUA à China em anos.
Mas cabo Sea-Me-We 6 é importante?
É. Tal como as centenas de outros cabos submarinos semelhantes que ligam continentes à Rede, trata-se de uma infraestrutura estratégica. E precisamente por essa razão pode ser afetado pela segurança nacional. Segundo o Financial Times, cerca de 95% de todo o tráfego intercontinental da Internet, incluindo dados, videochamadas e correio eletrónico, é canalizado através de mais de 400 cabos submarinos que se estendem por 1,4 milhões de quilómetros. Esta função dá também um papel fundamental às suas estações.
É esta a primeira vez que isto acontece? Sea-Me-We 6 não é o primeiro projeto do seu género a ser marcado pela geopolítica. Em 2020, o governo de Donald Trump estava a considerar vetar o troço do cabo submarino Pacific Light entre o seu território e Hong Kong por receio de que a China pudesse roubar dados do mesmo. Também não é o primeiro a destacar claramente a importância estratégica destes cabos.
O risco que preocupa os peritos é que as suspeitas mútuas entre Pequim e Washington levem a uma dissociação das infraestruturas, com empresas americanas e chinesas a investirem em sistemas diferentes.