A acessibilidade para todos na Internet: um direito ou um favor?
As tecnologias da informação têm um papel preponderante nas nossas vidas. Tenhamos nós mais ou menos capacidades físicas e intelectuais é importante que a Internet, por exemplo, esteja desenhada para responder às diferentes necessidades dos utilizadores.
Mas será que a Internet responde às exigências de acessibilidade? Vejamos o caso de alguns sites associados a serviços e organismos públicos em Portugal.
Capacidades como a visão ou a audição são ferramentas que nascem e crescem connosco, e que tomamos como garantidas durante boa parte da nossa vida. Infelizmente, essas capacidades podem ser perdidas tão facilmente como nos foram fornecidas, quer pela passagem do tempo, quer por diversas e variadas circunstâncias da vida.
Ambas as situações podem ser (e são) naturalmente contornadas pelo espírito humano, desenhado para ultrapassar e evoluir-se a si próprio dessas mesmas. A evolução do espírito humano também passa pela parte psicológica, onde um normal acesso à informação e à cultura desempenha um papel crucial. Como não podia deixar de ser, este acesso inclui as chamadas Tecnologias da Informação.
No que toca a este ramo da informação, esse acesso é dificultado pelos criadores de conteúdo, que preferem fazer chegar esse mesmo conteúdo aos utilizadores ditos “normais”, apoiados por tecnologias ditas “normais”. Num mundo utópico, esse acesso deveria ser fornecido a todos os utilizadores, sem exceção, com a mesma rapidez, facilidade e apoio.
Os serviços e organismos públicos portugueses na Internet
Assim, é curioso, (ou será chocante a palavra adequada?), que boa parte de todas as páginas portuguesas da Internet, ligadas quer ao Estado, quer aos diferentes serviços que regulam a sociedade portuguesa, como as Finanças, a Segurança Social, a página do Parlamento, o Exército, enfim, serviços criados inicialmente especificamente para assistir todos e qualquer cidadão português em qualquer situação que surja, ou não possuam, ou não exprimam quaisquer intenções de implementar / melhorar, qualquer tipo de suporte no que toca às tecnologias de apoio ao utilizador com incapacidades que impeçam a total compreensão do conteúdo apresentado por essas mesmas páginas, como a surdez ou a cegueira total ou parcial.
Na minha procura por uma página da Internet para um trabalho realizado no âmbito da disciplina de Acessibilidade e Usabilidade de Interfaces do meu curso, deparei-me com uma ferramenta, desenvolvida pela Fundação para a Ciências e Tecnologia, a Access Monitor, que avalia o nível de facilidade e apoio ao acesso do conteúdo de um determinado site, numa avaliação de 0 a 10 com três níveis de acessibilidade associados (A, AA e AAA). Foi através desta ferramenta que foram analisadas algumas páginas relacionadas com a sociedade portuguesa.
Os resultados não são animadores
No ramo dos serviços mais usados pelo cidadão comum, encontramos as páginas das Finanças e da Segurança Social, que obtiveram 4.8 e 6.3, respetivamente. Aqui, um erro crasso, apresentado pela página das Finanças, é a fraca catalogação dos links apresentados, que até para o utilizador dito “normal” mostram-se confusos e de fraca compreensão. Uma simples aposta na clarificação desses links, quer em conteúdo quer na explicação, poderia elevar o índice da página, provavelmente até ao nível básico de acessibilidade.
No ramo das Forças Armadas, encontramos as páginas do Exército (5.8), da Marinha (4.6), e da Força Aérea (3.0). Aqui, encontramos o pior índice em todas as páginas analisadas, o índice da página da Força Aérea. Esse índice é justificado pela má organização da página e pela saturação do conteúdo apresentado, o que dificulta o trabalho de qualquer software de leitura de ecrã, por exemplo. Neste caso, até uma melhor organização da página inicial e do seu conteúdo poderia melhorar a compreensão da mesma pelo utilizador “normal”.
No ramo do Governo Português, temos a página da Assembleia da Republica (5.4) e do Governo português (8.7). Aqui, encontramos o índice mais elevado em todas as páginas analisadas (8.7), um índice que, embora insuficiente para a mera atribuição do nível básico de acessibilidade, encontra-se bastante próximo, devido à organização básica e à catalogação da maioria dos elementos na página. Aqui, é também recomendada uma clarificação de todos os elementos presentes, bem como a introdução de comentários quer nas imagens, quer nos links presentes.
Concluindo...
No que toca à acessibilidade e usabilidade, as principais páginas da sociedade portuguesa deixam bastante a desejar. Não só não cumprem os requisitos mínimos para que qualquer cidadão, independentemente de sofrer de alguma incapacidade ou não, possa ter um acesso claro a essas mesmas páginas, como se verificam algumas tentativas de “modernização” da imagem da instituição, através da página associada (mas não se verificando qualquer “modernização” da sua usabilidade), que acabam até por dificultar o acesso à informação presente.
Com tantos muros a serem construídos, talvez seja tempo de a Internet começar a derrubar alguns.
Também o site do Pplware foi analisado e, tal como boa parte das páginas também esta sofre com a falta de, por exemplo, elementos mais simples e esclarecedores que permitam a um utilizador incapacitado o acesso ao fluxo constante e rico de informação presente. Para complementar esta análise, foi elaborado e encaminhado um relatório aos administradores desta página e, quem sabe, venha a influenciar as próximas decisões, quer gráficas, quer funcionais, deste website.
Este artigo tem mais de um ano
Cara Maria Inês Coelho e Tomás Pereira, onde estuda o Tomás? Que curso tem essa Unidade Curricular? Melhores cumprimentos
Cara Maria Inês
Coelho e Tomás Pereira, onde estuda o Tomás? Que curso tem essa Unidade Curricular? Melhores cumprimentos.
Boa tarde João!
Estudo no Instituto Politécnico da Guarda, no Curso Técnico Superior Profissional de Desenvolvimento de Aplicações Informáticas. A unidade curricular é a de Acessibilidade e Usabilidade de Interfaces. Foi no âmbito dessa disciplina que realizei o relatório sobre o Pplware, que levou à escrita deste artigo. Espero ter ajudado!
Tomás Pereira
Olá Tomás. Muito obrigado.
Infelizmente ainda ha muito website sem qualquer implementacao de acessibilidade e usabilidade, e os poucos que teem alguma coisa deve ter sido por engano.
Infelizmente hoje em dia ha muita gente a trabalhar em Web Development que nao estao minimamente atualizados, outros nem formacao qualificada teem, o Ze da esquina pede ao filho do amigo para lhe fazer o website, usam-se templates, copia daqui e dali, entretanto ate ficou bonito, a palavra espalha-se e ele acaba for fazer uma boa quantidade de websites, ate pode a vir a abrir o seu proprio negocio. Mas, faca muito ou pouco, esta mal feito, por falta de conhecimento, de formacao, ate mesmo por achar que nao faz falta (pois como nunca foi formado nisso nem sequer lhe atribui a importancia devida).
TODOS os que se aventuram em Web Development TEEM que pelo menos ter conhecimentos basicos de SEO e acessibilidade e usabilidade.
Concordo plenamente contigo que hoje em dia qualquer um arasta umas coisas com template builder no wordpress instalado com 1 click, instala milhões de plugins para fazer coisas básicas como por exemplo colocar o google analytics, e não sabe codificar 1 linha de código. Depois o site é hackeado e a culpa é dos malandros que “hackeam” sites sem protecção nenhuma…
Por outro lado discordo com a tua ultima frase. Não acho nada necesário para o desenvolvimento web saber de SEO. Isso é para os “marketeers”. Quem desenvolve, seja web ou não, tem que fazer o que outros idealizam e resolver problemas do utilizador (cliente), … O famoso “make it happen”.
Eu sou cego, e uso o poware sem grande problema no geral… claro que sempre pode ser melhorado, mas acreditem, visito sites bem mais complexos e inacessíveis que o pware… se há sempre onde melhorar, claro que sim, mas ao menos para mim, o pware não é dos sites piores apesar de tudo.
Ups, pware… coloquei um O a mais na primeira vez que escrevi… lol…
Tornar os conteudos acessiveis a todos, implica investimento por vezes, coisa que muitas entidades não estão dispostas a gastar para beneficio de uma minoria.
Minoria?
Saberás que em Portugal 10% dos cidadãos são portadores de deficiência (uma qualquer)?
Deves pertencer ao grupo minoritário dos atletas que não são capazes de olhar à volta!
Nota: faço parte do grupo dos deficiêntes
Bom dia, sou cego e de facto o pplware não é dos sites mais inacessíveis que existe. Porém, sendo um “centro tecnológico”, deveria estar na vanguarda da acessibilidade. Por exemplo: quando fazem tutoriais e colocam no passo-a-passo imagens exemplificativas, poderiam colocar sempre a informação do que está na imagem. Exemplificando: quando se coloca uma imagem de ir às preferências de um programa, devia ser complementado com: ir à barra de menus, depois opções, depois preferências. Fica a dica.
Para o colega 111111adesculpa discordar. A acessibilidade não via a construção de soluções para minorias, mas sim a construção de soluções para todos (universalidade). Aos construíres um site acessível, não estás a fazer um site para surdos, cegos, mudos, com paralisias (em resumo com algum tipo de incapacidade), mas sim um site onde os magros, gordos, altos, baixos, os avozinhos, a tia avó entre outros poderão aceder.
Repara que, se um site tiver a opção embutida de aumentar os caracteres ou de configuração do contraste das cores do site, poderá possibilitar a tua avó a visitar, por exemplo, o pplware.
Abraço
Tem toda a razão e é nesse sentido que estamos a trabalhar e foi nesse sentido que desafiamos a este tipo de conteúdo.
Obrigado pelo feedback.
Mais duas notas:
– enalteço trabalho realizado pelo pplware em lançar algumas notícias e artigos sobre acessibilidade, motivando-os para continuar com esse trabalhp. Talvez fosse interessante convidar alguém especialista nesta área, a fazer um conjunto de artigos de como tornar, por exemplo, sites acessíveis;
– Existem no mercado profissionais de TIC, formados nas melhores faculdades de engenharia portuguesasque certamente estarão disponíveis apra contribuir nas vossas empresas (nota de interesse: não sou formado nesta área);
Cumprimentos
“um direito ou um favor”
Nem uma coisa nem outra.
Na verdade temos poucos direitos na vida, embora muitas pessoas confundam direitos com serviços e achem que tem direito a tudo e mais alguma coisa.
Neste caso, a acessibilidade não é um direito nem um favor. Quem publica tem todo o interesse em chegar ao maior número de pessoas. Esquecer minorias é uma estupidez.
Na construção de sites não é assim tão dificil prever que os leitores de ecrã não conseguem ler imagens, mas apenas textos.
Em primeiro lugar parabéns pelo artigo. Acabo de apresentar a minha dissertação de mestrado em Novos Media e Práticas Web sobre “Acessibilidade dos Sítios na Web do Governo e das Instituições Públicas em 2015” e aproveito para partilhar algumas observações convosco. Este tema interessou-me pois enquanto desenvolvedor de websites quero chegar a todos os públicos independentemente das suas caraterísticas. Em Portugal, segundo o censos de 2011, 18% da população, com mais de 5 anos, tinha alguma dificuldade em realizar pelo menos uma das 6 atividades diárias e este indicador ultrapassava os 50% ao considerar a população com idade igual ou superior a 65 anos (INE, 2011). Importa dizer que a acessibilidade dos sítios do governo e das instituições públicas é obrigatória segundo leis internacionais, leis europeias e lei portuguesa. A RCM nº 91/2012, de 8 de novembro, determina que:
– todos os sítios na internet que disponibilizem exclusivamente informação estão obrigados a cumprir o nível A das WCAG 2.0, a partir de 8 de fevereiro de 2013.
– todos os os sítios na internet que disponibilizem serviços online estão obrigados a cumprir o nível AA das WCAG 2.0, a partir de 8 de fevereiro de 2013.
No entanto, dos 96 sites do serviço públicode avaliados com o AccessMonitor da UMIC apenas 5 se mostraram conformes com a lei. Repeti a avaliação agora em 2017 e os resultados permanecem idênticos.
É uma verdadeira falta de atenção que resulta em descriminação. Os custos da acessibilidade não representam mais de 5% do custo total do website e podem trazer muitos mais utilizadores ao sistema. Não é difícil fazer websites sem barreiras já que existem vários validadores que testam os websites, indicam os erros e apresentam as soluções. É só uma questão de boa vontade e bom design. Para além do mais, está na lei.