O Sol está irritado, está hiperativo e os cientistas já sabiam que o 25.º ciclo da nossa estrela não ia ser calmo, como foram os 11 anos do ciclo anterior. Como tal, as tempestades solares que a Terra tem sofrido e que até podem produzir maravilhosas auroras boreais, poderão um dia criar o que um investigador descreveu como um “apocalipse da Internet”.
O que é que uma supertempestade solar pode fazer à Terra?
As erupções acontecem quando o Sol se ilumina e vemos a radiação. De forma simples podemos dizer que é uma espécie de clarão de canhão. E depois do tiro do canhão acontece a ejeção de massa coronal (CME). Assim, podemos ver o clarão, mas a ejeção de massa coronal pode ir em qualquer direção aleatória no espaço. Com a tecnologia que temos hoje, contudo, podemos saber quando é que esta energia se dirige para a Terra.
No entanto, dada a proximidade que estamos na nossa estrela, depois de percebermos o “disparo” temos aproximadamente 18, talvez 24 horas de aviso, antes das partículas chegarem à Terra e começarem a interferir com o campo magnético terrestre.
E o que poderá “atacar” as comunicações do planeta?
Grandes manchas de plasma, ou matéria sobreaquecida, voam pelo espaço numa CME. Uma percentagem atinge a Terra, distorcendo o campo magnético do nosso planeta. Sim, para terem ideia, o nosso campo magnético funciona como se fosse o pino do fio-terra das tomadas da nossa casa, que normalmente descarrega de forma segura as cargas elétricas em excesso. Imagine este processo como “um grande circuito elétrico”.
Contudo, nestas descargas, a rede elétrica, os satélites, os cabos de fibra ótica subterrâneos com bainhas de cobre, os sistemas de navegação e GPS, os transmissores de rádio e o equipamento de comunicações são todos vulneráveis.
A Internet atingiu a maioridade durante um período em que o Sol esteve relativamente calmo, e agora está a entrar numa fase mais ativa. É a primeira vez na história da humanidade que se verifica uma intersecção entre o aumento da atividade solar e a nossa dependência económica global da Internet.
Disse o Professor Peter Becker da Universidade George Mason.
A verdade é que já aconteceu uma descarga destas, uma supertempestade solar, na Terra, conforme já referimos em vários artigos dedicados ao tema. É sempre relembrado o evento de Carrington em 1859. Esta foi a última vez que uma CME atingiu a Terra.
De facto, destruiu o sistema telegráfico, as faíscas voavam literalmente das linhas telegráficas. Alguns operadores foram eletrocutados porque os fios acabaram por transportar alta tensão, o que não era suposto acontecer, mas as variações do campo magnético tornaram-se tão fortes que quase se transformaram num sistema gerador e conduziram estas correntes pelos fios do telégrafo.
Os fios pesados do telégrafo eram robustos em comparação com os frágeis aparelhos eletrónicos de hoje.
Disse Peter Becker.
Se colocarmos isso em cima da Internet, com a sua eletrónica muito delicada, estamos a falar de algo que pode realmente fritar o sistema por um período de várias semanas a meses, em termos do tempo que seria necessário para reparar toda a infraestrutura – todos os interruptores eletrónicos, todos estes armários de eletrónica em todos estes edifícios de escritórios. Tudo isso pode ser queimado. Portanto, falamos de algo muito importante. E não se trata apenas de comunicações. Obviamente, também se trata de perturbações económicas.
Explicou o investigador.
Na verdade, se uma supertempestade derrubasse a Internet do mundo moderno, seria um prejuízo avultado, seguramente de muitos milhares de milhões de dólares. Numa avaliação “por alto”, Peter Becker refere que haveria uma perturbação económica na ordem dos 10 a 20 mil milhões de dólares por dia, só para a economia dos EUA. Imagine-se agora à escala global.
O demónio estará perto?
O ciclo solar está a atingir o seu pico, tornando as tempestades solares mais abundantes. Os anéis de árvores e os núcleos de gelo são provas de supertempestades muito maiores no passado. Há cerca de 14.000 anos, uma erupção solar, possivelmente centenas de vezes mais forte do que a erupção de Carrington, afetou a Terra.
Como tal, a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional dos EUA (NOAA) previu que o atual ciclo solar aumentará e atingirá o seu pico em 2024.
Becker afirmou que prever tempestades solares é como prever terramotos – simplesmente não temos controlo sobre a situação. Segundo ele, as probabilidades são de cerca de 10% de que, na próxima década, “aconteça algo realmente grande que possa acabar com a Internet”.
Para tentar perceber mais sobre a vida agitada do nosso Sol, Becker e a sua equipa observam o Sol e modelam as erupções. Segundo ele, as erupções atingem a Terra em 8 minutos. Isso faz com que o relógio comece a contar para a possível perturbação do campo magnético dentro de 18 a 24 horas.
Se houver um aviso, cada minuto conta, porque é possível colocar os satélites em modo de segurança. Podemos desligar os transformadores da rede, para que não se queimem. Portanto, há coisas que se podem fazer para mitigar o problema. E depois, a mais longo prazo, estamos a falar de endurecer a Internet. E isso é, obviamente, um desafio económico, porque é como uma apólice de seguro. Talvez nunca precisemos dela e custaria biliões para reforçar o sistema.
Concluiu o professor.
Claro, reforçar a Internet não parece ser no momento uma tarefa que as empresas queiram fazer, é dispendioso e, neste momento, não há incentivo económico para o fazerem.