Já pensaram como poderia ser a nossa vida diferente se a Terra girasse ao contrário? O impacto seria muito maior do que simplesmente o mudar de lugar do nascer e do pôr do Sol, possivelmente seríamos humanos completamente diferentes. Mas… diferentes como?
Já falámos em certa altura que se a Terra parasse de girar repentinamente, o mundo entrava numa completa cena apocalítica. Isto porque mesmo com o planeta parado, a atmosfera ainda estaria em movimento com a velocidade de rotação original de cerca de 1.770 km/h no equador.
Cada volta completa do nosso astro leva 23 horas, 56 minutos e 4,1 segundos a acontecer. Isto significa que os mares, as rochas, terra-alta, árvores, edifícios e até o seu cão de estimação seriam arrastados para a atmosfera.
Contudo, hoje o assunto é outro. Vamos imaginar que a Terra tinha um movimento contrário ao que tem hoje, também chamado de movimento retrógado, em vez do prógrado.
Movimento prógrado e retrógrado
Movimento prógrado é movimento na mesma direção que um certo movimento de referência. O contrário disso é chamado de movimento retrógrado. Estes termos são usados na astronomia para se referir ao movimento da órbita de um corpo em torno de outro, ou à rotação de um corpo em torno do seu eixo. Num determinado referencial, movimento retrógrado geralmente significa movimento contrário à rotação do corpo primário, o corpo central do sistema. A rotação é determinada em relação a um referencial inercial, como as estrelas fixas.
No Sistema Solar, todos os planetas, planetas anões e a maioria dos corpos menores (com a exceção de muitos cometas) orbitam o Sol na direção prógrada, ou seja, no mesmo sentido da rotação do Sol. A rotação da maioria dos planetas também é prógrada, com a exceção de Vénus e Úrano, que têm rotações retrógradas. Os satélites regulares dos planetas têm órbitas prógradas. (No caso dos satélites de Úrano, isso significa que eles orbitam no mesmo sentido da rotação de Úrano, que é retrógrada em relação ao Sol.)
Os satélites irregulares possuem órbitas prógradas e retrógradas, e provavelmente são corpos que foram gravitacionalmente capturados por seus planetas, tendo se formado orbitando o Sol.
E se a Terra girasse normalmente, mas ao contrário?
Nesta experiência mental, a ideia então é criar um planeta como o nosso, mas que gire para oeste. Não podemos parar a Terra e revertê-la, portanto, vamos apenas imaginar que o nosso planeta de um dia para o outro… passou a girar ao contrário!
Nascer e pôr do Sol: Bom, a primeira coisa que notaremos amanhã de manhã é o nascer do Sol no oeste. Até aqui tudo bem, evitamos uma devastação catastrófica. Mas o clima seria logo afetado.
A rotação do nosso planeta afeta os ventos. Esse fenómeno é conhecido como efeito Coriolis e é visto, muitas vezes e erradamente, como a razão pela qual a água da sanita gira para um lado ou para o outro, dependendo se a pessoas está ao norte ou ao sul do equador.
A maneira como uma instalação doméstica é construída, como uma sanita, pode falsificar o efeito, portanto, não deve aceitar a experiência da sanita como a prova deste efeito.
Ventos alísios: Mas na atmosfera, o efeito está em pleno vigor e as coisas vão-se espelhar. Os ventos alísios no Equador não sopraram mais para oeste. E os ventos que sopram de leste nas latitudes médias, como nos EUA e na Europa, mas também na Argentina e em parte da Austrália, deixaram de soprar nessa direção.
A biodiversidade deste planeta depende de adaptações que demoraram muito para se desenvolver, e de repente estamos a colocar tudo num mundo espelhado. Certamente muitas espécies, inclusive nós, seriam afetadas por isso. Um exemplo simples é que os ventos alísios no equador trazem nutrientes do Saara para a Amazónia, ajudando a incrível biodiversidade da região. Sem estes ventos, tal importante processo deixaria de acontecer.
Correntes oceânicas: As correntes também são afetadas pela rotação e, nas áreas costeiras, pelos ventos. O fluxo estabelecido de água quente ou fria nos oceanos mudaria completamente, com efeitos peculiares em todo o planeta.
O impacto imediato que isso teria é difícil de quantificar.
Desertos e sem desertos: Vamos dar uma volta num cenário onde a mudança mágica na rotação ocorreu há vários milhares de anos (para que possamos ignorar toda a dizimação da biodiversidade). O mundo hoje seria bem diferente.
Um artigo de 2018, na verdade, modelou uma rotação analógica da Terra na direção oposta. Uma diferença clara seria no Saara. O deserto simplesmente não existiria. A África e o Médio Oriente seriam muito mais verdes do que são hoje. O sul dos Estados Unidos, as Caraíbas, a América Central, o sul do Brasil e a Argentina seriam desertos. E o Japão e a costa oriental da China também. Em Portugal, seria tão frio como a Sibéria!!!
A mudança nos ventos e correntes também afetaria as temperaturas e a precipitação. As regiões que agora são desertas seriam muito mais quentes e secas, é claro, mas também haveria mudanças em outras áreas. A Europa seria muito mais fria e húmida, assim como o Magrebe e o Médio Oriente, pedaços da Austrália e da Nova Zelândia.
As piruetas dos planetas não são todas iguais
Conforme referimos em cima, na caixa dedicada à explicação, todos os planetas do Sistema Solar orbitam o Sol na mesma direção. Graças à conservação do impulso angular da nuvem de gás a partir da qual o Sol se formou, estamos todos neste carrossel sincronizado. Mas fazer girar um planeta na direção oposta não é impossível. Úrano sofreu uma grande colisão que o fez girar de lado, pelo que durante a sua viagem de 84 anos à volta do Sol, os seus polos apontam diretamente para ele durante os seus respetivos verões.
Mais interessante ainda, vejamos Vénus. O gémeo mortalmente quente da Terra tem um dia extremamente lento (cerca de 224 vezes mais longo que o da Terra) e gira na direção oposta. Assim, em Vénus, o Sol pôr-se-ia no Oriente.
Claro, olhando para o planeta, é uma pena que haja uma cobertura constante de nuvens (que esconde o pôr do Sol). Caso contrário, este mágico momento levaria mais de 100 dias (terrestres) a fazê-lo! A razão para isto é incerta.
Possibilidades incluem que o planeta tenha virado 180 graus devido à atração gravitacional do Sol e ao comportamento do seu interior. Outra opção é que o efeito já mencionado, mais a atração de outros planetas sobre a atmosfera de Vénus, abrandou a sua rotação até uma paragem e depois inverteu-a.
Estas são apenas algumas das muitas consequências que o planeta iria sofrer. Muito mais seriam as situações imprevisíveis que poderiam realmente ser ainda mais catastróficas. Nem tudo era mau, mas quase tudo seria diferente… muito diferente.