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O mito da calibração da bateria no Android

A bateria do seu Android já não é o que era. Por alguma razão a percentagem de bateria restante não reflecte o estado real da mesma. Pesquisa um pouco sobre o assunto e encontra inúmeros “guias de calibração” que aconselham a eliminação de um ficheiro chamado batterystats.bin, que contém supostamente informações energéticas, e ainda fazer um ciclo de descarga completo. Segundo dizem, ao apagar o tal ficheiro o Android cria um novo com a informação correcta.

Será mesmo verdade ou tudo isto não passa de um mito?

Dianne Hackborn é uma Engenheira da Framework Android na Google e adora desfazer mitos no seu Google+. Já no passado revelámos aqui no Pplware a sua explicação acerca do funcionamento da aceleração gráfica por hardware no Android. Agora, é esta fonte fiável da Google que nos ajuda a explicar o mito da calibração da bateria no Android.

Há muito tempo que em fóruns e sites dedicados ao Android, os experts afirmam que o ficheiro batterystats.bin se reflecte directamente no estado da bateria presente na barra de estado do sistema operativo. Há alturas em que sentimos a bateria descalibrada, por exemplo quando é flashada uma nova ROM. Nessa alturas, esses experts aconselham a execução de um método de calibração muito simples:

  1. Carregar a bateria complamente (100%).
  2. Apagar o ficheiro batterystats.bin.
  3. Descarregar completamente até o dispositivo se desligar.
  4. Carregar completamente.

A ideia por detrás deste processo é simples: calibrar a bateria fazendo um ciclo de descarga completo e obrigar o Android a criar um ficheiro batterytstats.bin novo que contenha informações correctas acerca do estado da bateria.

O mito do batterystats.bin

No entanto, Diane Hackborn contraria completamente a função desse tal ficheiro, esclarecendo:

“Este ficheiro [batterystats.bin] é usado para manter, entre reinícios, dados de baixo nível acerca dos tipos de operações que o dispositivo e aplicações fazem entre cargas e descargas da bateria. Isto é, é usado apenas para computar o gasto de bateria de cada função/aplicação, tal como é mostrado em Definições > Bateria”.

Ecrã que mostra o conteúdo do ficheiro batterystats.bin.

Segundo Diane, o ficheiro em causa apenas contém informação como “a aplicação X fez wake lock durante 2 minutos” ou “o ecrã esteve a 60% de brilho durante 10 minutos”. Não tem por isso qualquer impacto no nível de bateria mostrado na barra de estado nem na bateria restante do dispositivo.

“Apagar o batterystats.bin não fará nada que torne o vosso dispositivo mais fantástico e maravilhoso… bem, a menos que tenha um ódio profundo por ver o ecrã das estatísticas da bateria”, brinca Dianne. “De qualquer forma, o ficheiro é reiniciado de cada vez que desligam o dispositivo da corrente com uma carga relativamente completa, fazendo com que o ecrã anterior reinicie”.

Recalibrar com um ciclo de descarga?

No entanto, se retirarmos a parte de apagar o tão falado ficheiro, resta-nos a execução de um ciclo de descarga completo. Será este o responsável pela melhoria da percepção da bateria restante?

Relembremos o seguinte artigo “Toda a verdade sobre baterias de lítio” que ainda hoje se encontra bem actual, pois ainda é esta a tecnologia utilizada nas baterias actuais. Filipe Lourenço, o criador do BatteryCare, software recomendado pelo Pplware para a monitorização do estado da bateria, tem no seu site um guia de calibração de baterias de lítio.

Para melhor compreendermos o funcionamento das baterias no Android, o Pplware questionou Filipe Lourenço acerca desta questão. Aqui fica o esclarecimento completo:

Todas as baterias avançadas de iões de lítio (as utilizadas em aparelhos hi-tech) contêm um pequeno chip controlador que mede a capacidade de carga das células num determinado instante. Porém, com o tempo, se a bateria carregada, por exemplo, sempre acima dos 20%, existe 20% da bateria que nunca chega a ser “vista” por esse chip controlador.

 

Devido à natureza química das células de iões de lítio, estas perdem a capacidade de reter carga mesmo sem ser usadas. Então, se essas células correspondentes aos 20%, que não chegam a ser exercitadas perderem, digamos, 5% em 6 meses, o controlador não vai saber que em vez de 20% de carga útil, essas células só têm 15%. Nesse caso, o controlador reportará sempre a capacidade que sabia na altura da última vez que “passou os olhos” nessa parte da bateria.

 

Ao realizar um ciclo de descarga completo, a bateria é obrigada a utilizar toda a capacidade disponível e o sensor vai detectar toda a carga útil que está efectivamente armazenada. Se chegar aos 5%, na realidade só terá mais uns pózinhos de carga, porque esses 5% já são considerados inutilizados e então o sensor como não detecta mais carga daí em diante, actualiza o valor total da capacidade para reflectir que naquela zona da bateria deverá ser mostrado 0% e não 5%.

 

Realizar um procedimento de calibração da bateria, semelhante ao método disponível no guia do BatteryCare, de facto calibra o sensor da bateria para ele reportar o valor real. Obrigar a bateria a circular todos os iões de lítio disponíveis enquanto esta operação é monitorizada pelo sensor, vai fazer com que este último fique com a real percepção do valor total que a bateria contém no momento.

 

Concluindo, pode-se afirmar que as regras de manutenção das baterias dos portáteis são aplicadas aos smartphones e às suas baterias de iões de lítio (Li-ion) e polímeros de lítio (Li-Pol), uma vez que a tecnologia por detrás destas é comum: células que guardam carga, monitorizadas por um chip controlador. E quem reporta o valor restante da bateria é o próprio controlador embutido na bateria e não um ficheiro presente no sistema operativo. Se o hardware do “Smartphone Android” fosse colocado a servir um outro sistema operativo, o valor reportado de carga seria o mesmo.

Concluímos assim que o famoso método de calibração da bateria do Android não estava totalmente errado. De facto, a execução de um ciclo de descarga completo mascarava a inutilidade de apagar o batterystats.bin.

E os nossos caros leitores, o que pensam acerca deste tema? Acreditam que um ciclo de descarga pode de facto recalibrar a bateria?

 

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