O cirurgião-geral dos Estados Unidos da América (EUA) apelou ao Congresso para que exija rótulos sobre as redes sociais e os seus efeitos, semelhante aos encontrados nas embalagens de tabaco.
Nos EUA, o chefe operacional do US Public Health Service Commissioned Corps (PHSCC) é apelidado cirurgião-geral e é, de forma simples, o porta-voz para questões de saúde pública.
Num artigo de opinião publicado na segunda-feira, no The New York Times, o atual cirurgião-geral dos EUA, Vivek Murthy, afirmou que as redes sociais contribuem para a crise de saúde mental entre os jovens, sendo, na sua opinião, altura de exigir m rótulo que advirta para a sua perigosidade.
O rótulo de advertência do cirurgião-geral, que exige uma ação do Congresso, recordaria regularmente aos pais e aos adolescentes que as redes sociais não são comprovadamente seguras.
Apesar de um rótulo não ser suficiente para tornar as redes sociais seguras, a sua obrigatoriedade seria um passo necessário, uma vez que “os rótulos de advertência podem aumentar a conscientização e mudar o comportamento”, segundo evidências de estudos sobre o tabaco.
A utilização das redes sociais é predominante entre os jovens, com 95% dos jovens entre os 13 e os 17 anos a afirmarem que utilizam uma plataforma de redes sociais e mais de um terço a afirmar que utilizam as redes sociais “quase constantemente”, de acordo com dados de 2022 do Pew Research Center.
Na perspetiva de Josh Golin, diretor-executivo da Fairplay, uma organização que se dedica a acabar com o marketing para crianças, num comunicado, “as redes sociais são hoje como o tabaco há décadas: é um produto cujo modelo de negócio depende de viciar as crianças; e, como acontece com os cigarros, o rótulo de advertência de um cirurgião-geral é um passo crítico para mitigar a ameaça às crianças”.
Por sua vez, Jenny Radesky, pediatra comportamental de desenvolvimento da Universidade de Michigan e líder da Academia Americana de Pediatria, espera que estes rótulos sejam combinados com “muitos outros trabalhos que o Congresso tem tentado fazer para melhorar a segurança, o design e a privacidade dos produtos de redes sociais”.
Essas duas coisas teriam de andar de mãos dadas, porque há muito que o Congresso pode fazer para seguir os passos do Reino Unido e da União Europeia na aprovação de leis que levam em conta o que as crianças precisam quando estão a interagir com produtos digitais.
Empresas podem dificultar a tarefa do Governo de rotular as redes sociais
Segundo o Associated Press, colocar os rótulos nas redes sociais exigiria uma ação do Congresso, e não está claro o quão rápido isso poderia acontecer.
Afinal, apesar de os legisladores terem realizado várias audiências no Congresso sobre segurança infantil online e haver, inclusivamente, legislação em andamento, a última lei federal destinada a proteger as crianças online foi promulgada em 1998, ou seja, seis anos antes da fundação do Facebook.
Mesmo com a aprovação do Congresso, contudo, os rótulos de advertência seriam provavelmente contestados nos tribunais pelas empresas de tecnologia.
Colocar um rótulo de advertência no discurso online não é apenas cientificamente infundado, mas está em desacordo com o direito constitucional à liberdade de expressão.
É surpreendente ver o cirurgião-geral dos EUA a atacar as redes sociais quando os próprios adolescentes dizem que estas constituem um importante meio de ligação social.
Contestou Adam Kovacevich, diretor-executivo do grupo de políticas da indústria de tecnologia Chamber of Progress.
Para o cirurgião-geral dos EUA, no entanto, não existem provas suficientes que demonstrem que as redes sociais são seguras para crianças e adolescentes. Na sua perspetiva, partilhada no ano passado, os responsáveis políticos devem abordar os danos das redes sociais da mesma forma que regulamentam coisas como cadeiras de automóvel, leite em pó para bebés, medicamentos e outros produtos que as crianças utilizam.
Porque é que não conseguimos dar resposta aos danos das redes sociais quando estes não são menos urgentes ou generalizados do que os causados por carros, aviões ou alimentos inseguros?
Estes danos não são um fracasso da força de vontade e da educação dos pais; são a consequência da libertação de uma tecnologia poderosa sem medidas de segurança, transparência ou responsabilidade adequadas.
Escreveu o Vivek Murthy, mostrando que acredita que o impacto das redes sociais nos jovens deveria ser uma preocupação mais premente.
Aliás, “as medidas [que o Congresso deveria implementar para proteger os jovens] devem impedir que as plataformas recolham dados sensíveis das crianças e devem restringir a utilização de funcionalidades como as notificações push, a reprodução automática e o scroll infinito, que se aproveitam dos cérebros em desenvolvimento e contribuem para uma utilização excessiva”.