Nós, seres humanos, dependemos dos nossos sentidos para sobreviver. Inicialmente, Aristóteles definiu cinco sistemas sensoriais: a visão, a audição, o tato, o olfato e o paladar. Mas, na verdade, dependendo do ponto de vista, podem existir muitos mais.
O nosso corpo obtém este tipo de informações através de recetores celulares específicos que, normalmente, estão localizadas em zonas específicas. Mas e se estas células sensoriais estivessem em zonas onde não é suposto? Podem os nossos pulmões ter “células gustativas”?
Os nossos sentidos são a nossa ferramenta para perceber como funciona o mundo físico ao nosso redor. Basicamente, são sistemas formados por grupos de células sensoriais que recolhem e enviam informação para o cérebro.
Se pensarmos em nós e, em particular, nos nossos primórdios, os sentidos são fundamentais para garantir a nossa sobrevivência. Por exemplo, quimiorrecetores como os do olfato e do paladar, permitem-nos identificar se um determinado alimento é perigoso ou não. Evitando uma morte prematura por envenenamento.
Como é que captamos informação através dos nossos sentidos?
Os quimiorrecetores são recetores sensoriais que transformam substâncias químicas em sinais biológicos. Os quimiorrecetores responsáveis pelo paladar (para o doce, amargo e umami) e pelo olfato pertencem à família de recetores acoplados àsproteínas G (GPCR).
Como assim? Bem, vamos começar por tomar como exemplo as células do interior do nosso nariz. As suas membranas celulares estão repletas de proteínas que reconhecem e ligam moléculas de odor, ou seja, os quimiorrecetores específicos do olfato.
Agora, o objetivo principal é transmitir ao cérebro que entraram em contacto com estas moléculas. Mas como é possível? O caminho do nariz ao cérebro é longo…
Para isso, após a sua ativação, os quimiorrecetores interagem com proteínas G, localizadas no interior da célula. Estas levam ao desenvolvimento de uma resposta em cascata, através da formação de moléculas chamadas cAMP (monofosfato cíclico de adenosina). Esta molécula é a chave para este problema – ela desempenha um papel de mensageiro celular.
O cAMP leva à ativação de canais iónicos que permitem a despolarização de células nervosas. Neste caso, os neurónios recetores olfativos. E, assim, o estímulo inicial é convertido num sinal elétrico. Este sinal elétrico vai ser transmitido ao longo da nossa autoestrada de neurónios até chegar ao cérebro.
Uma vez chegado ao cérebro, o sinal elétrico é interpretado e uma resposta é desenvolvida. Permitindo-nos reconhecer diversos odores. Desde o cheiro desagradável de leite azedo até ao cheiro doce do caramelo.
Quimiorrecetores gustativos estão presentes em células do pulmão
Nos últimos anos, tem vindo a ser detetada a presença de quimiorrecetores em células de órgãos onde à primeira vista não fazem sentido estar. O que intriga bastante os investigadores.
Ao que parece, os pulmões possuem células tufo. Estas são conhecidas por terem projeções de microvilosidades. E, ainda, por terem também os recetores necessários para identificar sabores!
Ultimamente tem-se vindo a demonstrar que os quimiorrecetores apresentam afinidade com vias de sinalização do sistema imunitário.
Num estudo recente, verificou-se que em pulmões de ratinho e após a contaminação com o vírus influenza, começam a proliferar células tufo repletas de recetores gustativos.
Isto quer então dizer que conseguimos detetar vírus através do seu sabor? Não é bem assim…
Ainda não se sabe ao certo qual a razão para isto acontecer, principalmente, por aparecerem apenas no final da contaminação. Mas pensa-se que possam estar envolvidas num mecanismo de reparação do dano causado pelo vírus.
Anteriormente, estas células tufo já tinham sido encontradas no intestino. Podendo desempenhar um papel importante na manutenção da nossa saúde ao alertar o nosso organismo para a presença de parasitas.
Como consequência da sua atividade metabólica, estes parasitas libertam succinato. E, quando o succinato é detetado pelos quimiorrecetores das células tufo do intestino, elas segregam citocinas. As citocinas são moléculas sinalizadoras específicas de respostas imunitárias.
A libertação de citocinas é detetada por linfócitos que desencadeiam uma resposta imunitária no sentido de combater o parasita.
As células tufo podem funcionar, portanto, como vigilantes do nosso organismo. Ao detetar e alertar a presença de corpos estranhos a ele. De modo a despoletar uma resposta que permita a sua eliminação antes que eles nos afetem.