O cultivo de carne no espaço poderá ajudar a aumentar a duração e a autossuficiência das missões. Quando os astronautas passarem meses ou anos a bordo de naves espaciais, ou mesmo de uma base lunar, haverá necessidade de novos tipos de alimentos. A ESA vê com bons olhos a carne que… se cultiva!
Carne cultivada pode ser a solução para as missões espaciais
O desenvolvimento de carne cultivada, ou seja, carne animal real que é cultivada em reatores biológicos a partir de células estaminais, tem vindo a ganhar força nos últimos anos. Isto porque pode constituir uma alternativa mais sustentável e ética que não só reduz o abate de animais, como também utiliza muito menos recursos naturais do que a criação de gado tradicional. Nomeadamente, também mostra potencial para sustentar a vida no espaço.
No último ano, a Agência Espacial Europeia (ESA) tem estado a explorar se a carne cultivada pode ser uma opção alimentar viável no espaço, utilizada como fonte de proteína que pode ser produzida in situ.
O objetivo é fornecer aos astronautas alimentos nutritivos durante missões de longa duração longe da Terra, ultrapassando o prazo de validade de dois anos dos produtos embalados tradicionais. Dados os recursos limitados no espaço, o cultivo de alimentos frescos in situ seria necessário para aumentar a resiliência e a autossuficiência de uma missão e poderia também fornecer apoio psicológico à tripulação.
Explicou o engenheiro da ESA Paolo Corradi.
Para testar a alternativa de produção de carne, a ESA financiou dois projetos de investigação independentes – um dirigido pela empresa alemã de biotecnologia espacial Yuri e pela Universidade de Reutlingen; e o outro conduzido por um trio de empresas britânicas, a Kayser Space, a Cellular Agriculture e a Campden BRI.
As duas equipas compararam o valor nutricional da carne cultivada com as atuais fontes de proteínas estudadas no espaço, incluindo plantas e algas. Sugeriram diferentes métodos de produção de carne e tecnologias de biorreatores.
Os seus resultados, publicados na segunda-feira, mostram que a tecnologia é promissora, embora seja ainda necessária muita investigação e trabalho antes de a carne cultivada no espaço poder chegar ao paladar dos astronautas.
Para o efeito, a ESA propôs um roteiro que define as tecnologias necessárias e as lacunas de conhecimento, tais como a compreensão da forma como as células se adaptam a alterações da gravidade e da radiação. A ESA irá também iniciar experiências nas suas instalações.
A agência espacial espera que o desenvolvimento da carne cultivada acelere a sua adoção também na Terra.
A sensação é que estamos no início de um processo que pode transformar a indústria, tornando obsoleto o modelo convencional de produção de carne.
Os países desenvolvidos têm a oportunidade histórica de se afastarem da criação e abate de animais, um processo muito ineficiente para produzir alimentos, insustentável para o planeta, perigoso para a nossa saúde e que suscita cada vez mais preocupações éticas entre a população.
Referiu disse Corradi.
Para pôr isto em perspetiva, a empresa de investigação CE Delft estima que a carne cultivada poderia causar menos 92% de aquecimento global e menos 93% de poluição atmosférica, utilizando simultaneamente menos 95% de terra e menos 78% de água.
A Europa já tem um número significativo de empresas em fase de arranque a trabalhar nesta tecnologia, incluindo a Meatable, a 3D Bio-Tissues e a Uncommon. Os Países Baixos são o primeiro (e único, por enquanto) país da região a aprovar a degustação de carne cultivada em laboratório, seguindo o exemplo de Singapura e dos EUA.
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