O processo que define quando um ser humano morre não é tão simples como parece. A morte pode ser de alguns órgãos, de parte do sistema nervoso, pode ser do cérebro ou simplesmente um colapso generalizado. No entanto, a morte cerebral é ainda um processo sem retorno. Contudo, há investigação a decorrer para reverter esse processo.
Cientistas dos EUA reanimaram parcialmente os cérebros dos porcos mais de quatro horas depois de terem sido mortos.
Como acontece a morte?
Biologicamente, a morte pode ocorrer para todo o organismo ou apenas para parte dele. É possível as células individuais, ou mesmo órgãos, morrerem e ainda assim o organismo continuar a viver. Muitas células individuais vivem por apenas pouco tempo e a maior parte das células de um organismo são continuamente substituídas por novas células. Na verdade, também é possível que uma pessoa continue viva, mas sem sinal de atividade cerebral (morte cerebral).
Desta feita, definir o momento exato da morte sempre foi problemático.
Perseguir o ressuscitar da morte cerebral
Há investigação a decorrer que visa recuperar cérebros mortos. Na experiência, investigadores conseguiram reanimar parcialmente o cérebro de porcos após quatro horas destes terem sido abatidos.
Nesse sentido, os resultados alcançados podem alimentar o debate sobre a barreira entre a vida e a morte. Além disso, as descobertas podem fornecer uma nova linha de investigação a doenças como o Alzheimer. Surpreendentemente, o estudo mostrou que a morte das células cerebrais pode ser interrompida e que algumas ligações cerebrais sejam restauradas.
No entanto, não havia sinais do cérebro que indicassem atividade metabólica ou consciência. As descobertas desafiam o paradigma de que o cérebro entra em declínio irreversível minutos após o interromper do fornecimento sanguíneo.
Como foi alcançado?
Num matadouro foram recolhidos trinta e dois cérebros de porco e, quatro horas após o abate, os órgãos foram recolhidos. Já em laboratório, os cérebros foram ligados a um sistema feito pela equipa da Universidade de Yale.
Com a finalidade de imitar o impulso cardíaco, este sistema ritmicamente bombeava um líquido especialmente projetado em torno do cérebro. Este produto continha sangue sintético para transportar oxigénio e medicação dedicada a retardar ou reverter a morte das células cerebrais.
Os cérebros de porco receberam o “cocktail reparador” durante seis horas.
O que se conseguiu apurar deste estudo?
O estudo, publicado na revista Nature, mostrou uma redução na morte das células cerebrais, a restauração dos vasos sanguíneos e alguma atividade cerebral. Desta forma, os cientistas descobriram sinapses em funcionamento – as ligações entre os neurónios que permitem a comunicação.
Por outro lado, os cérebros também mostraram uma resposta normal à medicação e consumiram a mesma quantidade de oxigénio que um cérebro normal. Tudo isto após mais de 10 horas dos animais terem sido decapitados.
No entanto, nem tudo foram resultados espetaculares. Isto porque não havia sinal da atividade elétrica em todo o cérebro, como mostrou um eletroencefalograma (EEG). Isto poderia sinalizar consciência ou perceção. Fundamentalmente eles ainda eram cérebros mortos.
Lições a tirar
A investigação realizada quer transformar o paradigma de como o cérebro morre. Na verdade, estes dados contrariam o que muitos pensam que acontece. A morte cerebral não é rápida nem irreversível quando não há o fornecimento de oxigénio.
O investigador Nenad Sestan, professor de neurociência na Universidade de Yale, disse:
A morte celular no cérebro ocorre através de uma janela de tempo mais longa do que pensávamos anteriormente. O que estamos a mostrar é que o processo de morte celular é um processo gradual. E que alguns desses processos podem ser adiados, preservados ou mesmo revertidos.
A ética estará em causa neste tipo de experiências?
Os cérebros de porco vieram da indústria de carne suína; os animais não foram criados em laboratório para esta experiência. No entanto, os cientistas de Yale estiveram sempre preocupados dada a possibilidade dos animais ficarem conscientes. Para reduzir qualquer atividade cerebral, os investigadores administraram medicação nos cérebros. Além disso, a equipa vigiava constantemente os cérebros para ver se havia algum sinal de funções cerebrais superiores. Por fim, após os dados recolhidos, terminaram a experiência.
Especialistas em ética dizem que novas diretrizes são necessárias para este campo. Os animais usados para investigação podem acabar numa “área cinzenta – não viva, mas não completamente morta”.
Quais os benefícios a curto prazo?
O benefício imediato deste trabalho será para os cientistas que estudam o cérebro em doenças como a doença de Alzheimer.
O órgão é o órgão mais complexo do Homem, mas técnicas como o congelamento de fatias do cérebro ou o crescimento de colónias de células cerebrais em laboratório não permitem que os investigadores explorem toda a estrutura 3D do cérebro.
A longo prazo, os cientistas esperam encontrar melhores formas de proteger o cérebro após traumas como um derrame ou falta de oxigénio ao nascer.