Esta peça de ficção tem início do século XXI. O mundo vivia uma era de mobilidade limpa e eficiente. O automóvel elétrico dominava as estradas, máquinas silenciosas, com poucos componentes e uma manutenção quase inexistente. Eram simples, práticos e amigos do ambiente. Mas, por alguma razão, a humanidade decidiu que era pouco. Começou então uma jornada para tornar tudo mais… complicado. Surgiram os motores de combustão interna!
O nascimento da complexidade automóvel
Tudo começou quando engenheiros e inventores acharam que a eletricidade era demasiado previsível. Criaram então uma máquina que transformava pequenas explosões em movimento. Chamaram-lhe motor de combustão.
Ao contrário dos motores elétricos, que têm menos de 20 peças móveis, estas novas engenhocas exigiam centenas de componentes, todos em perfeita sincronia.
Inventaram máquina “mal dispostas”, com pistões, válvulas, cambotas, bielas, bombas de óleo e líquido de refrigeração, juntas e filtros.
O som suave do motor elétrico deu lugar a um rugido metálico e vibrante, sinal de que algo lá dentro estava, literalmente, a explodir.
De 200 para 2.000 peças: a engenharia do excesso
Enquanto um carro elétrico típico tem cerca de 200 componentes principais, um automóvel com motor térmico pode ultrapassar 2.000.
Cada peça acrescentava peso, custos, consumo e manutenção.
Para que o novo sistema funcionasse, foi necessário criar transmissões complexas com várias relações de mudança, sistemas de arrefecimento para evitar o sobreaquecimento das explosões internas, escapes para libertar os gases tóxicos, e depósitos de combustível com sistemas de segurança.
A simplicidade deu lugar à sofisticação, mas também à falibilidade. A manutenção anual tornou-se obrigatória. Surgiram oficinas, mecânicos e concessionários especializados para manter estas máquinas a funcionar.
Eis um comparativo aproximado que ilustra esta transformação:
| Sistema / Componente | Veículo Elétrico | Veículo Térmico |
|---|---|---|
| Motor principal | 1 (elétrico) | 1 (combustão) |
| Peças móveis no motor | ~20 | 200–300 |
| Transmissão | 1 relação direta | Caixa de 5–8 velocidades + embraiagem |
| Sistema de arrefecimento | Simples (1 circuito) | Complexo (óleo + líquido de refrigeração) |
| Sistema de escape | — | 30–40 peças |
| Depósito de combustível | — | 15–20 peças |
| Sistema de injeção e ignição | — | 100+ peças |
| Lubrificação / filtros | — | 10+ filtros e bombas |
| Total aproximado de componentes mecânicos | 250–300 | 2.000–2.500 |
A era dos fluidos e do fumo
Os carros, antes movidos por energia limpa armazenada em baterias, passaram a depender de um líquido inflamável: a gasolina (ou o gasóleo). Para extrair este combustível, perfuravam-se poços, transportavam-se milhões de barris, e refinavam-se toneladas de petróleo.
Cada viagem passou a ter um custo ambiental invisível, o da poluição. Os novos carros libertavam gases nocivos e partículas microscópicas, enchendo as cidades de fumo e ruído.
Foi de facto um coçar do ego, mesmo com estes caminhos dúbios, o homem sentia-se no auge da inovação.
O apogeu da confusão automóvel
À medida que os motores se tornavam mais potentes, tornavam-se também mais frágeis. Apareceram turbos, filtros de partículas, catalisadores e eletrónica de controlo.
As oficinas transformaram-se em laboratórios e as avarias tornaram-se parte da rotina. A ida ao mecânico passou a ter a importância de uma caixa surpresa e a conta a pagar… era o brinde!
O que antes era apenas um motor e uma bateria, tornou-se uma rede intrincada de sistemas que exigiam manutenção constante.
E depois… o regresso ao início
Com o tempo, percebeu-se que a complexidade não era sinónimo de progresso. O mundo começou então a olhar novamente para os motores elétricos, simples, eficientes e silenciosos, como a solução do futuro.
Ironia das ironias: o futuro estava no passado.
Conclusão:
A história da mobilidade poderia ter sido uma linha reta de simplicidade e eficiência. Mas a humanidade preferiu o caminho das engrenagens, das válvulas e da combustão.
Hoje, ao voltarmos aos elétricos, estamos a desfazer um século de complexidade. E a redescobrir que a verdadeira inovação, por vezes, é apenas um regresso àquilo que era simples.
Este é apenas um exercício de imaginação. Mas talvez, se o elétrico tivesse vindo primeiro, o mundo nunca teria sentido falta do cheiro a gasolina… nem da complexidade que veio com ele.