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A gestão da qualidade do ar de um submarino! Saiba como é em termos de tecnologia

Como já abordámos em anteriores artigos sobre os nossos submarinos da classe Tridente, estes navios têm uma grande autonomia para permanecer no mar, a qual é condicionada, sobretudo, pela capacidade de armazenamento de alimentação.

Por outro lado, quando no mar, o tempo que os submarinos conseguem permanecer isolados da atmosfera exterior pode ser de 15 ou mais dias e está dependente da sua autonomia energética, i.é, do tempo que conseguem permanecer sem recorrer ao ar exterior para carregar as suas baterias. Como é feita a gestão da qualidade do ar num submarino?


A tecnologia para gerir a qualidade de ar de um submarino…

Durante os períodos isolados do exterior, o que acontece à qualidade do ar no interior sabendo que podem estar 43 pessoas a viver naquele espaço fechado? A tecnologia usada para manter a qualidade dessa atmosfera interior pode não ser extraordinária, mas é certamente de extrema importância para o funcionamento do submarino e sobrevivência da sua guarnição.

Sendo possível aos submarinos da classe Tridente permanecer por 15 dias ou mais isolados da atmosfera exterior recorrendo ao sistema de Fuel Cell como fonte de energia, a monitorização e controlo da qualidade do ar interior é permanente e é também uma das maiores preocupações da guarnição.

Com um máximo de 43 pessoas a viverem numa atmosfera fechada, a gestão da qualidade do ar que respiram é feito com recurso a processos químicos há muito conhecidos e auxiliados por tecnologia que, não sendo de ponta, é certamente essencial para a sobrevivência da guarnição.

A grande vantagem de um submarino, quando comparado com outro navio, é a sua capacidade de “ver sem ser visto”. No entanto, no caso dos submarinos convencionais, um fator que condiciona a capacidade de não ser detetado é a necessidade de carregar a sua fonte primária de energia: a sua bateria. Dependendo do seu consumo, assim se consegue aumentar ou diminuir os ciclos de carga e descarga, condicionando desta forma a discrição destes navios.

No meio do mar, o carregamento da bateria faz-se com recurso aos grupos eletrogéneos (o conjunto de um motor de combustão associado a um gerador elétrico) que naturalmente necessitam do ar exterior para o seu funcionamento. Para o recolher, é utilizado um mastro, designado por mastro snorkel, que ao necessitar de ser içado acima da linha de água, diminuí consequentemente a discrição do submarino aumentando assim a possibilidade do submarino ser detetado visualmente por um radar (em terra, a bordo de um navio de superfície ou ainda de uma aeronave) ou até mesmo por um satélite.

A duração destes ciclos de carga e descarga, estão dependentes de inúmeros fatores. Mas quando o submarino navega com recurso apenas à energia armazenada nas baterias, permanecendo isolado do exterior, normalmente não o faz por um período suficientemente longo que represente um problema para a gestão da qualidade do ar interior. A sua renovação é feita no seguinte período de carga da bateria através da admissão do ar necessário para o funcionamento dos motores de combustão pelo mastro snorkel.

Por outro lado, quando os submarinos da classe Tridente se encontram a operar com recurso ao sistema de Fuel Cell, conseguem ficar isolados do exterior por 15 ou mais dias, uma vez que não necessitam recorrer aos grupos electrogéneos para carregar a bateria. É nesta circunstância que, com a guarnição a “consumir” oxigénio e a “produzir” dióxido de carbono durante um longo período, a gestão da qualidade do ar interior necessita de uma maior atenção.

Se a tecnologia que permite esta autonomia da atmosfera exterior é extraordinária, como já foi abordado num anterior artigo, o que permite manter uma atmosfera respirável, passa por recorrer a processos mais simples, utilizando “apenas” a tecnologia para a sua monitorização.

De uma forma resumida, os gases monitorizados a bordo dos nossos submarinos resumem-se aos seguintes:

A monitorização destes gases está integrada no designado sistema de controlo da plataforma que, recebendo de diversos sensores espalhados pelo navio, regista e disponibiliza diversos níveis de alarmes. Este sistema é operado em permanência, garantindo a execução imediata dos procedimentos necessários.

O sistema de controlo da plataforma

Além da monitorização feita aos gases referidos, e antes de recorrer aos sistemas de emergência em caso de necessidade, existe a capacidade de controlar alguns destes gases.

OXIGÉNIO

O oxigénio é consumido a um ritmo regular pelas pessoas a bordo, sendo a sua reposição a solução viável para o seu controlo. Estando estes submarinos equipados com o sistema da Fuel Cell, que utiliza o oxigénio e hidrogénio como combustíveis, o depósito de oxigénio, muito idêntico ao que existe em hospitais, é também utilizado para a libertação de oxigénio na atmosfera interior.

Com esta facilidade, ao calcular o consumo de oxigénio, pode regular-se um fluxo constante da sua libertação para o interior da atmosfera, possibilitando assim a manutenção de uma percentagem adequada.

Esquema de um tanque de oxigénio líquido

DIÓXIDO DE CARBONO

À semelhança do oxigénio, mas com uma evolução no sentido inverso, o dióxido de carbono aumenta de forma constante como resultado da atividade humana a bordo. A redução da sua concentração é facilmente conseguida através de um simples processo de filtragem/retenção do ar.

Ao atingir a percentagem limite definida, o sistema de ventilação que faz a circulação do ar interior, é disposto de forma a encaminhar a circulação da ventilação através um granulado de soda lime que assegura a absorção do dióxido de carbono. Para este processo, apenas há que garantir a existência a bordo da quantidade suficiente de soda lime adequada à duração missão.

MONÓXIDO DE CARBONO

O monóxido de carbono, se consideramos a limitada capacidade de o eliminar sem recurso à atmosfera exterior, é um gás mais delicado de gerir. Sendo inodoro, incolor e tóxico em baixas concentrações, este gás representa um perigo elevado, sendo essencial a sua monitorização permanente. Considerando que a origem mais provável do CO deverá ser um incêndio, a renovação do ar interior é naturalmente um procedimento subsequente a adotar, sendo esta a única solução para a sua eliminação. Apenas considerações de índole operacional poderão adiar a adoção desta medida no imediato.

HIDROGÉNIO

Por último, um gás altamente inflamável que queima em concentrações superiores a 4%, o hidrogénio constituí um risco real e permanente a bordo de um submarino. Sendo as baterias de chumbo e ácido sulfúrico, o seu processo de carregamento pode originar a libertação de hidrogénio. Este fenómeno, obriga a uma monitorização centrada nos porões das baterias onde, com maior facilidade, se podem formar “bolsas” de concentração mais elevada de hidrogénio.

Para evitar esta concentração localizada, o esquema de ventilação de bordo foi desenhado para fazer circular o ar dos porões das baterias pelo resto do navio. Esta circulação é mais preponderante durante o processo de carga das baterias em que o ar circula destes porões diretamente para o compartimento dos motores diesel, de onde estes aspiram o ar para a sua combustão.

Adicionalmente, espalhados por todo o interior, existem recombinadores de hidrogénio com o objetivo de captar o hidrogénio e recombiná-lo com o oxigénio formando vapor de água.

EM CASO DE EMERGÊNCIA

Sendo os submarinos construídos com uma filosofia centrada na manutenção da capacidade de regressar à superfície, o facto é que, caso esta se mostre completamente impossível, existe alguma capacidade de sobrevivência da sua guarnição em condições mais precárias, sendo o controlo da qualidade do ar ainda mais premente.

Podendo este tema da capacidade de sobrevivência a um acidente ser abordado em futuro artigo, no âmbito do controlo da qualidade da atmosfera interior, existem alguns equipamentos que permitem a monitorização alternativa da qualidade da atmosfera, sendo o ANALOX um dos mais completos. Este equipamento portátil, consegue medir o oxigénio, dióxido de carbono e a pressão atmosférica, tendo uma autonomia para 7 dias em operação contínua.

Equipamento ANALOX

Para a sobrevivência imediata, existe também um sistema de respiração autónoma, com tomadas espalhadas por todo o navio. Este circuito permite a todos os elementos a bordo, em poucos segundos, passarem a respirar a partir de um circuito de ar comprimido que garante a autonomia no caso da atmosfera interior ficar contaminada.

Por todo o referido, podemos concluir com alguma segurança que a qualidade do ar respirado a bordo dos submarinos da classe Tridente, é de muito melhor qualidade daquele que é respirado no centro de qualquer grande cidade.


O Pplware agradece ao Comandante Paulo Garcia pela escrita deste fantástico artigo

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