Pode parecer algo estranho, mas de facto o mercado da venda de música acertou na receita. Se tem estado com atenção aos últimos 2 anos reparará certamente numa alteração do comportamento dos “consumidores” de música, estes estão cada vez mais orientados para consumir e pagar pela música servida via streaming e estão a deixar de pagar para descarregar música e ter a mesma depositada nos discos e outros suportes de armazenamento digitais.
Mas o que tem motivado este comportamento?
Objectivamente vemos que neste ano 2014 os serviços de música via streaming canibalizaram os serviços de download de música. Esse comportamento deve-se a vários factores, mas essencialmente deve-se à optimização de serviços e diminuição nos preços da música, mas isso não reflecte necessariamente uma diminuição dos lucros para os autores e produtores, bem pelo contrário, há maior controlo nos conteúdos e um aumento na oferta.
Sair da zona de conforto está a causar pânico à indústria da música
Esta alteração no comportamento dos consumidores causou bastante pânico na indústria da música, mas não deveria, até porque o passar do download da música para o streaming altera o compromisso, em vez do consumidor passar a ser o “dono” da música descarregada, passa apenas a ter acesso à música, o conceito é bem diferente e protege muito mais os direitos de autor e a distribuição de receitas pelos agentes envolvidos.
Em Portugal, os agentes não conseguiram ainda atingir esta nova realidade e, como tal, dentro da sua pouca visão de mercado, decidiram “castigar” o consumidor carregando com mais uma taxa, a malfadada Lei da Cópia Privada que é uma vergonhosa taxa a aplicar aos dispositivos electrónico (sejam smartphones, tablets pens USB e até mesmo fotocopiadoras a laser… entre outros). Sem pudor, o Governo tenta incutir uma ideia de justiça ao colocar como limite máximo de aplicação da taxa os 15 euros. Apenas as fotocopiadoras a laser com capacidade de mais de 40 páginas por minuto serão taxadas acima dos 15€, segundo o comunicado do Governo o valor será de €20.
Esta Sexta-Feira, o Governo publicou a Lei em Diário da Republica, agora só falta mesmo a votação em Assembleia da República, veja aqui informação mais detalhada sobre este assunto.
Um sinal forte que a venda de música online está a mudar são os esforços da Apple – a empresa mais poderosa na venda de música online – que desembolsou 2,6 mil milhões de dólares e cerca de 400 milhões em acções da empresa de Cupertino para ter o controlo sobre as duas empresas que compõem o universo Beats: a Beats Electronics, que cria e constrói os famosos auscultadores, e a Beats Music, que tem em si o serviço de streaming de música. Mas o foco aqui não são os auscultadores, é, sem margem para dúvidas, a Beats Music.
Claro que há uma pressão imensa por parte dos músicos e as associações que os representam, estes estão preocupados que os royalties do streaming das suas músicas não compensem a queda nas vendas dos seus CDs e downloads das stores online. Mas os entendidos nesta área já vaticinaram o futuro próximo: os downloads vão cair e o streaming é a nova moda e tendência. Isso preocupa quem não percebe esta corrente tecnológica.
Sim, é mais fácil atacar e taxar cegamente os dispositivos que podem guardar os conteúdos como forma de acautelar eventuais perdas da mudança, em vez de apostarem na modernidade e novas formas de enriquecer a oferta via streaming. Uma das formas é pensar como convencer as pessoas a pagar por estes serviços de streaming, aí sim é uma política inteligente de fazer crescer os lucros.
O mundo estará a evoluir para “Spotify up” e “iTunes down”?
É por isso que o “streaming de música está a canibalizar as vendas de downloads” e o debate é muito mais complexo do que apenas “Spotify up, iTunes down”. Claro que isto já se falava há pelo menos um década para cá, mas a fraca agilidade da indústria da música não evoluiu na mentalidade e está em choque com o que realmente está já a acontecer.
Neste ano de 2014, 37 milhões de pessoas irão pagar para ouvir música via stream, segundo afirma o analista da Jupiter Research, Mark Mulligan, e este vê ainda muito mais potencial.
Ele também adverte que 45% das pessoas que compram os downloads estão agora também a consumir música via streaming, e que apenas 15% dos que têm o serviço de música por streamig gratuito assinaram para ter o serviço pago. Este, segundo Mulligan, é o que está a assustar os players desta indústria… mas isto deveria ter sido preparado já há mais tempo, já se fala há 10 anos nesta revolução.
Mulligan pensa que porque só a Apple realmente fez sucesso na venda de downloads de música, esse mercado é ainda mais ponderado como próspero para mais players, pessoas que também já deram conta que pagar no Spotify 6.99 euros por mês para o acesso ilimitado é também um bom negócio. Para muita gente o download de música foi apenas a transição entre conceitos.
Mas como pode crescer o mercado da música por streaming?
Mulligan acha que existem dois caminhos que podem ser puxados para fazer crescer os lucros e a popularidade da música digital: a primeira é a alavanca de um maior conhecimento sobre a forma como as pessoas estão dispostas a pagar pela música, a segunda alavanca é o preço que essas pessoas estariam dispostas a pagar e como a indústria da música entenderia essa procura.
Na primeira questão o analista é muito directo acerca dos desafios. Há “cinco anos atrás, nós estávamos a falar sobre a pirataria peer-to-peer, e agora estamos a falar do YouTube. O acesso a música livre disponível estará sempre omnipresente e sempre haverá preponderância de pessoas que não pagam”, diz ele.
“Não importa o quão fácil se faz para as pessoas a pagarem, no entanto, muito mais que embalar na oferta paga, ainda haverá uma maioria de pessoas que não vão pagar porque não precisa”.
Segundo as palavras deste analista, o segredo está no equilíbrio entre a qualidade do serviço e o preço que as pessoas, que pagam, querem pagar. Isto não inviabiliza que exista sempre quem vá descarregar música mesmo sem pagar, contudo, há um mercado que está a crescer com força, resta saber se os players deste mercado estão preparados para lhe dar uma continuidade.
Via: The Guardian