Na Europa alguns países já disponibilizam aos seus cidadãos as apps para tracing à COVID-19. Em Portugal a app poderá ser lançada daqui a poucos dias, mas neste momento está a ser revisto o projeto da aplicação de rastreio da COVID-19.
Por outro lado, o Conselho Nacional de Ética chumba as apps para tracing à COVID-19.
O Conselho Nacional de Ética publicou hoje um parecer onde chumba as apps para tracing à COVID-19. De acordo com o documento “As soluções tecnológicas que estão em desenvolvimento procuram responder a dois tipos de rastreamento, o de grupo e o individual.
No primeiro, visam-se grupos populacionais específicos, cruzando-se dados de localização geográfica, de saúde, de determinadas comorbilidades e vulnerabilidades. No segundo, configuram-se mecanismos para a sinalização de cada indivíduo que tem um teste positivo À COVID-19ou sintomas suspeitos e das pessoas que com ele estiveram em contato ou lhe são próximas”
Apps para contact tracing à COVID-19! CNECV diz que não…
- As aplicações digitais móveis para o controlo das cadeias de transmissão da COVID-19, tal como são descritas as suas caraterísticas no momento presente, não podem ser consideradas uma estratégia de saúde pública alternativa aos processos convencionais de controlo nacional da pandemia, desde logo porque a sua utilização não é generalizável a toda a população ou à percentagem desta que torne possível assegurar eficácia sanitária, devendo considerar-se o seu uso complementar nas estratégias de controle de transmissão da infeção.
- Generalizar o uso de aplicações digitais móveis como uma estratégia nacional para controlar a transmissão da infeção na comunidade pode associar efeitos perversos, se afastar do planeamento das intervenções sanitárias os grupos sociais onde se reconhecem diversas vulnerabilidades, designadamente os que não são portadores de equipamentos tecnologicamente avançados nem capazes de fazer deles o uso pretendido para fins sanitários.”
- As aplicações digitais móveis são interdependentes das caraterísticas dos telemóveis, o que acentua as desigualdades associadas à baixa literacia digital e à condição económica e social dos cidadãos, factos que constituem uma objeção ética fundamental para se recomendar a sua utilização com caráter obrigatório. Deve, por isso, ser garantida proteção relativamente a qualquer tipo de pressão social, nomeadamente de autoridades públicas, que condicione os cidadãos para adotar aplicações móveis de rastreio de contactos, responsabilizando-os por uma estratégia global de saúde pública, que seria sempre desproporcionada para esse fim.
- Em determinados contextos comunitários, as aplicações móveis para rastreio de contatos podem ter, contudo, utilidade para proteger a saúde individual, já que informam o seu portador da probabilidade de poder estar infetado. No caso de se verificar a opção individual, livre e voluntária de usar um telemóvel com aplicação sinalizadora de rastreio de contacto, não haverá lugar a objeção ética. Mas essa opção reforça a responsabilidade do cidadão detentor do telemóvel para a adoção de um apropriado comportamento, sempre que for notificado de um contacto próximo e durável com alguém infetado, e até que se confirme ou exclua a positividade para o vírus.
- As aplicações digitais móveis, incluindo as adotadas por decisão voluntária de cada cidadão, devem incorporar os princípios éticos no desenvolvimento da solução tecnológica (“ethics by design”) e ser escrutinadas quanto à solidez dos critérios de utilidade sanitária, e a sua implementação deve ser acompanhada de uma cuidada ponderação ética, atendendo aos riscos inerentes quando houver recolha centralizada de dados sensíveis de informação pessoal. Neste domínio, o Estado tem o dever de proteger a reserva de intimidade da vida privada e a informação pessoal dos cidadãos e obriga-se a promover um contexto social de maximização da justiça, da equidade, de não discriminação e de atenuação das vulnerabilidades.
- A transparência e a confiabilidade na governança dos dados pessoais, com salvaguarda do seu bom uso, no caso específico das aplicações móveis para geolocalização e “tracing”, podem ter um impacto sensível no modo como os cidadãos se relacionam com o Estado. Na sua regulação, os cidadãos têm de identificar critérios de segurança, solidez, resiliência e fiabilidade, e processos claros de auditoria, rastreabilidade e responsabilidade, que são instrumentais para confiar em propostas que, de modo sensível, interferem com a sua privacidade.
O documento pode ser obtido aqui assim como as declarações da Conselheira Ana Sofia Carvalho.