Uma nova técnica científica está a revelar as origens genéticas da perturbação do espetro do autismo (ou PEA) escondidas no nosso cérebro.
O cérebro é curiosamente complexo e há muito sobre ele que ainda não entendemos. As condições que o envolvem são verdadeiras incógnitas, e perturbações como o autismo intrigam até os especialistas.
Agora, uma nova técnica científica, que utiliza mini cérebros artificiais cultivados em laboratório (organoide cerebral), está a evidenciar as origens genéticas da perturbação do espetro do autismo escondidas no nosso cérebro.
De nome CHOOSE (sigla de CRISPR-human organoids-single-cell RNA sequencing), a técnica combina genética elaborada e bioinformática quantitativa. O objetivo é estudar mutações de genes conhecidos como de alto risco para o autismo e perceber como essas mutações levam a alterações celulares específicas no cérebro do feto.
Uma vez que cada célula individual no cérebro in vitro transporta apenas uma mutação (no máximo) para um gene específico de alto risco, os efeitos de diferentes mutações podem ser analisados simultaneamente enquanto a célula em questão se divide e multiplica no organoide em crescimento.
Segundo os investigadores, isto revela as consequências de múltiplas mutações numa só experiência, reduzindo drasticamente o tempo necessário para a análise.
Com esta metodologia de alto rendimento, podemos inativar sistematicamente uma lista de genes causadores de doenças. À medida que os organoides com estas mutações crescem, analisamos o efeito de cada mutação no desenvolvimento de cada tipo de célula.
Explicou a farmacologista molecular e celular, Chong Li, do Instituto de Biotecnologia Molecular, na Áustria, e membro de um dos grupos de investigação que desenvolveu a técnica científica.
O que nos dizem os genes sobre a perturbação do espetro do autismo?
Centrando-se em 36 genes conhecidos de alto risco para o autismo, os investigadores descobriram que, embora estes genes partilhem muitos mecanismos moleculares comuns, o efeito destes mecanismos em diferentes tipos de células pode ser diferente, tornando certos tipos de células vulneráveis a mutações relacionadas com o autismo no cérebro fetal.
De acordo com Li, os progenitores neurais – células fundadoras que geram os neurónios, as células nervosas do nosso cérebro – são particularmente suscetíveis a mutações.
O estudo da etiologia genética das [perturbações do desenvolvimento neurológico] melhora a nossa compreensão dos mecanismos da doença, mas normalmente requer o acesso aos processos de desenvolvimento do cérebro humano. Os organoides cerebrais recapitulam o desenvolvimento inicial do cérebro e geram diversos tipos de células encontradas in vivo.
Escreveu a equipa de investigadores no artigo publicado aqui.
Esta nova técnica trará mudanças significativas no rastreio genético. Por saber que a tecnologia dos organoides pode ser aplicada a muitos tecidos humanos diferentes, a equipa crê que ela fará progredir rapidamente a nossa compreensão das doenças genéticas.
A capacidade de determinar as contribuições específicas do tipo de célula para as doenças genéticas de uma forma sistemática, escalável e eficiente irá melhorar muito a nossa compreensão dos mecanismos da doença.
Explicaram os investigadores, acrescentando que “como o sistema CHOOSE fornece uma estratégia de rastreio robusta e controlada com precisão, prevemos que seja amplamente aplicado para além dos organoides cerebrais para estudar genes associados a doenças”.