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dd tc? Não está a sonhar. O mítico mIRC ainda está vivo

Numa época em que se multiplicam as redes sociais, nada como recordar uma das que esteve na génese de todo este movimento. Falamos do mIRC, um programa que ligou milhares de pessoas e que continua vivo e operacional.


A rede social dos anos 90 e 2000

O mIRC foi o programa mais popular da viragem do século para aceder às redes de comunicação em tempo real IRC (Internet Relay Chat). Nasceu em 1995 pelas mãos do programador britânico Khaled Mardam-Bey, quando a internet ainda era algo muito recente para o público em geral.

Muito antes do MSN Messenger ou do Google Talk se tornarem famosos, o mIRC veio responder à necessidade de criar um programa de conversação para o sistema Windows.

O objetivo era que fosse user friendly para todos e não apenas para os programadores e universitários que já utilizavam a funcionalidade de comunicação em tempo real das redes IRC.

O mIRC mostrou ao utilizador comum o que a Internet já estava a mostrar há alguns anos aos investigadores e ao mundo da ciência. O maravilhoso mundo da comunicação direta e em tempo real, entre utilizadores que tanto podiam estar ao nosso lado, como do outro lado do mundo.

mIRC: das primeiras comunidades

Numa altura em que a Internet tinha apenas alguns milhares de utilizadores em todo o mundo, o mIRC permitiu que pessoas com nenhum conhecimento sobre programação pudessem conversar online.

Utilizando uma comunicação limitada aos caracteres (texto), numa altura em que ainda era impensável incluir na conversa fotografias ou vídeos, os utilizadores partilhavam histórias, notícias, criavam e desenvolviam relações pessoais, profissionais e até relações amorosas.

Era também uma plataforma muito utilizada para jogos de cartas e xadrez ou para realizar questionários online que permitam recolher respostas e dados específicos muito rapidamente.

O anonimato proporcionado pelas alcunhas (nicknames) dos utilizadores registados era ameaçador para alguns, mas era igualmente libertador para os que pertenciam a grupos marginalizados. Pela primeira vez ganhavam uma voz e uma existência online, sem receio de repercussões ou julgamentos.

 

Como funcionava?

O programa oferecia canais de comunicação que funcionavam como salas de conversação. Cada canal era identificado por um cardinal (#) antes de uma palavra que resumia o tema daquela sala de chat.

Podia ser, por exemplo, uma designação genérica como #desporto, #sexo e #musica, ou uma designação mais específica como #hitchcock ou #pimba.

O que era mais entusiasmante na altura era o facto de qualquer utilizador poder criar e registar o seu próprio canal, definindo e gerindo ele próprio as salas de conversação. Assim surgiam canais para todos os gostos e necessidades, criados para representar comunidades, escolas, gostos, tendências e mesmo profissões.

O “dono” do canal podia ainda escolher se a sua sala de chat era pública ou privada, limitar o número de participantes numa discussão e escolher ajudantes para bloquear os “malcomportados”. Havia sempre quem levasse um ban/kick!

Outra das características mais atrativas do mIRC era a conversa em janela privada (pvt) entre utilizadores da mesma sala, que permitia criar ligações mais diretas e individuais entre os participantes.

Com o tempo foram aparecendo evoluções e versões modificadas do mIRC original que introduziram novas funcionalidades, muitas sugeridas pelos próprios utilizadores.

Declínio com as redes sociais

O mIRC atingiu o pico de utilizadores nos primeiros anos deste século. Em 2003 fazia parte do ranking dos 10 programas mais populares da Internet.

Nesse ano, o seu criador Khaled Mardam-Bey, contabilizou mais de 150 milhões de downloads do software o que demonstra o nível de curiosidade e interesse que suscitou entre os internautas. Em Portugal, o programa chegou a ter 33 mil utilizadores registados nesse mesmo ano.

O aparecimento dos novos programas de comunicação direta, como o Skype ou o Messenger, ou das primeiras redes sociais, como o Orkut ou o hi5, com novos recursos e utilização de imagens, fez com que o mIRC começasse a entrar em decadência.

Entre 2003 e 2013 o programa passou de 1 milhão de utilizadores para 500 mil e o golpe final foi dado pela popularidade crescente do Facebook.

 

Smileys, hashtags, @nicknames: o legado do mIRC

Se o mIRC marcou para sempre o imaginário da primeira geração de utilizadores da internet, ele também deixou marcas profundas nos recursos de linguagem que ainda hoje utilizamos online. Os smileys, o famoso LoL ou o wtf, o # antes das palavras importantes ou o @ antes de uma alcunha, são apenas alguns exemplos de uma linguagem que surgiu na altura e que ainda resiste na comunicação online.

Foi também no mIRC que os utilizadores comuns compreenderam que tipo de estragos os hackers poderiam provocar na internet.

O mIRC necessitava que os servidores estivessem ativos 24 horas por dia para que as conversas não parassem à volta do mundo e “deitar a abaixo” estes servidores, fazendo desaparecer vários participantes das salas de chat ao mesmo tempo, passou a ser um “desporto” para os novos piratas do mundo virtual.

Ainda está ativo

Hoje o mIRC ainda está vivo e a funcionar. O seu criador, o programador Khaled Mardam-Bey, nunca o abandonou e continua a fazer atualizações. O mIRC vai já na versão 7.77 e pode ser utilizado nas versões Windows XP, Vista, 7, 8, 10 ou 11 e os utilizadores ainda por lá andam. Os que ficam gostam da comunicação simples, leve, segura e prática do texto.

São utilizadores mais técnicos, que alimentam os canais da comunidade tecnológica, mas também utilizadores revivalistas que apreciam as conversas afastadas do culto da personalidade que as fotos de perfil e das redes socias modernas popularizaram.

Procuram o que resta de um mundo onde a comunicação não é centralizada nem censurada pelas grandes empresas tecnológicas, um mundo onde a comunicação tem baixo risco de repercussão pública.

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