Uma das grandes questões que se coloca atualmente relativamente aos videojogos é precisamente a questão da criatividade e inovação (ou falta dela) que apresentam e a forma como as marcas encaram esse assunto.
Recentemente um responsável da Bandai Namco tocou na ferida e falou um pouco sobre as estratégias da companhia.
Nos últimos anos temos assistido a um crescimento do número de jogadores desagradados devido à quantidade de remasterizações ou aos constantes lançamentos de jogos que mais se assemelham a DLCs mas, acima de tudo, insatisfeitos devido à falta de inovação e criatividade dos videojogos no geral.
Estes são problemas (em alguns casos mais visíveis que noutros) que afetam e preocupam as próprias editoras sendo também alvo de particular atenção pelos seus responsáveis. A comprovar isso, Hervé Hoerdt (Digital e Marketing VP da Bandai Namco) falou recentemente ao site GameIndustry sobre como a marca japonesa vê o problema e sobre as futuras estratégias da companhia no que respeita a novos IPs e afins.
Segundo o responsável da Bandai, e como é do conhecimento público, muitos dos jogos distribuídos pela empresa não são sua propriedade nem dos seus estúdios, sendo licenciamentos de jogos de terceiros. Esta é uma situação que a companhia quer rever nos próximos tempos de forma a atingir um certo reequilíbrio da balança (a seu favor, claro). Por outras palavras, o que Hervé pretende transmitir é que os planos da Bandai Namco passam por dosear de forma mais equilibrada o lançamento de novos IPs seus em contraste com lançamentos de jogos de terceiros. É claro que por detrás disto se esconde uma necessidade de ter mais lucros mas acredito que os jogadores também sairão beneficiados.
De forma a que isto não se fique apenas por “palavras ao vento“, sabemos que a Bandai Namco já passou à ação e como tal, foi criado no inicio do ano um departamento da empresa direccionado especificamente para impulsionar o aparecimento de novos IPs e acompanhar o panorama internacional.
“A Bandai Namco é conhecida por ser uma companhia com vários jogos licenciados mas, com Little Nightmares, Twin Mirror e muitos mais que vêm a caminho, esperamos conseguir que a balança fique nos 50% de IPs nossos e 50% de jogos licenciados“.
Jogos como Naruto ou Dragon Ball Z (distribuídos pela Bandai) pertencem a séries que apresentam uma certa regularidade de lançamento de novos episódios e que continuarão a sê-lo, mas que, por um lado não correspondem a novos IPs e por outro lado não são da propriedade da companhia japonesa. De forma a inverter esta tendência já tivemos ocasião de assistir neste ano à colocação na prática dos novos planos da empresa. O lançamento de títulos como Little Nightmares ou Get Even são exemplos de novos jogos que lançados com o apoio da Bandai e que tiveram sucesso mas mais importante. Juntamente com outros jogos que vêm a caminho como Code Vein ou 11-11: Memories Untold (entre outros) ajudaram a empresa a começar a posicionar-se numa posição de equilíbrio em relação ao lançamento de novos IPs.
“O nosso objetivo é que 50% do nosso negócio venha de novos IPs“, referiu Hervé justificante ainda que “Queremos criar um modelo de negócio sustentável e se olharmos com atenção para o momento atual, os nossos jogos são na sua maioria Franchises ou Licenças e não marcas nossas. Para se ter um negócio sustentável é imperativo termos os nossos próprios títulos. Outro problema refere-se ao fato de trabalhar com o mesmo IP acabar por atingir sempre o mesmo público-alvo e o mercado gaming.”
Entretanto existe ainda uma outra razão que leva a que a Bandai Namco queira apostar em IPs novos e seus: a Multidisciplinaridade. O que pretende Hervé dizer com isto? É simples e faz todo o sentido. Se olharmos com atenção, nos tempos que correm, existe uma grande tendência para alguns jogos saírem das consolas/PCs e chegarem a outros mundos, tais como o cinema ou a literatura. A Bandai é da firme opinião que, criando mais jogos próprios terá assim um potencial enorme de transcender os seus títulos e seus Universos até outras paragens (filmes, séries, revistas, livros,…). Aliás, já é publicamente sabido que a companhia pretende mesmo fazer um filme em redor do jogo Little Nightmares.
A avaliar pelas palavras de Hervé fica-se também com a ideia de que um dos objetivos da companhia passa também por disponibilizar jogos que sejam diferenciados, independentemente de serem ou não o primeiro pilar de uma futura franchise. Jogos como Little Nightmares, Get Even ou Twin Mirror são exemplos disso mesmo e que podem inclusive vir a tornar-se franchises eles próprios.
Neste contexto parcerias como a estabelecida com a Dontnod Entertainment adquirem particular importância. Jogos como Life is Strange, Remember Me ou o próximo Twin Mirror apresentam características próprias que a Bandai valoriza mas que acima de tudo, se enquadram precisamente naquilo que a companhia quer para o futuro: jogos com narrativa forte e emocionais que possam ser facilmente transpostos para o cinema por exemplo.
Contudo um dos pontos recorrentes no discurso de Hervé é o da sustentabilidade. A empresa encontra-se mesmo decidida a proporcionar a si própria uma grande dose de sustentabilidade e para tal, parece que vai querer mesmo investir em material novo ao longo dos próximos meses (anos). Anualmente a empresa afirma ser contatada por mais de 200 equipas de desenvolvimento em redor do globo e parte da responsabilidade da nova New IP Creation Unit será a de acompanhar essas equipas.
E isto leva a uma outra questão de fundo que, no caso da Bandai, se torna mais notória. A empresa, sendo japonesa viveu muitos anos com uma imagem muito vincada daquele estigma oriental. Contudo a Bandai encontra-se a dar passos precisamente no sentido de globalizar a sua oferta, o que faz todo o sentido, sendo um dos objetivos da companhia o de se tornar cada vez mais forte worldwide. Os grandes exemplos disto mesmo são Little Nightmares dos estúdios suecos Tarsier Studios, Get Even dos polacos The Farm 51 ou Twin Mirror dos franceses Dontnod Entertainment, tendo todos esses jogos a particularidade de também verem a sua ação decorrer em ambientes ocidentais.
A Bandai Namco está a querer mudar, isso é uma certeza. Se a mudança é boa? Acredito que sim. Acredito que a direção que a companhia está a levar poderá ter tudo o necessário para a fazer chegar a bom porto. No entanto, convém ter a noção, de que todo este processo não será única e exclusivamente direcionado para a satisfação dos jogadores. Como em tudo, tem de haver um delicado equilíbrio entre o que os jogadores querem e o que a empresa consegue dar, tendo sempre a noção que terá de haver algum lucro no processo (as empresas têm de ter lucro, certo?).
Este caminho que a Bandai Namco está a percorrer irá trazer certamente vantagens e proveitos, não só à companhia como (e principalmente) aos jogadores. Contudo, certezas?!?! … só o tempo dirá!!