O mundo tal e qual o conhecíamos há apenas um ano mudou. Não é surpresa para ninguém, passamos mais de metade deste período fechados em casa e a fazer tudo por tudo para que o vírus não encontrasse morada nos nossos corpos. Inevitavelmente, esta série de restrições à circulação e à convivência social acabou por determinar alterações profundas na forma como trabalhamos e consumimos, fazendo emergir novos processos e tecnologias.
A pandemia da Covid-19 teve, assim, o condão de abrir o pano ao teletrabalho e, no sentido do título do nosso artigo, a uma sociedade cashless ou potencialmente mais cashless.
Cashless e Pandemia
Em março de 2020, altura em que a quase totalidade da Europa entrou em confinamento, as compras através da Internet cresceram exponencialmente e com elas uma forma de pagamento que não envolvia transações com dinheiro físico.
Fosse através de carteiras digitais ou via cartão de crédito/débito, meios de pagamento privilegiados no e-commerce, o cashless saiu a ganhar, assim como saiu a ganhar quando os mais diversos governos mundiais, em estreita ligação com as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS), incentivaram a utilização do contactless nas compras presenciais.
Se isto configura o advento de uma sociedade cashless é o que veremos já de seguida.
O que é uma sociedade cashless?
No estrito senso da sua definição, uma sociedade cashless é um conceito económico ou estado em que todas as transações financeiras ocorrem por meio da transferência de informações digitais ao invés de notas ou moedas físicas.
Ora, é exatamente isto que carteiras digitais (Apple Pay, Google Pay, Paypal, etc.), códigos QR (códigos de resposta rápida em dispositivos móveis) ou o contactless (pagamentos com a simples aproximação de um dispositivo móvel ou cartão com contactless) a um terminal de pagamento (também contactless) permitem.
Cashless em Portugal e no mundo
Só em Portugal, durante o último ano, os pagamentos contactless mais do que triplicaram representando já mais de 35% da faturação total dos negócios portugueses – dados REDUNIQ Insights -, mas se quisermos alargar o âmbito de análise vamos encontrar países como a Suécia, China ou Finlândia onde a penetração de meios de pagamento cashless ultrapassa, de longe, estes números.
Na Suécia, apenas 20% das transações são realizadas com recurso a dinheiro físico e os transportes públicos da capital só aceitam pagamentos cashless como o proveniente de um cartão contactless ou de uma carteira digital, enquanto do outro lado do mundo, na China, a confiança nos pagamentos por códigos QR é tal que desde mercados locais a grandes hotéis, esta é a forma de aquisição mais utilizada.
Estes são apenas os exemplos mais conhecidos, mas se atendermos aos dados de um recente gráfico do Statista publicado no World Forum Economic descobre-se uma tendência global na preferência por pagamentos sem recurso a dinheiro físico de entre 60% a 77% dos consumidores de países como a Coreia do Sul, Japão, França, Espanha ou Rússia.
Existem, porém, algumas assimetrias. Enquanto os países desenvolvidos a que fizemos referência se encontram numa trajetória de desmaterialização dos pagamentos, o facto de a maioria da população de países em vias de desenvolvimento não possuir conta bancária (o que equivale a dizer que não possuem cartões bancários), como é o caso das Filipinas, território onde apenas 33% da população utiliza meios de pagamento cashless, dá a entender que ainda existe um longo caminho a percorrer.
Os dados disponíveis indicam um caminho, não um estado final. Traduzido, isto significa que os hábitos de consumo adquiridos durante a pandemia aceleraram a transição para uma sociedade sem dinheiro físico, mas ainda não se pode falar, em termos absolutos e definitivos, numa sociedade cashless.
Principais benefícios dos pagamentos cashless
Ao pensarmos nos benefícios que os pagamentos cashless nos trazem, talvez a primeira coisa que nos vem à cabeça seja a comodidade de pagarmos contas ou compras de qualquer montante e em qualquer lugar sem andarmos a contar os trocos que trazemos no bolso, mas isto é apenas a ponta de um grande icebergue de vantagens, como veremos de seguida:
- Velocidade de transação: fazer pagamentos em dinheiro físico consome muito tempo quer a consumidores, quer a empresas. Por isso, à semelhança do que acontece na Suécia, muitas empresas decidiram não aceitar dinheiro em espécie para que possam usufruir de transações mais rápidas, pagamentos com menores tempos de espera e uma mais fácil reconciliação no final do dia.
- Gestão e poupança: todos os dados relativos às transações cashless, independentemente do meio que se utilize (homebanking, carteiras digitais, cartão contactless) são arquivados, logo de fácil consulta e controlo por parte dos consumidores.
Além disso, transações com um cartão de crédito com cashback permite que recebamos uma parte do que gastamos no final do mês. Em Portugal temos o exemplo do cartão de crédito do Unibanco, que além da oferta de cashback e ter incorporada a tecnologia contactless é um cartão de crédito para compras online sem qualquer anuidade.
- Maior segurança: a criminalidade associada a roubo de dinheiro físico, falsificação de notas e transações ilegais que normalmente ocorrem em dinheiro “vivo” (tráfico de droga, por exemplo), tende a reduzir-se.
De igual modo, como as tecnologias de pagamento cashless, o rastreamento de potenciais crimes financeiros é mais fácil de se processar. Todos os pagamentos cashless são alvo de registo, o que torna mais difícil fugir aos impostos ou lavagens de dinheiro.
- Fim da gestão de caixa tradicional: levar o dinheiro da caixa para depositar no banco ou proceder à contabilidade no final de um dia de trabalho é uma tarefa habitual para milhares de empresários (comerciantes em particular). No âmbito de uma sociedade cashless, mover e proteger grandes somas de dinheiro tem os dias contados.
- Pagamentos internacionais: na zona Euro, os câmbios são coisa do passado, mas no grosso dos restantes países é necessário, na maioria dos casos, proceder-se à compra de moeda local. Com o advento do cashless e a possibilidade de se poder pagar um serviço com o recurso a aplicações no smartphone, as casas de câmbio passam a memória do passado.