Este artigo foi elaborado pelo nosso leitor e membro fundador do Movimento Partido Pirata Português, André Rosa
A questão que se coloca não se prende apenas e especificamente com a legislação nacional, mas com todo o conceito que a globalização está a impingir ao mundo de que os produtores de obras intelectuais merecem uma protecção especial que os restantes não têm. É por essa razão que este movimento está a surgir um pouco por toda a parte. Porque é um movimento verdadeiramente global, da mesma forma que as ideias que pretende combater.
[raw]
[/raw]
Os velhos modelos de negócio encontram-se cada vez mais obsoletos. A ideia de que uma criação intelectual pode ser comercializada da mesma forma que um produto físico está a desaparecer lentamente. Qualquer modelo de negócio tem de se adaptar à realidade do mercado em que se encontra e essa é a responsabilidade das empresas. As regras do mercado livre ditam o que deve ou não sobreviver. Não é nem pode ser responsabilidade do estado garantir que determinada indústria ou modelo de negócio sobreviva ou seja viável numa nova realidade. Existem muitas experiências e várias propostas que se podem apresentar. Eis alguns exemplos:
A indústria do software tem o caso óbvio do Open Source, com um sucesso estrondoso. Muitos dos produtos criados segundo este modelo são em tudo superiores aos produtos de código fechado e cada vez mais empresas começam a adoptar este modelo para os seus produtos e a contribuir nas várias comunidades de desenvolvimento. É também um exemplo maravilhoso da capacidade de colaboração de que o ser Humano é capaz quando lhe são dados a possibilidade e os meios. Este modelo está também a ser convertido para outras indústrias onde o seu potencial se está a tornar notório. O poder de uma comunidade motivada é realmente extraordinário. Um dos exemplos máximos disto é o Linux e a multiplicidade de distribuições gratuitas com vertente comercial que a sua existência permite.
Outro dos exemplos é o fornecimento de serviços relacionados com os produtos como, por exemplo, o suporte ou assistência técnica a software, os concertos dados por artistas, no caso da indústria musical, ou o “product placement” e a inigualável experiência do grande ecrã no que diz respeito à indústria cinematográfica, etc.
Não se deve desvalorizar também a motivação dos fãs pelo que a venda de merchandising relacionada com o produto inicial como t-shirts ou a criação de edições especiais com valor acrescentado oferecem também um bom potencial, isto, claro está, desde que o produto tenha qualidade. A qualidade é, mais do que nunca, uma característica essencial para a sobrevivência de um produto no mercado. Já não basta lançar uma linha interminável de produtos semelhantes e, em nada inovadores, baseados no que vendeu o ano passado com esperança de que as pessoas continuem a comprar, ou juntar no mesmo álbum uma música de qualidade com dez outras que de qualidade nada têm e esperar que as pessoas caiam na armadilha. A revolução da informação já aconteceu e o consumidor é cada vez mais difícil de enganar e cada vez mais exigente.
Finalmente existem vários modelos em que o pagamento é obtido antes da criação do produto ou aquando da sua publicação inicial. Dessa forma o criador recebe o seu pagamento no acto de entrega como qualquer outro profissional, em vez de receber dividendos constantes do uso futuro do produto do seu trabalho.
Obviamente que cada vez mais, os artistas estão mais perto do público e dos seus fãs. Cada vez mais os modelos de negócio existentes farão a ponte directamente da fonte para o consumidor, sem precisar de intermediários. A Internet, as redes sociais, todas as ferramentas de comunicação actualmente disponíveis permitem isso mesmo. Já não existe a necessidade de um guardião do mercado e é isso que assusta as editoras que vêem os seus dias contados. Contrariamente ao que essas empresas afirmam, elas não defendem os interesses dos artistas nem estes são prejudicados por esta revolução. Antes pelo contrário, isto trás publicidade de borla aos artistas e a Internet acabou por se tornar na sua grande editora.
É também de lembrar que historicamente existem vários exemplos de indústrias que desapareceram completamente devido ao progresso tecnológico e nunca caiu na cabeça de ninguém impedir esse progresso em nome de salvar as indústrias obsoletas. Apenas a título de exemplo, lembro que antes da existência do automóvel as pessoas tinham de se deslocar a pé ou com a ajuda animal e os criadores de cavalos que eram utilizados para esse fim prosperavam com o negócio. Com a revolução dos meios de transporte motorizados, esses mesmos criadores foram amplamente prejudicados e viram o seu negócio ser substituído por aquela nova tecnologia que os tornava obsoletos. No entanto nem a sociedade nem o estado resolveu protege-los, criminalizando o automóvel. Ninguém actualmente acha que se devia ter tomado esse caminho e certamente que se tal tivesse acontecido estaríamos hoje muito pior do que estamos. Como este exemplo, muitos outros existem. O que se passa actualmente é exactamente a mesma situação. Será que queremos mesmo bloquear o nosso futuro dessa forma por causa de uma visão curta?
Existe também o argumento de que a partilha ilegal de ficheiros equivale a um roubo, o que é um argumento comum mas que cai por terra facilmente por várias razões.
O conceito original de roubar implica que a vitima de roubo perde o acesso ao que lhe foi roubado. Tal é o caso com um produto físico mas não com um produto digital em que o que se partilha é uma reprodução desse mesmo produto, sendo que o original se mantém intocado.
Seguindo esta premissa, para além dos produtos físicos, será possível roubar alguns bens intangíveis que não sejam passíveis de cópia. Um exemplo dentro do debate dos direitos de autor seria o furto dos próprios direitos previstos por lei para os autores, caso em que o autor perderia completamente tal direito que seria obtido por outro à sua revelia. Situação passível de acontecer no caso de alguém se apoderar da cópia original de uma criação e a registar como sendo sua sem que o autor consiga depois provar o contrário. Mas este não é de todo o caso em questão.
Este argumento por si só mostra que não se pode comparar um roubo a uma cópia. O que acontece na realidade é uma quebra de um monopólio. Alguém toma para si um direito que por convenção seria exclusivo do autor. De notar que o autor não perde de todo esse mesmo direito, apenas a expectativa de que seria o único a utilizá-lo e essa é a própria definição de monopólio.
Desta forma o argumento do roubo transforma-se numa questão de monopólio e se ele deve ou não ser assegurado pela lei. Existem muitos argumentos de ambos os lados. Obviamente que defendo que esses monopólios devem ser abolidos pois são protecções especiais obtidas para um certo tipo de indústria à custa das liberdades e direitos de cada um de nós. Aconselho a visualização deste site com mais informações sobre este ponto: http://questioncopyright.org/
Posto isto, as alterações que o Partido Pirata Português propõe são semelhantes àquelas propostas pelo Partido Pirata Sueco e pelo movimento Partido Pirata Internacional. São elas:
- O direito ao anonimato:
Este direito tem de ser aceite e consagrado como um direito essencial do ser humano que não pode ser quebrado em circunstância alguma sem uma ordem judicial baseada em provas que demonstrem uma necessidade real para tal. Sem anonimato não existe real liberdade de expressão e esta é essencial para uma verdadeira democracia. Estão em causa todos os pilares da nossa sociedade.
- A legalização da partilha de ficheiros para fins não comerciais:
Não se pode lutar contra a evolução da tecnologia. Existem inúmeros casos de tentativas falhadas na nossa história. E sem quebrar o direito à privacidade dos cidadãos, não é possível controlar o fenómeno da partilha de ficheiros. Como tal não se devem gastar recursos preciosos do estado numa caça que está condenada à partida. Ao mesmo tempo é dever do governo representar o povo e o povo mostra cada vez mais e de forma inequívoca a sua vontade de participar nesta actividade. Criminalizar milhões de pessoas não é de todo uma opção viável.
- Uma redução substancial do prazo de direitos de autor e conexos para fins comerciais:
Este conceito garante um monopólio sobre um determinado produto ao seu criador. Tal protecção não existe para mais nenhum produto e é prejudicial para a inovação e progresso. Desde que o homem existe, cria e as suas criações dependem de criações anteriores, construindo em cima delas. Os monopólios existentes actualmente tentam fortificar cada vez mais o cerco começando a bloquear gradualmente essa evolução, o que têm perigosas consequências a vários níveis da sociedade, começando pelo óbvio da cultura, mas estendendo-se também à educação e saúde. Tudo isto a um preço bastante elevado no que diz respeito à liberdade da população em nome do lucro de alguns. Compreendemos no entanto que algumas pessoas precisarão de um incentivo económico para continuarem a criar pelo que aceitamos o compromisso de manter o monopólio comercial sobre a sua criação durante um curto período de alguns anos, contrariamente ao que se passa actualmente que o estende até 70 anos após a morte do próprio autor, o que por si só revela o absurdo desse suposto incentivo, pois nenhum incentivo conseguirá vencer a morte de um autor.
- A abolição do actual sistema de patentes:
Defendemos esta medida pelas mesmas razões indicadas para a redução dos direitos de autor para fins comerciais. O sistema de patentes tem sido especialmente prejudicial a todos os níveis da sociedade, existindo milhões de pessoas a morrer por não terem acesso à medicação necessária. Perguntamos que sociedade é esta que permite que os lucros de uns se sobreponham à vida de tantos outros. Quantas inovações revolucionárias com o potencial para alterar as nossas vidas para melhor não se encontram esquecidas e fechadas num arquivo de patentes, proibidas de serem utilizadas por qualquer outra pessoa, simplesmente porque o inventor nunca as conseguiu comercializar. O sistema de patentes é também especialmente prejudicial à economia, desincentivando novas empresas inovadoras e bloqueando-as do mercado através de mecanismos de pools (aglomerados) de patentes que as empresas já estabelecidas utilizam para controlar todo o mercado. Ora um sistema que pretende incentivar a inovação mas que, como pode ser observado, alcança exactamente o contrário, só pode ser considerado um sistema falhado.
Por estas e outras medidas presentes no nosso manifesto, convido todos os leitores a visitarem o nosso site e se concordarem com o nosso ponto de vista juntem-se a nós e contribuam com a vossa e na recolha de mais assinaturas.