Quando Bill Buxton trabalhou no centro de investigação da Xerox, examinou os telefones feitos por crianças: dois copos ligados por um fio. Pense bem: o copo usa o mesmo “hardware” para entrada e saída de som. Porque é que, perguntou Buxton, o mesmo princípio não se pode aplicar ao texto nos computadores – usando um só dispositivo para entrada e saída de texto, em vez de um teclado para entrada e um ecrã para saída.
“Muitas das grandes descobertas estão mesmo debaixo do nosso nariz”, afirma. “Muitas das coisas que emergem como novas têm as suas raízes em acontecimentos do passado – e em alguns casos, num passado muito distante”. Antes de olharmos para o futuro dos teclados, vamos olhar para a sua evolução.
Buxton não era o único com esta ideia. Umas décadas mais tarde, uma série de investigadores e grandes orçamentos de investigação resultaram nos teclados touchscreen dos tablets e smartphones. Entradas e saídas na mesma interface. O teclado foi fundido com o ecrã, pelo menos para algumas tarefas computacionais.
Mas tal como todos os que já escreveram num teclado virtual – ou falaram para uma aplicação de controlo por voz como a Siri, podem comprovar que nenhum destes métodos de entrada se compara a um teclado tradicional, em termos de conforto, velocidade e precisão. Talvez um dia consigamos ligar os computadores aos neurónios, mas até lá, o simples mas funcional teclado electromecânico estará entre nós, sempre a melhorar.
Buxton, agora um guru do design na Microsoft Research, ainda examina teclados antigos cuidadosamente, à procura de truques esquecidos e tecnologias que poderão resultar em novas ideias acerca da introdução de informação num computador.
Olhando para o passado
A evolução do teclado não é uma cronologia imaculada. As contribuições para o seu look & feel e tecnologias de base provêm, às vezes, de modelos anteriores e de outros tempos, de um canto escondido no universo do inventor.
Os primeiros dispositivos relacionados com os teclados modernos datam do século XIX. Em 1852, John Jones patenteou um “tipógrafo mecânico” e, 15 anos mais tarde, Christopher Sholes recebeu a patente para uma “máquina de escrever” – considerada a primeira máquina de escrever. Alguns aspectos dos teclados destas máquinas influenciaram muito o design dos teclados modernos.
“A máquina de escrever [teclado] tinha todo o tipo de funções. A tecla “Shift” era mesmo muito grande pois era necessária uma grande área para empurrar e puxar o carreto”, explica David Hill, Vice Presidente do departamento de Design e Experiência de Utilizador na fabricante de computadores Lenovo. “Era preciso uma vantagem mecânica”.
Uma das maiores influências no teclado moderno foi a máquina de escrever Selectric da IBM. A empresa lançou o primeiro modelo da sua máquina de escrever electromecânica em 1961, numa altura em que a capacidade de escrever rápido e com precisão era um requisito muito procurado.
Dag Spicer, curador sénior do Computer History Museum, denota a proeminência dos modelos Selectric, os administradores adoravam o toque do teclado, dada a preocupação da IBM em torná-los ergonomicamente confortáveis. “A IBM tem, mais do que qualquer pessoa ou entidade, procurado a ergonomia (de teclado) que melhor satisfaz o utilizador”, explica Spicer. Por isso, quando o PC apareceu uma ou duas décadas mais tarde, o Selectric já era visto como a base para o desenho de teclados.
No fim dos anos 70, empresas como a Cherry, Key Tronic e a divisão Micro Switch da Honeywell apareceram com novas abordagens imitando o toque mecânico de uma máquina de escrever. “Era muito importante, na altura, o toque, a fiabilidade e a velocidade atingidas com um determinado desenho do switch“, explica Craig Gates, CEO da KeyTronicEMS.
Os primeiros switches de teclado
Um dos primeiros teclados de computador do princípio dos anos 70 incorporava reed switches, que funcionam com um íman e dois filamentos de metal. Quando o campo magnético está suficientemente perto, empurra simultaneamente os dois filamentos e completa o circuito – ou, neste caso, um caracter.
Mas os filamentos são frágeis, tais como os de uma lâmpada convencional e por isso estes teclados reed não eram muito fiáveis. Se se estragassem, desalinhassem ou ficassem sujos de pó nos pontos de contacto, o teclado deixava de funcionar. Ao contrário das lâmpada convencionais, as teclas individuais não eram fáceis de se substituir. Além disso, estavam sujeitas a micro-vibrações que abriam e fechavam o switch várias vezes em cada caracter, enganando o computador pois parecia que a mesma tecla tinha sido premida várias vezes. Este problema das micro-vibrações é ainda corrente, mas os micro-processadores conseguem filtrá-las.
Por isso, no fim dos anos 70, explica Gates, os reed switches deram lugar a teclas que seguiam um princípio magnético chamado o Hall Effect. Estes teclados, fabricados pela Micro Switch e outros, não usavam pontos de contacto físico em cada pressão de tecla, mas sim magnetismo, que pode ser menos preciso mas não requer quaisquer partes mecânicas.
Entretanto, a Key Tronic, ansiosa por deixar os reed switches, desenvolveu um switch capacitivo, que colocava um pouco de alumínio por baixo do cimo da tecla. Quando a tecla era premida, a dobra alterava a capacidade eléctrica do circuito e o micro-processador registava a tecla. A ideia foi logo melhorada com os teclados de membrana, que simplificavam os mecanismo de capacidade eléctrica por baixo da tecla e reduziam custos.
Reduzir o hardware, cortando custos
Embora os materiais pareçam baratos, os teclados eram muito caros no início dos anos 80. Um teclado típico como o Key Tronic e o Micro Switch custavam cerca de $100, contrastando com os $3 ou $4 dos teclados OEM actuais. Para cortar custos num mercado competitivo, os fabricantes procuraram formas de cortar em hardware, mas garantindo que o cimo das teclas, peso das teclas, equilíbrio, base e distância entre as mesmas, eram familiares para os dedos do utilizador final.
Isto obrigava à avaliação do hardware que possibilitava o movimento da tecla para cima e baixo. O ponto de “clique” é um dos conceitos mais importantes de uma tecla, de acordo com Aaron Stewart, um engenheiro de desenho sério apelidado de “Sr. Teclado”. No ponto em que a tecla “clica”, o cérebro regista a introdução de um caracter e o dedo é recolhido. Lembrem-se da primeira vez, do choque de tocar num teclado touchscreen sem esse feedback físico. Adicionalmente, os fabricantes de teclados têm de considerar a resistência da tecla, permitindo o descanso do dedo sobre a tecla sem a premir, mas também tem de ser suficientemente sensível para não ser necessário premir com muita força cada tecla.
Em 1978, a IBM patenteou o mecanismo de tecla “buckling spring” que simulava o toque dos velhos Selectrics. O mecanismo usava uma mola presa a superfícies não paralelas debaixo da capa da tecla. A mola encolhia normalmente quando premida mas “prendia” de lado no ponto de “clique” devido à superfície não paralela, criando um “clique” familiar ao som do popular teclado Modelo M da IBM e de outros teclados antigos. A porção da mola que ficava presa activava o circuito e gerava um caracter.
Mas o corte nos custos ajudou a descobrir novas formas de suspender a tecla, no caso da IBM e outros fabricantes. Cúpulas de borracha, que funcionam com o mesmo princípio de “clique” como um desentupidor, e scissor switches (mecanismo de tesoura), tornaram-se populares no fim dos anos 80 e princípio dos anos 90. Parte do objectivo destes novos designs era reduzir a distância entre teclas. O conforto e a velocidade de escrita depende da distância entre teclas em cada caracter. Reduzir fracções preciosas de milímetros melhorou a experiência de escrita para muitos utilizadores.
“Comparando com exemplos histórico, os desktops e notebooks actuais têm cerca de 40% menos distância entre teclas”, afirma Hill, da Lenovo. Escrever em teclados cúpula de borracha e mecanismo de tesoura é mais silencioso.
Os modelos eram também mais baratos de se produzir, de acordo com Gates, e estes dois tipos de molas ainda são a base da maior parte dos teclados do mercado. Actualmente, as teclas scissor switch são usadas em portáteis e teclados finos, incluindo aqueles em “chiclete” dos portáteis da Apple. A cúpula de borracha mais alta é tipicamente encontrada em teclados comuns de desktop e usam uma estrutura em “chaminé” para estabilizar a tecla.
Como qualquer tecnologia passada, ainda há entusiastas que acreditam nas velhas molas da IBM . No entanto, os teclados com switches mecânicos têm renascido, fruto da necessidade dos utilizadores sentirem feedback táctil.
Mais fino, mais leve… numa só mão?
Hoje em dia, fazer um portátil com um grande teclado não é tarefa fácil. Os designers têm em conta uma estrondosa quantidade de matemática e análise de hábitos até chegar a distâncias e posições muito precisas entre as teclas, sendo exactamente aquelas que o nosso cérebro espera, correndo o risco de teclar mais devagar e com mais erros. Entretanto, os factores ergonómicos devem ser pesados com as dimensões, peso e outras considerações práticas de design, explica Stewart da Lenovo.
As teclas côncavas guiam os dedos para o seu centro, mas esta forma torna mais difícil fabricar portáteis finos. Um teclado requer uma fundação sólida, mas o material adicional pode resultar em mais peso. Por outro lado, a redução de materiais no teclado deixa espaço para micro-processadores e baterias maiores. Stewart apelida a soma de todos estes factores de desenho, um alvo em movimento.
Os fabricantes tentam constantemente cortar em custos e construir teclados mais pequenos – mas as pessoas querem consistência nos seus teclados, pois é a fundação da sua interacção com o computador. Uma empresa pode optimizar todos os mecanismos e circuitos debaixo da capa da tecla, mas se resultar numa experiência de escrita pobre, as pessoas não vão comprar o produto. Os fabricantes de teclados têm de pesar o valor da inovação com o impacto ergonómico.
Por agora, Stewart acredita que o intervalo de inovação se estende apenas ao espaço por baixo da capa da tecla. “Com a tecnologia actual, achamos que há um limite finito para criar [teclados finos e de alta qualidade]”, afirma.
Naturalmente, alguns tentam provar que Stewart está errado. Uma empresa chamada Pacinia – comprada pela fabricante de touchpads Synaptics em Junho – quer substituir as “tesouras” e “cúpulas” (scissors e domes) com um novo tipo de sensor capacitivo. A empresa espera apresentar protótipos comerciais em meados de 2013. Agora chamada tecnologia Synaptics’ ThinTouch, conseguirá metade da distância de viagem das teclas de um MacBook Air, de acordo com a empresa.
A Apple não tem estado a dormir neste campo: em Fevereiro deste ano patenteou o seu próprio teclado super fino. Outros fabricantes de hardware estão entretanto a trabalhar nos teclados touchscreen que a Apple ajudou a popularizar. O fãs de teclados touch queixam-se da falta de feedback físico e então, empresas como a Immersion, estão a incorporar mecanismos vibratórios de feedback.
Uma tecnologia chamada Tactus está a seguir uma abordagem diferente usando “botões” de micro-fluidos – são pequenas bolsas de líquido na superfície do ecrã, estando cheias apenas quando é necessário escrever. Quando não estão a ser usada, esvaziam, desaparecendo da superfície. O CEO da Tactus, Craig Ciesla, espera que a empresa consiga trazer ao mercado um produto em meados do próximo ano.
Embora pareça muito futurista, uma das tecnologias base do Tactus é já antiga. Ciesla explica que os micro-fluidos já existe há umas décadas em indústrias como a da biotecnologia e impressoras de computador. “Estamos apenas lançá-la de uma forma única e nova”, afirma.
Rumando numa direcção completamente diferente está a Twitch Technologies, desenvolvendo acessórios como um par de teclados de mão que envolvem as margens esquerda e direita dos tablets. Os dedos escrevem na traseira do dispositivo e os polegares à frente, e usam-se combinações para introduzir caracteres – por exemplo, carregando o dedo mindinho esquerdo e indicador direito resulta num “A”.
É difícil imaginar uma re-invenção do esquema do teclado, mas mesmo os teclados de uma só mão sem letras têm raízes no passado. Quando o inventor Doug Englebart apresentou “The Mother of All Demos” em 1968 – uma apresentação das tecnologias de computação que ainda hoje são usadas, como o rato e a videoconferência – demonstrou um teclado com 5 cordas, que produziam letras com diferentes combinações de dedos.
O problema é que, tal como Buxton da Microsoft aponta, quando é implementado um novo teclado, o utilizador tem de aprender a teclar de novo. Mas pode valer a pena.