Desenvolvido pela Tango Gameworks (Bethesda Softworks), Ghostwire Tokyo pode ser considerado um dos jogos em maior destaque deste primeiro quadrimestre de 2022.
Tal como acompanhámos no decorrer do últimos meses (ver aqui ou aqui), trata-se de um jogo que rompe com o legado do estúdio de títulos de terror, seguindo numa direção diferente.
Nós já nos juntámos a Akito e a KK na aventura pela cidade deserta de Tóquio.
Ghostwire Tokyo corresponde a um desafio diferente para a Tango Gameworks, que ficou conhecida pelos seus jogos The Evil Within.
Não sendo um titulo de terror como os que referi, Ghostwire Tokyo apresenta ainda assim algumas linhas e momentos que relembram essa herança dos estúdios. No entanto, trata-se de um desafio completamente diferente para a Tango e a grande questão é se o desafio foi superado.
O inicio
Ghostwire Tokyo arranca envolto num clima de mistério. A cidade de Tóquio, mais precisamente o bairro de Shibuya, é invadido por uma estranha névoa que o envolve completamente, e escondendo algo de sinistro que decorre por detrás desse véu.
Mas não foi apenas isso e, de forma misteriosa, todos os habitantes da cidade desaparecem inexplicável deixando apenas as roupas nos locais onde antes se encontravam.
Todos? Não. Akito, o nosso personagem consegue resistir à onda de desaparecimentos. Mas não o fez sozinho. Acontece que nessa altura, Akito foi possuído por um espirito de KK, uma figura também ela misteriosa que vamos descobrindo ao longo do jogo e que por sua vez, também tem algo a ver com o que se passa.
Ao ver o que o rodeia, e tendo uma primeira visão das aberrações que o nevoeiro trouxe com ele, Akito entra em aflição pois tem a sua irmã (Mari) mais nova num hospital perto dali. Apesar de KK ter a sua própria motivação, acaba por estar no corpo de Akito e assim partem os dois na tentativa de salvar Mari e a própria cidade.
A cidade
A ação decorre no bairro de Shibuya (Tóquio) e, não o conhecendo, devo confessar que pelo que se vê no jogo, deverá tratar-se de um local repleto de beleza tipicamente oriental, misticismo, e também muita animação. E isso sente-se no jogo que, apesar das ruas da cidade se encontrarem praticamente despidas de vivalma, todas elas nos deixam uma clara insinuação de grande azáfama e movimentação recente.
Todas as pessoas desapareceram mas, parece que ainda um segundo atrás, lá estavam. As suas roupas no chão, os carros acabados de embater uns nos outros, as taças de comida à espera de serem consumidas… uma memória curta da azáfama do dia a dia, que cria o ambiente criado no jogo é extraordinário e envolve-nos na história de uma forma extremamente natural.
A cidade encontra-se absolutamente fantástica e, todos os espaços que encontramos, que vão desde mercados ao ar livre, interiores de edifícios (hospital, alguns arranha-céus,…) , as ruas de comércio, as avenidas mais espaçosas… estão deliciosamente representados com uma qualidade gráfica soberba. Ghostwire Tokyo delicia-nos a todos os momentos com um dos mais belos e completos cenários que um jogo já nos conseguir trazer para os écrans.
Trata-se de um trabalho tão impressionante que se torna extremamente fácil, sentirmo-nos tentados a explorar cada canto, cada topo de prédio, cada esquina. Mesmo quando estamos a meio de algo. A cidade está francamente impecável.
Como referi, a cidade encontra-se totalmente envolta no nevoeiro e inacessível ao jogador. À medida que vamos avançando na história, Akito e KK vão desbloqueando novas secções, graças à purificação de templos e altares que se encontram espalhados pelo bairro.
Com essa sucessiva “limpeza” desses altares, vamos libertando-a do nevoeiro e dos Visitantes que as invadiram, abrindo também a porta a novos locais, novos tesouros, novas missões secundárias, novos eventos e novos inimigos.
Akito e KK
No que se refere aos personagens principais de Ghostwire Tokyo, o jogo apresenta-nos um “dois em um”. Isto pois, apesar do corpo do personagem principal que controlamos pertencer a Akito, grande parte das suas habilidades e poderes pertencem a KK. Trata-se de uma união bastante interessante e que, no contexto do jogo, funciona bastante bem.
Quanto a motivações, Akito procura desesperadamente por uma forma de salvar a sua irmã que se encontra refém de Hannya (o misterioso vilão do jogo) mas, por outro lado, KK tem motivações um pouco mais sinistras e que vamos descobrindo ao longo do jogo. É algo que também aumenta claramente o interesse em saber mais do jogo e dos seus intervenientes.
Alimentado pelos poderes sobrenaturais de KK (existem ocasiões em que essa ligação é “desligada”), Akito tem acesso a um conjunto de habilidades e poderes necessários para combater os fantasmas e assombrações que invadiram a cidade.
Uma das principais habilidades que KK disponibiliza, é a Visão Espectral (que pode ser melhorada). É uma ferramenta extremamente útil para, por breves momentos, nos dar uma noção dos pontos de interesse (objetos, entidades,…) que se encontram por perto.
Shibuya é um bairro extremamente diversificado, tendo zonas de casas mais baixas e outras com prédios de mais de 10 andares de altura. Por isso mesmo, uma outra habilidade extremamente útil, é a de podermos planar entre os prédios (também tem os seus upgrades). Graças a esta habilidade Akito pode chegar a pontos de difícil acesso onde, em muitos deles, se encontram tesouros por descobrir. Tesouros esses que tanto podem ser sob a forma de Meika (usada nas lojas que se espalham pela cidade), a moeda de Ghostwire Tokyo, como de outros itens e mesmo colecionáveis.
Quando não é possível planar, poderemos ainda usar uma outra ferramenta muito útil para aceder a pontos altos: a capacidade de uso do Grapple (tipo de gancho) que pode ser preso a um Tengu. Trata-se de um tipo de Yokai, que pairam em locais altos e que com o Grapple nos permite atingir essas zonas.
Apesar do uso do Grapple ou da capacidade de planar, há algo que destoa um pouco nesta questão das alturas. A decisão da equipa em não gerar danos quando caímos do alto dos edifícios, parece-me algo discutível.
Existem 3 categorias de habilidades que Akito possui graças a KK e que podem ser melhoradas:
- Habilidades(melhorias de absorção de espíritos, de planar, de usar o Grapple,..)
- Ataques Etéreos (melhorias aos ataques de vento, fogo e água)
- Equipamento (Aumento de número de consumíveis transportados, melhorias aos Talisman, arco e flechas,…)
Combate às assombrações
Em Ghostwire Tokyo, o combate às assombrações não é feito como se tratassem de seres verdadeiramente físicos mas sim, sendo forças sobrenaturais e etéreas.
KK resolve esse problema ao colocas vários poderes distintos ao dispor de Akito. Akito adquire assim a capacidade de lançar ataques etéreos de Vento (o mais usado ao inicio), água e fogo (melhor e mais poderoso para usar contra vários inimigos). São ataques gerados com força etérea com as mãos do nosso personagem (temos uma visão na primeira pessoa) e que podem ser todos eles, melhorados com o uso de Skill Points ganhos no decorrer do jogo.
Cada um desses ataques é simples. clicando R2 lançamos um ataque rápido enquanto se deixarmos a pressionar o gatilho, lançamos um ataque mais potente sobre os nossos inimigos.
Com isto, pode-se dizer que o combate acaba por ser bastante linear mas, não querendo dizer obrigatoriamente que seja demasiadamente simples. Os combates com os bosses e Visitantes (Visitors no original e nome dado às assombrações que se escondem por detrás do nevoeiro) mais poderosos são exigentes e muitas vezes obrigam-nos a procurar refugio ou retirada.
Cada um desses poderes de ataque, é alimentado por um tipo especifico de orbs. Por exemplo, o ataque de vento é aumentado por orbs verdes, do fogo pelas vermelhas e da água, pelas azuis. Essas orbs são colhidas, quer pela eliminação de Visitantes, quer pela destruição de objetos corrompidos e vão enchendo um contentor de orbs que são gastas depois com os ataques respetivos.
Existem duas formas principais de eliminar os Visitantes. Seja pela destruição completa ou então arrancando-lhes o “Coração” (Core no original em inglês). Mesmo antes de morrerem, os Visitantes ficam breves momentos com os seus Cores acessíveis para serem arrancados por Akito/KK e com o pressionar de L2, conseguimos sacá-los e ganhar assim mais Skill Points e orbs.
Apesar do combate ser extremamente satisfatório (mesmo sendo simples), o facto de termos uma visão na primeira pessoa traz alguns problemas, nomeadamente quando, no meio de um combate, somos obrigados a recuar sem nos apercebermos do se encontra atrás.
Para combates os Visitantes, podemos ainda usar uma arma com forte ligação à história e misticismo nipónico: arco e flechas especial. Trata-se de uma arma bastante útil para ataques à distância mas que se torna complicado de usar contra alguns espíritos mais irrequietos.
Por fim, convém ainda referir os Talismans. Tratam-se de objetos carregados de misticismo que apresentam várias finalidades, podendo ajudar por exemplo, a bloquear por segundos os ataques e movimentos dos Visitantes, ou distrai-los.
E, por falar em Visitantes, existem vários e bastante diferentes entre si (apesar de se repetirem na aparência, dentro de cada classe).
Cada um apresenta os seus próprios ataques e movimentos, correspondendo dessa forma, a desafios diversificados. Por exemplo, o Rain Slasher refere-se a espíritos femininos que simbolizam as almas de pessoas com fortes problemas de conflito nos seus locais de trabalho. Outros, os Rain Walker, espíritos engravatados de pessoas aprisionadas no complexa teia infindável de trabalho que lhes sugou toda a alma. Ou os Shadow Hunter que, vestidos com fardas, correspondem a almas que perderam o norte e que passaram a ser aquilo contra o que lutavam antes. Ou as Marionette que se tratam de almas repletas de frustação e inveja, fruto de uma existência vazia.
Salvar Almas
Enquanto exploramos a Shibuya, vamos também nos apercebendo que as suas almas, não chegaram a sair do bairro e dessa forma, encontramo-nos rodeados de milhares de almas perdidas.
No decorrer da sua demanda pela salvação da sua irmã e do bairro com seus habitantes, Akito e KK partem em simultâneo numa missão de salvação das almas aprisionadas e dessa forma, com a ajuda de Katashiro (talismãs místicos relacionados com purificação e libertação), vão salvando essas almas.
Ao todo, são cerca de 250.000 almas para salvar e à medida que os vamos recolhendo acabamos por encher os Katashiros (podemos comprar vários nas lojas existentes na cidade). Ao estarem cheios não conseguem absorver mais almas pelo que teremos de libertar as já salvas. Para tal, podemos usar cabines telefónicas espalhadas pela cidade onde, do outro lado da linha se encontra um tal de Ed que os vai processar e preparar a sua libertação.
Ocasionalmente, existem algumas almas que se encontram presas por detrás de feitiços mais poderosos que têm de ser quebrados por Hand Seals (Selos Manuais). O processo é simples e passa por reproduzir no touchpad o desenho apresentado no écran. É simples e acaba por se tornar um pouco repetitivo, pois os desenhos apresentados não variam muito.
Podem existir almas para salvar em praticamente todo o lado… no solo, no topo de um edifício, num WC do hospital…e a cidade tem muitos sítios por onde procurar…
À medida que vamos absorvendo essas almas, vamos também atingindo alguns milestones que nos dão Skill Points para melhorar as nossas habilidades ou equipamentos.
Essas cabines telefónicas, além de servirem como meio de salvação de almas, também servem para Ed (e não só) nos transmitirem dicas ou missões para concretizar.
A cidade, à medida que vamos explorando cada secção, apresenta-nos dezenas de missões secundárias. Tratam-se de missões que nos são dadas por espíritos que têm alguns assuntos por resolver. Na sua generalidade, são missões simples a um pouco lineares mas que se apresentam variadas o suficiente na sua narrativa própria. Isso faz com que os jogadores se dispersem um pouco da missão principal mas, por estarem bem enquadradas no contexto, nunca cheguem a desligar completamente do mistério principal.
Na maior parte dos casos são missões sobre sentimentos de perda, de emoções reprimidas, sentimentos como a ganância, amor por um ente querido,… e algumas bem mais engraçadas, como um caso de uma alma num jardim publico que não consegue ir ao WC público pois ouve um barulho de uma das retretes.
Muito mais para descobrir…
Ghostwire Tokyo é um jogo que tem muito mais para descobrir e o processo de ir avançando na cidade (muito generosa em tamanho) é longo e repleta de surpresas e pontos altos.
Uma curiosidade do jogo, é a de prestar homenagem aos animais de companhia, como cães e gatos. Podemos encontrar vários destes animais espalhados pelo jogo aos quais podemos ler os pensamentos ou simplesmente dar-lhes comida. Se, por seu lado, os gatos ao lhes darmos um acepipe se questionam por onde andam os humanos todos, por seu lado, os cães podem desenterrar tesouros de Meika do chão.
E a tal comida para cães e gatos (tal como muitos outros itens e alimentos para Akito) pode ser adquirida nas lojas de Nekomata (um Yokai em forma de gato que abriu várias lojas pela cidade).
Ocasionalmente, encontramos alguns Yokais espalhados pela cidade cujos poderes poderemos. Dessa forma, além de ganharmos poderes novos, também adquirimos Megatama. A Megatama é, à semelhança dos Skill Points, um item que vamos adquirindo e que nos permite desbloquear novos caminhos de habilidades que, por sua vez, nos disponibilizam acesso a novas habilidades.
Desafio superado. A Tango Gameworks saiu da sua zona de conforto e criou uma obra-prima de ficção, aventura e ação que agarra os jogadores e prende-os numa espécie de teia de mistério e ilusão.
São largas as dezenas de horas que um jogador mais perfeccionista terá de disponibilizar para completar o jogo a 100%, tendo em consideração a quantidade de missões secundárias, de colecionáveis por encontrar, de almas para salvar, e muito mais.
Tudo isto numa cidade fantasticamente reproduzida e acompanhando um mistério que nos incentiva a descobrir cada vez mais.
Ghostwire Tokyo é fácil de recomendar, pois trata-se de um dos melhores jogos que os últimos meses viram ser lançados.