É compreensível que a maior parte dos jogadores de hoje apreciem títulos visualmente mais apelativos e com acção a decorrer em realtime. Contudo, existem ainda algumas editoras que teimam (e ainda bem) em não deixar morrer um género que tantos bons jogos lançou ao longo dos anos.
Ora, a propósito … a Slitherine é uma editora britânica que faz parte desse grupo que mantém o legado desses grandes jogos e recentemente lançou Afghanistan ’11, um titulo que, tal como o nome indica, centra a sua acção no conflito afegão, entre as tropas norte-americanas e os talibãs.
O Pplware já experimentou a guerra de contra-insurreição nesse país do Médio Oriente e deixamos-vos as nossas impressões.
Conforme mencionei acima, Afghanistan ’11 é um titulo que cobre o conflito afegão. De um dos lados encontrava-se o Exército norte-americano (e forças afegãs do regime) e do outro, os talibãs (grupo insurgente que inclusive chegou a ser treinado pelos americanos durante o conflito russo-afegão).
Em termos históricos, este conflito ganhou forma após os eventos ocorridos no fatídico dia 11 de Setembro de 2001 (o ataque às torres do World Trade Center). Como forma de retaliação ao ataque em solo americano, a Administração Bush ordenou o deploy de tropas norte-americanas no Afeganistão e começou assim uma investida que se veio a prolongar até aos dias de hoje e em vários cenários do Médio Oriente.
Os objectivos eram claros. Por um lado, os americanos pretendiam dar uma lição aos talibãs e erradicar o fundamentalismo islâmico que representavam e por outro, repor a democracia no Afeganistão.
É então perante este cenário que o jogador é colocado quando assume o papel de comandante das forças norte-americanas em terreno afegão. Ao longo de uma campanha com 18 cenários distintos, o jogador terá de, não só eliminar a ameaça militar dos talibãs no território afegão, garantir o apoio das populações locais, e ajudar na criação de um estado democrático, isto tudo tentando manter a opinião pública em casa (nos Estados Unidos) a favor.
O jogo é composto por dois ecrãs distintos. Se por um lado temos um Mapa Estratégico onde podemos ter uma visão alto nível das operações, por outro, temos um Mapa Operacional onde a acção decorre (e onde passamos a maior parte do tempo).
Visualmente, o mapa operacional de Afghanistan ’11 encontra-se semelhante ao do Steel Panthers II. Trata-se do mapa onde decorre a acção propriamente dita (movimentações e acções militares).
O Mapa Estratégico corresponde ao ecrã onde acompanhamos as operações em curso a um nível mais alto. Com a visão global do terreno, temos informações variadas de extrema importância. É neste mapa que temos a indicação dos objectivos principais do cenário em questão, quais as nossas forças no terreno, e onde é compilada grande quantidade de informação de intel. É ainda aqui que temos vários indicadores que nos dão uma noção sobre o quanto apoio as nossas acções estão a ter, das populações e poder locais. Este ponto é particularmente importante pois, tal como quando acontecem intervenções militares em países estrangeiros, temos de tentar garantir o apoio das populações locais.
Como o nome indica, no Mapa Operacional decorre toda a acção no terreno. E há muito para fazer e muitas decisões a tomar. É aqui que procedemos ao movimento das nossas tropas, a ataques, a acções de sensibilização junto da população ou simplesmente a explorar o território.
Invariavelmente começamos os cenários com uma base, que corresponde ao ponto de partida para quase todo o tipo de operações ou estratégia. É na nossa base que vamos adquirindo novas unidades (sob a forma de reforços provenientes dos USA) ou treinamos forças afegãs para o novo Exército Afegão.
Apesar das forças afegãs treinadas serem fracas e/ou constituídas principalmente por infantaria, já as tropas que podemos mandar vir dos Estados Unidos são outra história. À nossa disposição temos um vasto conjunto de unidades, cada qual com as suas funções e características e, acima de tudo, com importância em determinados momentos. Por exemplo, no inicio de cada cenário, e numa altura em que é importantíssimo criar laços de confiança com os aldeões locais, é importante enviar expedições aos aldeamentos afegãos. Contudo nunca se sabe se o terreno se encontra minado ou não e dessa forma os US Huskies ganham particular importância , um veiculo de draga-minas, que limpa o caminho para o avanço das restantes tropas. É, portanto na base que vamos construindo o nosso exército com o qual tentaremos atingir os objectivos propostos.
Entre as diversas unidades disponíveis encontram-se as Special Forces. Trata-se de unidades mais resistentes em combate e que têm também o poder para ajudar na criação e treino de unidades afegãs locais. Basicamente, uma unidade de Special Forces pode criar e treinar, enquanto na base, uma unidade de exército regular afegão. Estas unidades constituídas por soldados locais são inicialmente bastante mais fracas e com pouca capacidade de resistência a ataques talibãs mas acabam por se vir a tornar extremamente úteis em alturas em que tenhamos de mandar soldados americanos para os USA.
O uso de drones não foi esquecido e a Slitherine implementou um sistema de surveillance com base nesses aparelhos que acabam por ser extremamente úteis na altura de enviar comboios de mantimentos (por exemplo) pelas estradas do Afeganistão.
Desde a Guerra da Coreia, na qual os USA (entre outros) lutaram contra o Império da Coreia do Norte (apoiado pela China), que os helicópteros ganharam particular importância nos cenários de guerra. Tratam-se de veículos de extrema simplicidade e rapidez de deploy de tropas e/ou mantimentos. Em Afghanistan ’11 essa importância é extremamente notória pois o jogo atribui particular importância ao sistema de suprimentos e os helicópteros são meios muito flexíveis para rapidamente entregar rações, munições ou gasóleo ás tropas no terreno (infelizmente são caros).
Realmente este é um ponto muito importante que convém ter particular atenção. Todas as unidades têm um numero de turnos disponíveis de suprimentos que, quando acabam começar a danificar o seu poder (quer de movimentação, quer de ataque/defesa). Dessa forma o jogador vê-se obrigado a ter em conta, não só o nível de suprimentos de cada unidade como também a distância da base.
Existe no entanto uma forma de contornar essas preocupações, que corresponde à criação de Postos Avançados (FOBs), e que correspondem a bases intermédias onde as nossas tropas podem agrupar e fazer o recuperarem forças e mantimentos. Os nossos Postos Avançados são eles próprios muitas vezes alvo de ataques repentinos dos Talibãs e cabe-nos uma defesa estratégica desses pontos de extrema importância. Por exemplo, construir secções de artilharia nos FOBs ajuda a manter os inimigos ao largo.
Por outro lado, a criação de hospitais de campanha e oficinas nos FOBs ajudam a manter veiculos em condições e tratar soldados.
Sendo um conflito tipicamente de guerrilha, o jogo consegue retratar de forma extremamente interessante a forma como as tropas norte-americanas muitas vezes são obrigadas a combater um inimigo invisível. A típica guerra do tipo do “bate e foge”. Basicamente as unidades atacantes podem surgir a qualquer momento e em qualquer zona (menos as de forte influência dos americanos), fazendo raides rápidos e incisivos.
Um outro aspecto característico deste tipo de conflito refere-se a acções insurreccionais como por exemplo, minagem de estradas e infra-estruturas, ou ataques a aldeias fieis ao regime. Tal como na realidade, os insurreccionais de tempo a tempo, minam estradas e terrenos e como tal, todo o avanço das nossas tropas tem obrigatoriamente de ser equilibrado e muitas vezes, lento. (sob a pena de se perderem homens e equipamentos).
Tal como na realidade a inferioridade militar dos guerrilheiros em questões meramente bélicas, é muitas vezes compensada pela estratégica acção militar e principalmente pelo impacto da acção psicológica nas populações locais e internacionais. É um tipo de conflito no qual invariavelmente se ganha mais com o aumento do raio de influência e apoio das populações locais e internacionais que com aspectos meramente militares. Existe uma forte componente táctico-diplomática do jogo.
Efectivamente, convém ter sempre presente que uma guerra também se ganha sem disparar armas. Tal como referi acima o jogo não vive apenas das acções militares e é extremamente importante manter as populações dentro da nossa área de influência. Apesar de bastar uma simples visita a uma aldeia com um pelotão de Special Forces para garantir o seu apoio, torna-se necessário ir um pouco mais além. Dessa forma a equipa da Slitherine incluiu a possibilidade de se construírem infraestruturas nesses aldeamentos (tais como torres de água). Por outro lado, também é extremamente bem visto pelas populações locais a construção de estradas que as liguem entre si e portanto os US Buffalos adquirem particular importência no jogo.
Uma outra forma de garantir mais um passo na direcção da vitória corresponde ao facto de poderem vir a haver eleições no Afeganistão durante o período e, através de uma pequena interferência da nossa parte podemos trazer para o nosso lado mais um pouco de satisfação e apoio das autoridades locais. De lamentar apenas a inexistência de outros tipos de influência juntos das autoridades administrativas ao longo do tempo.
Um aspecto importante das visitas aos aldeamentos afegãos que referi acima é o facto de, quanto mais próximos estiverem do “nosso” lado, maior a probabilidade de nos fornecerem informações úteis sobre o posicionamento das tropas inimigas, localizações de terrenos minados, dos esconderijos dos terroristas nas montanhas ou mesmo das plantações de papoilas de ópio (importantes para o seu financiamento).
Desta forma a componente diplomática acaba por ter uma importância encadeada pois, garantindo o apoio das populações, conseguimos dar caça aos terroristas e suas bases e com as vitórias no terreno conseguimos granjear mais apoios internacionais e nos Estados Unidos.
Mais atrás mencionei que os helicópteros (nomeadamente os Chinook) são caros. Isso leva-nos à forma como asseguramos novas unidades. A unidade de moeda (chamemos-lhe assim) são os Political Points. Esses Political Points correspondem a uma espécie de acumulador de pontos internacionais face ao conflito. Por exemplo, conseguindo forte adesão das populações locais, dá-nos PP. As vitórias militares dão-nos PP. No entanto, se perdermos unidades em combate, perderemos pontos. É como se fossem um medidor de status internacional da nossa actuação no terreno.
Quando pretendemos mandar vir reforços dos USA, gastamos também desses pontos e assim o jogo ganha um grande equilíbrio entre a parte diplomática e militar.
Um dos aspectos menos bons do jogo corresponde à pouca informação (pouco detalhada) sobre as unidades. Existe um poder de deslocação, de ataque, de defesas … mas poderia ir um pouco mais ao pormenor, como por exemplo em The Operational Art of War.
Quanto aos modos de jogo, além do modo campanha com as 18 missões distintas, Afghanistan ’11 apresenta-nos ainda um modo Skirmish altamente personalizável e no qual podemos alterar um grande conjunto de parametrizações.
Veredicto
Afghanistan ’11, para apreciadores do género, é um jogo bastante robusto e interessante. Trata-se de um titulo que consegue misturar, de forma inteligente, a componente militar e politica de um conflito. O facto de ser um conflito insurreccional e “fora de portas” acaba por trazer particularidades óbvias ao jogo que foram implementadas de forma simples mas eficaz, ficando apenas a sensação de que poderia ter sido investido um pouco mais de detalhe ao nível das unidades (sua composição em termos de equipamentos e armamento).