Nem sempre a complexidade é sinónimo de qualidade ou de mais-valia. Como afirma o dizer popular “fazer as coisas simples de forma simples” por vezes é a melhor solução.
Little Big Planet é um daqueles exemplos desta máxima no que toca ao reino dos videojogos. Trata-se de um jogo, simples, ingénuo, criativo, algo infantil mas … extremamente viciante e cativante. Gosto de acreditar que a maior parte de vós, que leem estas palavras já tiveram oportunidade de jogar Little Big Planet e como tal devem saber perfeitamente ao que me refiro.
Recentemente a equipa por detrás de Little Big Planet, a Media Molecule lançou um novo título para a Playstation Vita de seu nome Tearaway e mais uma vez o mote é … a simplicidade e criatividade.
E para os mais cépticos, não se iludam … a Media Molecule conseguiu novamente uma autentica obra-prima digital que certamente não deixará indiferente quem o jogar.
O Pplware já o jogou e gostou…
A história de Tearaway é, à semelhança do seu irmão mais velho Little Big Planet, diferente. O jogo coloca-nos no controlo de um mensageiro (sob a forma de envelope) que tem a missão de entregar uma carta … ao jogador. Sim, em Tearaway o jogador é o mensageiro e o destinatário ao mesmo tempo e esta é uma das características do jogo que fazem dele algo de transcendente. Ao colocar o jogador simultaneamente na pele de personagem e destinatário a Media Molecule conseguiu também fazer o que considero uma autêntica homenagem a todos os jogadores da PS Vita, de uma forma subtil mas existente. (e se formos mais além, também uma homenagem aos carteiros)
O jogo começa então com o aparecimento de nós próprios aos habitantes de Tearaway que desde logo se dirigem a nós como um “TU”, um ser supremo.
E é assim que o nosso herói (Iota no masculino ou Atoi no feminino) se lança numa aventura pela entrega da sua mensagem. O mundo de Tearaway é um mundo de papel … feito com produtos de papel e derivados e como tal apresenta uma beleza e dinâmicas muito próprias.
As árvores, as rochas, os personagens … tudo é feito de papel o que transmite ao jogo uma aparência algo infantil, algo inocente. E acaba por ser isso mesmo. O jogo não aspira a ser um desafio ultra exigente mas, à semelhança de Little Big Planet, pretende entreter e isso consegue-o e de forma muito satisfatória.
O jogo começa assim, de uma forma bastante simples e acessível. Basicamente, nos primeiros momentos do jogo apenas temos a possibilidade de nos movermos e interagir com alguns elementos do mundo de Tearaway. No entanto, à medida que evoluímos no jogo vamos descobrindo outras habilidades como saltar, por exemplo.
Trata-se de uma forma bastante competente de ir apresentando os controlos ao jogador e de ir aumentando subtilmente o grau de dificuldade.
Pelo caminho vamos apanhando confetis que se encontram espalhados pelos cenários (em alguns casos, encontram-se escondidos e só os encontramos com exploração exaustiva dos cenários, que são abertos à exploração). Esses confetis que apanhamos são importantes pois são como se tratassem de moeda e é com eles que compramos itens, materiais, cores para alterar o nosso personagem (e outras áreas do mundo de Tearaway).
Aliás, não posso deixar de mencionar a possibilidade de customização do nosso personagem. Tearaway permite-nos uma enorme capacidade de alterar o nosso personagem, seja nos aspectos normais (olhos, boca, …) como também nos materiais a usar. Por exemplo, em determinada altura surge-nos a necessidade de criar uma coroa para um personagem do jogo. É-nos apresentada a mesa de customização onde passamos à criação da referida coroa.
Primeiro temos de a desenhar e aqui a imaginação é que reina. Após o desenho escolhemos a cor e tipo do papel e por fim corta-se a coroa que o nosso amigo passa a usar.
Ao longo do jogo é-nos frequentemente pedido para redesenhar o visual de alguns personagens do jogo o que, face a estas inúmeras possibilidades de customização, disponibiliza ao jogador um enorme poder de dar asas à sua imaginação.
Existem inclusive, via PS Network, acesso a variados conteúdos que a comunidade gamer de Tearaway partilhou e na qual o jogador também pode partilhar.
Há ainda a possibilidade de o jogador aprender a criar em papel real os objectos e personagens que vê no jogo. De certa forma, trata-se do salto de Tearaway do virtual para a realidade.
No entanto, Tearaway não seria uma aventura se não tivesse adversários e pelo caminho vamos encontrando imensos Retalhos que nos tentam barrar o caminho. O combate é extremamente simples e violência é algo que não entra em Tearaway pelo que o jogo é facilmente aconselhável aos mais pequenos. O mundo de Tearaway, apesar de ser feito de papel, é um mundo bastante vivo e com movimento. Há flores que abanam, discos vinil que tocam (e com os quais podemos fazer efeitos diversos), há personagens em movimento, há cascatas de água de … papel.
O detalhe é extraordinário e Tearaway apresenta-se com um grafismo que da sua simplicidade apresenta a sua maior força.
A física do mundo de Tearaway e da maior parte dos seus objetos encontra-se também bastante bem implementada e consegue-se sentir quando passamos por cima de uma folha, ou pisamos um trampolim, ou rodamos um vinil em sentido contrário … é tudo muito simples mas correto, digamos assim.
Em alguns desses momentos em que usamos o painel táctil traseiro, surge uma representação do nosso dedo na posição exacta onde estamos a tocar, deixando assim transparecer a ténue linha entre o virtual e o real de Tearaway.
O uso do nosso dedo no ecrã traseiro é também uma arma para atacarmos os Retalhos que por vezes nos cercam.
No entanto, por mais que uma ocasião detectei problemas de colisão em rampas e outros objectos, sendo trespassados pelo meu personagem.
A dada altura é-nos dada uma máquina fotográfica e com os confetis que vamos apanhando, vamos podendo comprar variados filtros para a lente. A máquina fotográfica que ganha algum realce em Tearaway e que funciona de duas formas distintas. A primeira possibilita a partilha de fotos do estranho mundo de Tearaway e dos seus habitantes enquanto a segunda permite, através dos diversos filtros que se podem adquirir para a lente, dar cor a zonas ou personagens que ocasionalmente aparecem a preto e branco.
Uma das coisas que mais gostei em Tearaway foi o facto de conseguir imiscuir todas as potencialidades de PS Vita de uma forma simples e intuitiva num único jogo. Tratam-se da utilização das câmaras frontais e traseiras, do ecrã táctil, dos botões e gatilhos, do painel touch traseiro. Enfim … se a PS Vita possibilita então Tearaway aproveita.
Isto só por si não quereria dizer muito, mas Tearaway consegue incluir todas estas potencialidades no jogo através de mecânicas tão simples que fluem de uma forma extremamente natural.
Uma vez que encarnamos o “Deus” do Mundo de Tearaway, existem alturas em que a câmara traseira foca a nossa cara apenas para, dar uma cara ao Sol, criando assim a sensação de que somos efectivamente a entidade suprema no próprio jogo. Se sorrirmos o Sol, sorri… se chorarmos, o Sol chora. É uma forma de dar o poder e homenagear o jogador, enquanto isso mesmo … jogador.
Outro exemplo de interacção disponibilizada ao jogador surge quando descobrimos prendas embrulhadas pelo caminho e temos de as desembrulhar com recurso ao ecrã táctil através do qual puxamos os cordelinhos para abrir a prenda.
Este tipo de interfaces, além de usufruírem das características da Vita, consegue ainda criar um ambiente de extrema simplicidade e cumplicidade visual. Desta forma torna-se extremamente mais fácil compreender o Mundo de Tearaway que nos rodeia e quais as melhores interacções a adoptar.
O painel traseiro tem sido bastante subaproveitado nos jogos da PS Vita mas, felizmente, Tearaway não cai nessa rotina e dá-lhe uma vivacidade renovada. São inúmeras as situações em que temos de recorrer ao toque no painel traseiro e sempre implementadas de uma forma bastante intuitiva. Por exemplo, existem inúmeros trampolins que precisam de um empurrão com o dedo para que o nosso personagem (ou outra peça) salte. Outro exemplo, é quando temos uma peça que temos de empurrar para que o nosso personagem possa aceder ao outro lado de uma ravina e nestes casos temos de usar o dedo para empurrar essa peça.
São mecânicas simples, mas que encaixam perfeitamente, na simplicidade do jogo.
Apenas um reparo. Nos casos dos trampolins é por vezes difícil discernir a direcção na qual o personagem vai ser lançado e isso pode provocar algumas mortes inesperadas.
O facto de o jogo estar localizado para português é, sem dúvida uma mais-valia para o jogo, uma vez que se destina essencialmente a um público-alvo mais jovem. Felizmente houve essa preocupação que só tenho de louvar.
Também de louvar é a narração do jogo, em português e que se encontra bastante competente. No entanto, gostaria de ouvir mais um pouco de descontracção nas palavras do narrador e não uma voz tão séria.
A acompanhar a acção, Tearaway presenteia-nos com uma banda sonora juvenil, divertida mas que não aspira de certeza a ganhar um prémio.
Por fim, referir que, apesar de fácil o jogo vai aumentando o seu grau de exigência à medida que vamos avançando, indo cada vez, exigindo uma maior coordenação motora ou então pensamento cuidado.
Nota Final- 8,5
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A Media Molecule conseguiu com Little Big Planet o feito de criar um jogo de plataformas extremamente simples e divertido mas ao mesmo tempo, carinhoso e que apela ao sentimento. Tearaway representa mais uma aposta pioneira da Media Molecule mas oferecendo ao jogador uma experiência ainda mais pessoal e inovadora. Tearaway coloca o jogador no centro das atenções na melhor das maneiras. Se por um lado nos coloca ao controlo de um pequeno envelope a tentar realizar a sua missão num Mundo estranho feito de papel, repleto de plataformas e desafios, por outro lado confere ao jogador um papel superior, como ser omnipresente no jogo (numa homenagem ao próprio jogador). Como se não bastasse, Tearaway tem o dom de utilizar todas as principais características da PS Vita, num jogo memorável, quer pela sua história e personagens peculiares, quer pela forma imaginativa e criativa como foi desenhado e idealizado. Um dos melhores jogos de plataformas para a Playstation Vita.
Gráficos: 8,5
Mundo e personagens feito de … papel. Colagem da cara do jogador no meio da acção. Alguns problemas pontuais nas texturas.
Som: 8,0
Banda sonora simples e que não desilude. No entanto, também não fascina. Localização para o português de louvar.
Jogabilidade: 9,0
Jogo relativamente fácil, apropriado para o público-alvo a que se destina. Utilização de todas as potencialidades da Playstation Vita numa forma natural com o desenrolar do jogo.
Longevidade: 8,0
10 horas de campanha que podem aumentar caso o jogador esteja decidido a explorar todos os cantos dos diferentes níveis.