Ontem, dia 19 de Abril, decorreu no Instituto Superior Técnico (Alameda, Lisboa) a palestra “Implementação da Rede TDT”, levada a cabo pelo Eng. Carlos Lages, líder do Departamento de Plataformas de Televisão da Direcção de Plataformas e Engenharia de Serviços da Portugal Telecom (PT).
Numa organização conjunta do IEEE Communications Society Portugal Chapter e do POSTIT do Instituto Superior Técnico, esta palestra visou clarificar alguns aspectos importantes da implementação da TDT em Portugal, revelando detalhes técnicos e até mesmo limitações. Saiba mais acerca da tecnologia que provocará o apagão do sinal analógico já em 2012.
Um pouco de história
Carlos Lages começou por falar um pouco acerca da história da televisão em Portugal, desde o lançamento do primeiro canal português, a RTP, em 1957, a RTP2 em 1968, e as restantes irmãs RTP Madeira e RTP Açores em 1972 e 1976, respectivamente. Só em 198o se tornaram comuns as emissões a cores, com a sua estreia no Festival RTP da Canção desse ano. Nos anos 90 surgem os canais privados SIC (1992) e TVI (1993), seguindo-se a TV por Cabo em 1994.
Foi em Abril de 2009 que a TDT (Televisão Digital Terrestre) foi lançada pela PT, em termos comerciais. Prevê-se em 2012 o grande switch-off, o apagão do sinal analógico, por decisão da Comissão Europeia.
Características da rede TDT
Em termos de vantagens para o utilizador final, tem-se uma maior qualidade de imagem e áudio face ao sinal analógico, tendo acesso a uma rede de alta definição (HD) e a som Dolby Digital 5.1. Outros extras como o EPG (guia electrónico de programação), a Pausa TV e outros serviços interactivos também fazem parte deste pacote.
Numa rede TDT, tipicamente faz-se a ocupação de um canal em 8MHz. Com o sinal analógico a gestão do espectro de frequências é complicada, mas com a TDT é possível transportar nesse mesmo canal 6 a 7 canais de TV em SD (standard definition) ou 3 canais em HD (high definition), atingindo-se assim um grande ganho na ocupação do espectro. Depois do apagão do sinal analógico a TDT ocupará uma pequena fracção do espectro anteriormente ocupado pelo sinal analógico.
Os requisitos da rede TDT
Os requisitos do caderno de encargos referente ao concurso de 2008 exigia a cobertura de 99% da população e 85% com DVB-T. Pedia-se também um 5º canal e um canal HD, a inclusão dos canais RTP Açores e RTP Madeira e ainda funcionalidades interactivas como o EPG, Teletexto e Pausa TV. Adicionalmente, seria necessária a cobertura portátil (indoor) em centros históricos, dispensando a utilização de uma antena fixa anterior.
A proposta da PT incluiu a cobertura de 100% da população portuguesa e a cobertura indoor em 50 localidades. O formato de codificação escolhido foi o H.264 (mpeg4) e permite ainda 1 canal HD.
É utilizada multiplexagem estatística, isto é, a taxa de transferência de vídeo varia em função do tipo de conteúdo transmitido. “Um jogo de futebol necessita de maior taxa, ao contrário de um debate político, pois é mais parado”, sorri Carlos Lages. Os multiplexers utilizados realimentam os encoders de vídeo, para que estes últimos adaptem a taxa de transmissão. Cada sinal é codificado 3 vezes ate se atingir o formato ideal e chegar à nossa casa.
A arquitectura geral da rede TDT
A norma adoptada para a TDT em Portugal é a DVB-T. Segundo a Wikipédia:
A DVB-T transmite dados numa série de blocos discretos, a uma taxa de símbolos. A DVB-T é uma técnica de transmissão COFDM que inclui a utilização de um “intervalo de guarda”. Este permite o receptor lidar com situações de multicaminho forte.
Dentro de uma área geográfica, a DVB-T também permite uma rede de frequência única (SFN), onde dois ou mais transmissores dos mesmos dados operam na mesma frequências. Nesses casos os sinais de cada transmissor da rede SFN precisam de ser alinhados temporalmente com grande precisão, através de informação de sincronização presente no stream e informação temporal em cada transmissor utilizando GPS.
O tamanho do intervalo de guarda pode ser escolhido, sendo um trade off entre a taxa de transmissão e a capabilidade da rede SFN. Quanto maior for o intervalo de guarda, maior é o potencial da área SFN sem criar interferências inter-símbolo (ISI). É possível operar SFNs que não cumprem o intervalo de guarda se a sua própria interferência for planeada e monitorizada.
Carlos Lages afirma que um mesmo símbolo tem de ser emitido em simultâneo por todos os emissores. Para isso, cada trama tem uma tag que indica quando é transmitido cada símbolo. Qualquer sinal com mais de 60Km estraga a qualidade de emissão.
Planeamento e desenvolvimento da cobertura TDT
Para planear a cobertura geográfica com TDT foram seguidas diversas normas internacionais e feitos inúmeros cálculos adaptados à morfologia do país. Foi utilizada uma ferramenta de software chamada Chirplus BC para fazer as simulações necessárias.
A cartografia digital necessária foi fornecida pelo Instituto Geográfico do Exército. Tendo em conta as diferentes características do terreno nacional – floresta, água, campo aberto, zonas urbanas – foram usados algoritmos que aplicam níveis adequados de atenuação ou ganho.
Selecção dos locais para centros de emissão TDT
Diversas alternativas estiveram em cima da mesa, sendo o principal objectivo reutilizar as infra-estruturas de radiocomunicações já existentes, por forma a explorar sinergias e minimizar o impacto ambiental. A distribuição final dos centros de emissão TDT é a seguinte:
- Menos de 50% são locais onde já aconteciam emissões/retransmissões de teledifusão analógica, representando um potencial limitado.
- Mais de 50% dos locais partilham infra-estruturas existentes de radiocomunicações e outros serviços como estações de feixes hertzianos e redes móveis.
- Apenas 3% dos centros de emissão TDT foram construídos propositadamente.
Calendário de implementação da TDT
Foi em 29 de Abril de 2009 que 15 centros de emissão arrancaram um pouco por todo o país e já no fim de 2010, 153 centros de emissão TDT já se encontravam activos. Estão também em curso 3 pilotos para o apagão final do sinal analógico, previsto para 2012.
Transição do analógico para o digital
Desde 2009, as TVs vendidas no mercado português já trazem um receptor TDT incorporado, enquanto as TVs antigas se podem adaptar através de um aparelho adicional. Os aparelhos mais simples permitem apenas receber o novo sinal, já os mais caros fornecem as funcionalidades extras da TDT: guias de programação, Pausa TV, gravação para disco rígido e outras.
Em termos de antenas, as antenas de banda I e banda II não são compatíveis com a TDT. Já existem antenas compatíveis com a TDT, mas tenha cuidado pois algumas possuem configurações especiais que inibem a recepção da TDT. Também já estão disponíveis antenas interiores compatíveis. Aconselha-se a consulta do site http://tdt.telecom.pt para esclarecimento de todas as dúvidas relativas à transição.
Questões finais
Seguiu-se um período de questões onde a questão mais recorrente dirigia-se à depedência desta tecnologia da tecnologia GPS para se proceder ao sincronismo das tramas (ver a descrição do DVB-T acima). Questionado sobre este assunto, Carlos Lages admitiu a dependência total da rede TDT de um sistema GPS funcional. “Sem GPS é possível continuar a transmissão por algumas horas, mas nunca dias.”
No fim, um aluno questionou: “Se os americano deixarem de manter os satélites GPS, deixamos de ter TDT?”. Carlos Lages admitiu este facto, desvalorizando-o mesmo assim, ao afirmar que caso tal acontecesse, muito mais do que a televisão seria perdido. De qualquer das formas, “um receptor que esteja muito próximo de um emissor não irá sofrer perdas”.