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Invenções implementadas por computador

nunoArtigo elaborado por Nuno Gouveia, Examinador de Patentes do Departamento de Patentes e Modelos de Utilidade (DPMU)

São objetivos deste artigo, a divulgação e esclarecimento dos requisitos de patenteabilidade na área das invenções implementadas por computador e também a perceção de alguns contornos da já conhecida disputa “Apple vs Samsung”.

Serão afloradas temáticas numa perspetiva de elucidar o leitor e/ou inventor relativamente aos direitos de propriedade industrial, em particular as patentes, a gestão dos mesmos e vantagens que daí advêm se forem bem utilizados.

Invenção

O crescente desenvolvimento das “patentes de software” e os episódios quase diários da disputa “Apple vs Samsung”, são temas já bastante conhecidos do público em geral e que suscitam dúvidas inerentes ao processo de patenteamento do “software”, bem como ao teor do litígio que opõe Apple e Samsung. Importa então, esclarecer alguns conceitos de forma a promover a compreensão dos aspetos relacionados com as patentes, mas também de outros direitos de propriedade industrial.

Em primeiro lugar e antes de qualquer consideração sobre as temáticas acima divulgadas, é importante dar a conhecer o que pode ou não ser patenteado e que requisitos são necessários para tal. Assim, para que estejamos perante uma invenção, esta terá que ser obrigatoriamente uma solução técnica nova para um problema técnico específico, caso contrário não será considerada como tal.

Uma invenção, para ser objeto de patente, terá que ser nova, implicar atividade inventiva e ser suscetível de aplicação industrial. Ser nova significa que não está compreendida no estado da técnica, implicar atividade inventiva significa que, para um perito na especialidade, não resulta de uma maneira evidente do estado da técnica e ser suscetível de aplicação industrial, significa que o seu objeto pode ser fabricado ou utilizado em qualquer género de indústria ou na agricultura.

Existem ainda algumas limitações quanto ao objeto, nomeadamente:

Em suma, uma invenção, para ser patenteável, deverá não estar excluída, por falta de caráter técnico, ser nova, implicar atividade inventiva e ter aplicação industrial. Exercício análogo é realizado para as invenções implementadas por computador (IIC).

Invenções Implementadas por computador (IIC)

No que respeita às IIC, mais conhecidas do público em geral como “software”, deveremos optar pela primeira denominação uma vez que a própria definição de IIC é a forma correta de definirmos “software”. Assim, à usual expressão “patentes de software” corresponde a noção correta de “patentes para IIC ou “IIC patenteadas”. Entende-se então por IIC, toda a invenção cujo funcionamento envolve um computador, uma rede de computadores ou qualquer outro dispositivo programável de maneira que uma ou mais das suas características são concretizadas por um ou mais programas.

O leitor estará nesta altura a fazer a pergunta: “mas um programa de computador é ou não patenteável?”

Em geral, a resposta é afirmativa. Contudo se o programa for reivindicado enquanto tal, a resposta é negativa, ou seja, está excluído de patenteabilidade. De uma forma sintetizada podemos afirmar que:

O que significa então, “reivindicado como tal” e apresentar “caráter técnico”?

No primeiro caso, significa que está apenas a reivindicar-se características não técnicas, estando assim a matéria em causa excluída de patenteabilidade. No que diz respeito ao segundo caso, significa que apresenta um contributo técnico ou envolve considerações técnicas numa área tecnológica, requisito essencial para não ser excluído. A existência de características técnicas e não técnicas, é possível numa invenção. Contudo, para efeitos de patenteabilidade, apenas as primeiras serão consideradas.

O conjunto de reivindicações de uma patente ou pedido de patente é a parte mais importante, pois são estas que definem o âmbito de proteção. Em geral, os tipos de reivindicações relacionadas com as IIC, inserem-se em métodos, sistemas (ou sistemas computacionais), métodos implementados por computador e programas de computador. O primeiro raciocínio será escolher o tipo de reivindicação indicado para a invenção, ou seja:

E, assim sucessivamente, para as restantes opções acima identificadas. De resto, as formulações de reivindicação acima referidas não são obrigatórias nem excluem outras.

Assim, e em jeito de conclusão desta primeira temática, podemos afirmar que para se obter uma patente para uma IIC há que redigir as reivindicações em termos das características técnicas da invenção, com intuito de evitar a exclusão e ainda contrastar as características técnicas da invenção com o estado da técnica, evidenciando a novidade e atividade inventiva, que se entenda existir.

Importa ainda referir que todos estes procedimentos e regras, são aplicados no contexto da jurisdição portuguesa.

A disputa “Apple vs Samsung”

Este caso apresenta um excelente exemplo do quão importante é a gestão do portefólio de patentes de empresas que operam nos setores das novas tecnologias. Além das patentes envolvidas, são ainda base legal das queixas, desenhos ou modelos e marcas. Interessante também, é o facto da Samsung ser fornecedora de componentes da Apple, nomeadamente memórias, discos rígidos e processadores.

Esta disputa começou a 18 de abril de 2011, com a queixa da Apple contra a Samsung da qual fazem parte sete patentes, na sua maioria invenções implementadas por computador. Por seu lado a Samsung, em 28 de abril do mesmo ano, apresentou queixa contra a Apple, queixa essa alicerçada em 10 patentes relacionadas com transmissão de dados e comunicação “wireless”. De referir que as peças processuais de ambas as queixas estão disponíveis online.

Para se perceber de que modo estes litígios surgem, é necessário compreender a forma de atuação dos principais players e o modo como operam entre eles. Assim, as principais empresas nas áreas dos smartphones e tablets, desenvolvem entre elas standards técnicos que são licenciados numa lógica “justa e razoável”, sendo que esta “lógica” é a principal fonte dos casos que ocorrem nos tribunais, bastando para isso que alguma das empresas utilize, por exemplo, uma determinada tecnologia de outra empresa e se recuse a pagar para o efeito. É fácil entender, que num mercado como este, em que as vendas e a tecnologia associada aumentam de ano para ano, se constate um grande número de litígios, que mesmo com custos judiciais elevados, se tornam aliciantes, como forma de, em caso de sucesso, obter vantagem competitiva sobre os principais concorrentes.

Neste caso concreto, Apple e Samsung seguem estratégias algo diferentes. Enquanto a primeira se centra principalmente na identidade da sua marca, com alegações ao nível do design e estética dos seus produtos, a segunda opta quase exclusivamente pelas patentes. De facto, percebe-se que a Apple utilize vários direitos de propriedade industrial de forma a preservar o seu bom nome e a reputação da empresa, garantir a fidelização da clientela entre outros. Em relação à Samsung, opta-se por investimento significativo em I &D e formação de um portefólio de patentes que está neste momento perto das 30.000, sendo que cerca de 6000 patentes são relacionadas com telecomunicações.

Considerações Finais

Em qualquer caso, verifica-se a importância dos direitos de propriedade industrial. Concretamente, no caso das patentes, estas funcionam com trunfos ofensivos e defensivos para as empresas, impedindo cópias de produtos e defendo-as de possíveis queixas. É então de extrema importância, não só a gestão dos portefólios mas também a necessidade de uma vigilância tecnológica de forma a controlar toda a concorrência nas áreas específicas das mesmas, ou dinamizando-se, por outra via, a gestão dos direitos de propriedade industrial existentes, recorrendo ao licenciamento, contratos de transferência de tecnologia, etc.

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