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Entrevista: Wavecom, a líder nacional do wireless

O PPLWARE esteve à conversa com Nuno Marques da Wavecom, um dos oradores do Create Tech 2013, o evento organizado pelo Pplware e IPG centrado no tema “A internet espia-nos” e que trouxe à Guarda conceituados oradores da área de segurança de redes, wireless e cloud.

Depois da sua apresentação onde falou acerca da segurança nas comunicações wireless, conversámos um pouco com o Director Comercial da Wavecom para perceber o percurso da empresa, como se diferenciam no mercado e ainda questionar acerca de mitos como sobrelotação do canal de rede sem fios a 2.4GHz e os problemas da evolução pra 5GHz.

Pplware.com [P]: Sendo uns dos maiores players a nível nacional no toca tecnologia de redes sem fios, como e em que contexto nasce a Wavecom?

Nuno Marques, Wavecom [W]: A Wavecom nasce no ano 2000 pela mão de 4 investigadores do Instituto de Telecomunicações de Aveiro, mais especificamente no departamento de Rádio deste mesmo instituto. Viram uma oportunidade de mercado na altura em que se falava na instalação do 3G em Portugal, fazendo a parte do planeamento. Ou seja, para as empresas de planeamento de rádio que teriam feito a instalação do GSM, a parte 3G lançava novos desafios. Teria de haver novos players ou então reciclar os existentes para dar resposta ao mercado.

P: Ou seja, uma estrutura completamente diferente, com novos requisitos.

W: Sim, novas frequências, os tamanhos das células, a localização das estações-base, toda a parte de planeamento de rede. E como havia alguma urgência, pareceu aos sócios uma boa oportunidade. Foram apresentadas várias propostas a vários operadores mas, como havia alguma falta de experiência comercial, não conseguimos à primeira. Em 2001 já estavam alocados quase todos os contratos, falamos de contratos de centenas de milhares ou milhões de euros e também não é comum entregar projectos desta dimensão a empresas recém-criadas, nacionais, de Aveiro…

P: Tinha então tudo para correr mal…

W: Aconteceu o que seria normal acontecer. Nessa data eu não pertencia ainda à Wavecom, tinha uma empresa numa área completamente diferente de telecomunicações, apesar da minha formação académica ser essa mesmo, também Aveiro. Mas em meados de 2001 pareceu-me que as tecnologias wireless (já se falava muito de Wi-Fi e das ligações microoondas em particular) fazia todo o sentido. Conhecia os sócios fundadores da Wavecom e candidatei-me para a área comercial. Passado meio ano, conseguimos o primeiro contrato, com o Instituto Nacional de Estatística, um contrato muito interessante. Nessa altura não tínhamos dinheiro para comprar os equipamentos para o projeto e tivemos por isso de pedir um empréstimo…

Mas correu tudo bem, o INE ficou satisfeito com a ligação de 45 Mbit full-duplex, que, em 2001, era uma velocidade considerável (ainda hoje o é). Entretanto, surgiram mais contratos e os sócios deixaram os seus empregos para se dedicar exclusivamente à Wavecom. A empresa nunca teve investimento de fora, foi crescendo com o revestimento de capitais próprios, “devagar” mas sustentadamente. Sempre centrados na área wireless, Wi-Fi e ligações microondas, mais ou menos um misto, mas sempre com mais enfoque nas microondas.

P: Recorrendo a tecnologias e equipamento de terceiros…

W: Sim, integradores, até 2007. No entanto, sempre esteve no ADN da empresa a criação de produtos próprios, dado o percurso dos sócios fundadores.

Em 2007 somámos uma área de comunicações unificadas (VoIP) e em 2008 ganhámos o maior concurso público, penso que até à data, de comunicações unificadas em Portugal: colocar plataformas de voz sobre IP em todas as universidades, politécnicos e institutos de investigação que estão ligados à rede FCCN e com estas, suportar todas as comunicações de voz. A partir daí, passámos a ter uma bagagem muito importante nesta área, dado por um projeto muito ambicioso, cerca de 60-70 mil utilizadores. O projeto durou até 2011. Depois deste, e com tudo o que tínhamos aprendido, decidimos mudar de tecnologia, pois percebemos as limitações da que estávamos a usar e passámos daquilo que era uma topologia distribuída para um modelo mais centralizado, completamente adaptado ao modelo de cloud.

P: Poderia explicar melhor a diferença entre os dois modelos?

W:

No primeiro, cada universidade tem todos os sistemas necessários à função de telefonia. Se as outras universidades, no limite, deixarem de existir, aquela continua a funcionar. Isto é um modelo distribuído. Em 2011 achámos que o caminho não seria provavelmente este, pelo menos para cenários de grande escala, nomeadamente, operadores. O que faz sentido é o modelo centralizado, na cloud (privada ou não) de um operador, ou de uma grande Instituição, e, a partir daí, no cliente ficam apenas os terminais (telefones ou softphones). Gerir 500 máquinas com hardware próprio é muito complexo, tanto a nível de administração de rede, como do próprio hardware e, percebendo isto, e como as necessidades de outras instituições são muito similares, faz sentido centralizar a oferta num só sistema.

A nossa plataforma atual, é 100% cloud, é multitenant e por isso cada cliente tem o seu IPBX distinto,  e não está assente numa solução virtualizada, com todos os ganhos que esta arquitectura tem num ambiente de cloud. Em 2010 fizemos o spinoff dessa área e forma-se uma nova empresa, a Finesource, permitindo maior enfoque nessa área com pessoas dedicadas à mesma.

É política da Wavecom fazer spinoffs de empresas dentro do grupo, quer por tecnologias, quer por geografias. Por exemplo, temos uma área de IPTV que opera apenas no Brasil. Não sei se têm noção disso, mas somos dos países mais evoluídos do mundo no que toca a IPTV. Já no Brasil, o mercado está mais atrasado, e por isso, levámos uma pessoa daqui para aplicar o nosso conhecimento lá.

Voltando um pouco atrás, em 2007 abrimos uma empresa em Cabo Verde na sequência de um concurso internacional do Banco Mundial para interligar as várias ilhas do país por rádio (microondas). Esta foi a primeira experiência internacional consolidada da Wavecom. Depois, em 2012, abrimos uma operação no Brasil, em 2013 em Angola e Moçambique, e apesar de já estarmos em Espanha desde 2010,  é este ano que reforçamos a nossa operação em terras de “nuestros hermanos”.

P: Como avalia a facilidade da entrada nesses mercados internacionais, nomeadamente o espanhol, brasileiro e africano?

W:

A nossa experiência actual diz o seguinte: os mercados internacionais são muito difíceis, de uma forma genérica. A internacionalização da Wavecom seguiu o esquema típico de uma PME Portuguesa – vamos para sítios onde a nossa mais-valia seja óbvia – Angola, Moçambique, Cabo Verde e Brasil – e onde se fale a nossa língua. Mas depois, quando se vêm os negócios, isto pesa pouco, a cultura é o mais importante, e a nossa cultura não é obviamente igual á dos outros países. Por exemplo, na primeira reunião de um projeto no Brasil, tudo corre bem. Saio da reunião a achar sempre que fecho negócio, mas, infelizmente, o desfecho normalmente é o oposto. Isto é cultural: os traços dos povos refletem-se na própria legislação. A taxa alfandegária do Brasil pode ir até aos 80% e isto reflete o protecionismo da economia.

Normalmente, achamos que o espanhóis são mais fechados ao contrário dos brasileiros, mas não podíamos estar mais enganados. Pela legislação, pela moeda, pela similaridade do quadro regulatório, e obviamente, pela distância e pelos custos das respectivas operações, por tudo isto, o mercado que nos parece mais acessível e apetecível é o Espanhol, mesmo com a conjuntura actual.

P: O mercado africano é assim tão complicado/proteccionista como descreve?

W:

Não, o mercado africano é composto por mercados pequenos. Um dia um consultor nosso disse-nos “é uma estupidez abrir empresas em Cabo Verde”, (apesar de termos aberto lá uma empresa uns anos antes). Mas vejamos: o PIB da Madeira é 3 vezes superior ao de Cabo Verde, ninguém, ou quase niguém, pensa em abrir uma filial na Madeira. Apesar do  nível de corrupção ser baixo, quando comparado com o resto do Continente, como o Português, não deixa de ser um país (de gente boa!) com apenas 400.000 habitantes. Em Moçambique é a dimensão do país e o fato dos muito poucos recursos estarem distribuídos. É uma economia a sair de uma guerra muito longa, muito pouco desenvolvida.  Em Angola há dinheiro, há falta de tecnologia, mas é um mercado muito complicado. Acresce que quando há sucesso, é difícil retirar de lá os dividendos para outras geografias.

Portanto, começámos a internacionalização em 2007 e reforçámos esta aposta, e muito, em 2013.

Entretanto desenvolvemos há cerca de 1 ano um rádio próprio, o Wavesys, mas para nichos de mercado, como por exemplo, na energia eólica, para a comunicação entre turbinas. Com a mesma plataforma rádio, permitiu-nos criar um produto novo e inovador, em que depositamos fundadas expectativas, que consistem em sondas rádio, que são instaladas num determinado território e que permitem a, por exemplo, entidades reguladores, terem uma visão, em tempo real, de como está determinado serviço rádio, como por exemplo, TDT, 3/4G, Tetra, ou até FM.

P: Como é que são certificadas as vossas soluções?

W: Os equipamentos vendidos na Europa têm de ter uma certificação CE, cumprindo com a potência máxima transmitida. Somos também instaladores certificados pela ICTANACOM, o que nos dá responsabilidade acrescida. Se um rádio não cumprir e transmitir acima da potência permitida, a responsabilidade é nossa. Só temos de cumprir com o manual do hardware, garantindo que não se ultrapassa os 20dB P.I.R.E., por exemplo, no caso dos 2,4GHz. É a ANACOM que faz leituras periódicas ao espectro e detecta infractores. (E pode também usar as nossas sondas para o fazer…)

P: Fale-nos acerca do mito da banda de 5GHz, que não se pode usar por causa dos radares.

W: Há vários sistemas de radar que usam 5GHz, mas está previsto no protocolo, que obriga a implementação do DFS, Dynamic Frequency System. Nos canais de 5GHz existem 13 canais disponíveis, mas os radares, que operam nestas bandas, só ocupam 3 ou 4 destes. Quando há uma detecção de radar, pois são utilizados apenas em certas zonas, o DFS faz com que os rádios saltem automaticamente de frequência evitando assim a intreferência.

P: O que pensa acerca da questão da frequência 2.4GHz para as redes sem fios, quando se diz que está a ficar sobrelotada. E diz-se que o 5GHz tem problemas de penetração, principalmente dentro de interiores.

W: Os 2,4GHz estão realmente sobrelotados, no entanto, os sistemas Wi-Fi têm agora uma funcionalidade chamada Band Steering, que detecta se o dispositivo cliente suporta 5GHz. Se tiver, obriga-o a mudar para essa frequência, libertando os 2.4GHz. E é curioso como praticamente todos os smartphones e tablets já suportam essa frequência. Fizemos recentemente um teste no Estádio da Luz e conseguimos passar  cerca de 80% para os 5GHz, ficando apenas 20% a ocupar o canal de 2.4GHz. Esta pode ser uma forma de, pelo menos em ambientes controlados, aliviar a pressão sobre os 2,4GHz.

Em relação à penetração, de facto os 5GHz tem células mais pequenas, e as paredes e outros obstáculos, têm um impacto maior na propagação, pelo que, o caminho é aumentar a densidade de AP’s.

P: Muito obrigado pela disponibilidade em conceder esta entrevista ao PPLWARE.

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