Um dos mistérios que a Apple está a tentar resolver é onde param 1,4 milhões de iPhones desaparecidos e, se é verdade o que disseram hoje vendedores de produtos digitais em Pequim, a resposta é que estão na China.
“Quando voltares dos Estados Unidos trazes-me um iPhone para a China?”, é o pedido que incentiva o mercado negro e define o marketing “de boca a ouvido” que leva o iPhone até à China onde o telefone da Apple nunca entrou no mercado.
Turistas, pequenos empresários e contrabandistas de produtos electrónicos compram os iPhones nos Estados Unidos e enviam-nos para a China, onde os piratas desbloqueiam o “cadeado digital” do telefone original para que possa funcionar nas redes chinesas , antes de instalarem aplicações locais.
Esta rede de pirataria explica porque é que a Apple afirma que vendeu cerca de 3,7 milhões de iPhones no ano passado, mas tem apenas 2,3 milhões registados nas redes dos parceiros da empresa nos Estados Unidos e na Europa.
No fundo, é um regresso a casa – as fábricas chinesas produzem iPhones em série que são enviados para os Estados Unidos e para a Europa, mas milhares destes aparelhos regressam à China pelas vias do mercado paralelo onde são vendidos junto das cópias também produzidas no gigante asiático.
“Este telefone é um espectáculo”, conta Daniel Pan, um informático de 22 anos, que teve a sorte de ficar com “uma das melhores invenções dos últimos tempos” que o seu melhor amigo trouxe dos Estados Unidos.
Sem a intervenção do amigo, Pan teria que pagar cerca de 3500 renminbi (cerca de 320 euros) para arranjar o telefone da Apple na China, mas estaria a dar dinheiro a um contrabandista e arriscava-se a ter um iPhone falso.
Sem lançamento oficial no gigante asiático, onde a Apple goza de enorme popularidade, o iPhone enfrenta dois problemas: o contrabando e a falsificação.
“Não há dúvida de que muitos dos iPhones acabam fora do país”, afirmou Charles Wolf, um analista da Apple que trabalha na Needham & Company, consultora financeira norte-americana.
Estas formas alternativas de adquirir o iPhone na China travaram o esforço da Apple para introduzir gradualmente o telefone no mercado chinês com um contrato de exclusividade, com o produto que é a última tendência do consumo em tecnologia a desafiar a estratégia da própria empresa.
As negociações entre a Apple e a China Mobile, o maior operador de telecomunicações do mundo com mais de 350 milhões de subscritores, caíram em Janeiro passado, atrasando o lançamento oficial do iPhone na China.
Os vendedores chineses conseguem o produto através de fornecedores que compram o iPhone nos Estados Unidos e o enviam para a China.
Em cidades como Pequim ou Xangai, um iPhone custa cerca de 3878 renminbi (cerca de 357 euros) numa loja de aparelhos electrónicos, onde também é possível desbloquear o telefone e introduzir-lhe um software em chinês por apenas mais 175 remninbi (cerca de 16 euros).
As cópias são a outra ameaça ao iPhone na China – equipas de pesquisa e desenvolvimento começaram já a desmontar o telefone para copiar e roubar o design e software do produto pouco tempo depois do seu lançamento noutros países.
A televisão chinesa anuncia já o Ai Feng (que em chinês significa Amor Louco), um telefone com um nome semelhante ao do iPhone e que custa 873 renminbi (cerca de 80 euros).
Desbloquear o telefone é uma violação ao contrato de compra da Apple, mas na China não infringe directamente a lei.
O mercado paralelo chinês vem demonstrar as falhas do modelo de negócio da Apple, segundo analistas, que defendem que o abandono do sistema de bloqueio do telefone e a autorização para que os compradores subcrevam o operador que preferem, em qualquer país, podia aumentar as vendas.
“O modelo está ameaçado”, observou Charles Wolf, o analista, acrescentando que “se a Apple vendesse o telefone desbloqueado e sem operador exclusivo, a procura podia ser muito superior”.
Para a Apple, a venda de iPhones às pessoas que os introduzem na China é uma fonte de receitas, mas mesmo assim a empresa perde dinheiro porque os contratos exclusivos com as empresas de telecomunicações originam uma receita anual por subscritor posterior à venda do telefone.
Alguns vendedores das imitações dos iPhones admitem que o produto é uma fraude, mas estes clones são sofisticados e com diversas funções iguais às do iPhone, semelhanças que parecem ser suficientes para agradar os amantes chineses do iPhone original.
“Os meus amigos têm inveja de mim”, afirma Pan, contando que “eles acham fantástico eu conseguir ter um iPhone”. LUSA