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Análise Kingdom Come: Deliverance (Xbox One)

Um dos jogos que temos acompanhado com bastante interesse e curiosidade foi lançado em meados do mês passado. Refiro-me a Kingdom Come: Deliverance, um RPG histórico a cargo da Warhorse Studios.

Tal como aqui ou aqui tivemos ocasião de salientar, o jogo remonta à Época Medieval apresentando portanto uma aventura histórica baseada em factos verídicos.

O Pplware já teve ocasião de viajar até às terras medievais da Boémia de Kingdom Come: Deliverance e eis as nossas impressões.


Todos os apreciadores de obras literárias que misturem conteúdos romanceados com contextos históricos reais, irão encontrar aqui uma oportunidade de viajar no tempo de uma forma bastante límpida, fluída e coerente.

Estamos em pleno século XIV numa altura em que o território europeu se encontra em convulsão. Quando o Imperador Carlos IV (Rei da Boémia e da Germânica) morre, deixa um vazio no poder ocupado pelo seu herdeiro por direito, Wenceslaus IV do Luxemburgo. No entanto, o reinado de Wenceslaus é fraco e recheado de polémicas, o que faz com que o seu meio-irmão Sigismund se chegue à frente para reivindicar o Reino. Dessa forma Wenceslaus é deposto por Sigismund e o território invadido por uma força militar (composta por tropas germânicas). Este é o ponto de partida da nossa história em Kingdom Come: Deliverance.

Nós encarnamos Henry (nome pouco comum para aquelas paragens) que é filho de um ferreiro na calma e tranquila aldeia de Kalitz. Após uns momentos de habituação ao nosso personagem eis que a invasão chega a Kalitz e as tropas de Sigismund massacram os habitantes locais matando os pais de Henry, à sua frente. Nesse preciso momento, Henry faz uma jura de vingança, começando a nossa aventura.

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Tal como referi acima, Kingdom Come: Deliverance é um RPG. Contudo trata-se de um RPG histórico e baseado em fatos verídicos, deixando desta forma um aviso que quem procurar magia, maná, dragões e outros elementos típicos noutros RPGs, não o irá encontrar aqui.

Esclarecido este ponto, o jogo apresenta uma dinâmica muito próxima doutros RPGs. Existe uma (ou várias) missões da história principal e vão surgindo variadas outras missões secundárias dadas pelos diversos NPCs presentes nos locais por onde passamos.

E em relação aos diferentes locais por onde passamos, a Warhorse Studios fez um trabalho fantástico na criação do Reino da Boémia. Os prados, as florestas, as pradarias, as montanhas … está tudo tão ricamente povoado e pormenorizado que dá prazer em parar para apenas observar o que nos rodeia. Por outro lado, e sempre assente em fundamentos históricos, a Warhorse a Boémia com inúmeras aldeias, castelos e lugarejos de uma forma magnifica, sendo que cada local é diferente e com habitantes distintos. Tudo isto gera uma enorme sensação de diversidade mas acrescentando também credibilidade ao universo do jogo.

No entanto, tudo isto acarreta um custo alto que corresponde ao facto de, com alguma frequência, se notarem quebras de framerates chegando mesmo a alguns freezes de ecrã.

Tal como em qualquer RPG é imperativo interagir com os NPCs que vamos encontrando, sendo uns mais importantes para a história que outros mas sempre com algo a acrescentar. Novamente a WarHorse teve particular atenção neste capitulo, pois a forma de falar muito assemelha-se bastante à da época (tirando alguns palavrões mais recentes). Outro aspecto no qual o jogo faz esse trabalho excecional é na distinção social entre nobreza e a plebe sendo claramente percetível essa diferença, seja pelas roupagens ou pela forma como as personagens falam.

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Tendo já referido o fantástico grafismo do jogo, gostaria de realçar um dos seus expoentes máximos que corresponde à altura do lusco-fusco, quando as sombras se começam a gerar antes do anoitecer, e os últimos raios de sol se vão desvanecendo.

E por falar em anoitecer, Deliverance apresenta um ciclo dia noite bastante sólido, não só no aspecto visual mas, e acima de tudo, em tudo o que isso afeta, como por exemplo na vida das pessoas da Boémia. E isto acaba invariavelmente por nos afectar também e a forma como interagimos com o mundo que nos rodeia. Por exemplo, se durante determinada missão tivermos de falar com alguém mas já for de noite, provavelmente essa pessoa encontrar-se-à a dormir, exigindo que voltemos de manhã.

Esta dinâmica afeta toda a vida em Kingdom Come, influenciando assim a forma como gerimos o nosso tempo. Aliás, a gestão do nosso tempo é de nossa inteira responsabilidade e apesar de existirem missões com um timing próprio, não deixamos de poder vaguear pela paisagem e perder algum tempo a contemplar a beleza da Boémia.

Uma vez que o realismo é um objetivo assumido de Kingdom Come e o jogo se trata de um RPG, a questão da saúde é importante. Existem inúmeros alimentos que vamos encontrando no decorrer do jogo, desde frutas, carne de caça, produtos comercializados, (ou não!!), tendo cada qual os seus efeitos próprios e que são potenciados quando cozinhados. Um pormenor interessante é a introdução de um nível de frescura nos alimentos que influencia a sua qualidade e dos efeitos. A alimentação é crucial em Deliverance pois se não comer, o nosso personagem fica fraco podendo no limite, morrer.

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Uma outra característica de Kingdom Come: Deliverance e que faz deste jogo único é o fato de nos colocar numa perspectiva de primeira pessoa no controlo de Henry (estilo FPS). A cavalo, a andar, a lutar, a perspectiva é na primeira pessoa o que, num jogo medieval, se afigurava como um grande desafio. Apesar de aqui ou ali apresentar alguns problemas, o desafio foi ultrapassado.

Cavalgar em Kingdom Come: Deliverance é simples mas requer prática. O controlo do animal em simultâneo com o controlo do movimento da cabeça de Henry assemelha-se a pilotar um caça aéreo e requer alguma prática no uso dos dois manípulos que os controlam.

No entanto é o combate o aspeto mais delicado do controlo de Henry. O combate na idade média gira em redor de três momentos distintos: luta com os punhos, luta com espadas (a pé ou a cavalo) e o uso de arcos e flechas. Tanto a luta corpo a corpo como com espadas, machados e afins é pouco natural a principio mas com o decorrer do jogo, e a ajuda do tutorial acaba por se tornar simples e fluído. O importante, no ataque ou na defesa, é o ângulo. Isto pois temos um controlo total sobre o movimento dos braços (esquerdo para escudo e direito para espada) e sobre o ângulo em que o iremos mover. Isto é extremamente importante pois os adversários atacam e defendem da mesma forma, levando o jogador a ter que avaliar a melhor postura durante o combate.

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Por outro lado, o uso de arco e flecha afigura-se como o aspecto mais complicado. Sem mira no uso do arco e flecha cabe ao jogador avaliar bem o ângulo de tiro. Sendo bastante complicado, vai melhorando com a prática e acaba por recompensar o jogador pois quanto mais usa o arco, mais cresce a prática no seu uso e subimos de nível em Archery, a skill responsável por esta arma e que permite desbloquear novos perks.

E por falar em armas, o jogo tem as principais armas da época e o seu manejo está visualmente aprimorado. Contudo a sua efectividade vai variando com o tempo e com o seu uso, sendo necessário reparar ou trocar por novas de tempos a tempos. Uma curiosidade é o facto de, sendo nós filho de ferreiro, conseguimos amolar as nossas armas quando encontramos um ferreiro.

Convém ter em mente também que as armas variam na sua efetividade consoante diferentes tipos de armadura. Por exemplo, as espadas e adagas são mais perigosas contra inimigos que usam vestes de linho, enquanto que os machados são mais efetivos contra armaduras mais sólidas.

Uma curiosidade interessante e realista corresponde ao uso do capacete que, além de proteger a cabeça acaba por limitar o campo de visão.

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O mundo de Deliverance é enorme e com muitos pontos de interesse, como referi acima, dando enorme prazer o simples fato de vaguear pelo campo. No entanto, à medida que vamos descobrindo novas zonas vamos também desbloqueando pontos de Fast Travel. Estas viagens rápidas decorrem no mapa do jogo, mostrando o nosso personagem a percorrê-lo até ao destino. Estas deslocações têm um aspecto interessante: podem haver interrupções (uma emboscada, por exemplo) fazendo com que saltemos para a ação.

E por falar no mapa, encontra-se bastante simples e sóbrio. Não mostra informação a mais e é extremamente útil na identificação dos pontos importantes das quests ativas. Há contudo, uma situação que poderia estar melhor. Quando combatemos ou caçamos é comum o inimigo ou animal morrer longe o que sendo a Boémia uma terra com muita vegetação, seria útil uma indicação no mapa.

Um outro exemplo de ajuda que faria sentido seria a introdução de uma forma de realçar os objectos com os quais podemos interagir, pois na maior parte dos casos é necessário parar e passar o cursor numa zona especifica do objecto, sendo fácil passar por objetos sem dar por eles.

E um dos objectos com os quais mais interagimos são as caixas ou contentores que podemos abrir. Apesar da maior parte estar acessível, em muitas ocasiões é necessário fazer lockpicking. Este é de longe o ponto mais irritante no jogo de tão difícil que está implementado. A ideia consiste em usar os dois analógicos em simultâneo para controlar a fechadura e a ferramenta (cada qual com uso de pressão adequada). A ideia é boa mas na prática torna-se quase impraticável e tornando-se irritante.

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Tendo influências tão fortes de RPG, não fazia sentido não apresentar um sistema de evolução do personagem e dessa forma existem variadas categorias nas quais podemos evoluir Henry: Combate, Lockpicking, Caça, Discurso, Botânica … são variadas e assentam todas na mesma ideia que é, à medida que vamos repetindo com sucesso determinada acção, vamos ganhando experiência e evoluindo nessa categoria. Por exemplo, se apanharmos muitas flores, avançamos rapidamente em Botânica. Se andarmos muito a cavalo evoluímos em Cavalgar. E essas evoluções permitem por sua vez o desbloqueio de perks especificas que se podem tornar bastante importantes em determinadas alturas do jogo, como por exemplo o desbloqueio de poderosas combos no uso da espada ou maior capacidade de convencer os NPCs.

E isso é importante, pois em cada aldeia, Henry vai conquistando maior ou menor simpatia com a população local. Acima de tudo isso está relacionado com as nossas conversas com os habitantes locais e com o facto de fazermos missões secundárias que nos são dadas por aldeões. Essas missões são variadas quanto baste para fazer o jogador espairecer da sede de vingança de Henry e, na maior parte dos casos, encontram-se bem inventadas, encaixando claramente no espírito do jogo e da época.

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Um dos aspectos mais curiosos de Deliverance é o facto de Henry, aos poucos e poucos se ir revelando como um personagem algo complexo, com sentimentos e motivações muitas vezes dependentes das nossas decisões, sendo interessante ver a sua evolução ao longo do jogo. E esse é um fator importante em Kingdom Come: liberdade de escolha. É essa liberdade que permite ir moldando o perfil de Henry e influenciar o seu estar nas terras por onde vai passando. Por exemplo, durante um combate com um malfeitor poderemos ser misericordiosos ou implacáveis, ou ter um tom mais agressivo ou mais harmonioso nos diálogos… tudo depende da forma como o jogador prefere criar o seu Henry e que irá ter influências no mundo que o rodeia.

Não posso deixar de referir o trabalho de vozes que se encontra bom e carrega de intensidade a maior parte dos diálogos. Também o capitulo sonoro não foi descurado em Kingdom Come e as composições criadas para o jogo apontam claramente para os sons da época, com o recurso a instrumentos como flautas, violas e outros instrumentos clássicos. Muito boa a banda sonora que acompanha a aventura.

Sem dúvida que a Warhorse Studios fez os TPC nas aulas de História pois em Kingdom Come: Deliverance existe uma das melhores e maiores Enciclopédias Históricas que jamais algum jogo apresentou.

Por fim, dois pontos menos bons. É pena que não haja um sistema de personalização do nosso personagem pois acredito que poderia ter acrescentado muito mais correspondência intima entre o jogador e a própria história. Por outro lado, a inexistência de opção Gravar é pouco compreensível.

 

Veredicto

Desafio superado! A forma como Kingdom Come: Deliverance foi idealizado apresentava alguns desafios complicados a serem ultrapassados, referindo-me mais concretamente ao combate (especialmente na primeira pessoa). A WarHorse Studios ultrapassou-os com distinção resultando num jogo que se abre numa aventura rica, vasta e repleta de fatos históricos, apesar de alguns problemas que persistiram (dos quais as abruptas quebras de framerates são as mais notórias).

Concluindo e resumindo, Kingdom Come: Deliverance tornou-se num jogo facilmente recomendável para todos os apreciadores de RPGs medievais e que procurem conteúdo com realismo histórico.

Kingdom Come: Deliverance

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