Cientistas sugerem que as correntes podem ajudar a limpar o lixo do mar. Como?
O dinamismo das correntes oceânicas poderá, em breve, ajudar a resolver o problema do lixo nas águas da Terra. Esta é, pelo menos, a teoria de um grupo de cientistas.
Pelo mundo, existem inúmeras extensões de plástico e outros resíduos flutuantes. De facto, encontrar estratégias para a sua limpeza tem sido um processo complexo: os custos do combustível, os riscos ambientais, a desmedida dimensão do problema...
Apesar de a solução não ser simples, um estudo recente sugere que se pare de perseguir o lixo e se deixe o oceano tratar do assunto.
Por via de dados de satélite e anos de acompanhamento das correntes oceânicas, os cientistas identificaram áreas onde os detritos se acumulam naturalmente.
Estes pontos críticos formam-se através de padrões específicos de correntes e podem ajudar a limpar os mares de forma mais eficiente.
Com esta informação, podemos deixar que as correntes façam o trabalho. Em vez de os barcos andarem a arrastar lentamente e a gastar combustível, podem manter a sua posição e manter as redes fixas num local onde as correntes afunilam e agregam os objetos à deriva.
Afirmou Rodrigo Duran, investigador do Planetary Science Institute, teorizando que esta estratégia pouparia "tempo, dinheiro e combustível às equipas de limpeza".
O coautor do estudo e especialista do Laboratório Nacional de Tecnologia Energética dos Estados Unidos, Rodrigo Duran, explicou como as antigas ideias da física ajudam, agora, a descodificar o comportamento dos oceanos.
Isaac Newton foi o primeiro a resolver problemas de trajetória ao tentar compreender os corpos celestes que orbitam num campo gravitacional. Mas ele pensava em termos da forma como a Terra orbita o Sol.
Ao longo dos séculos seguintes, foram utilizadas novas ferramentas e ideias para resolver este tipo de problemas extremamente complicados. No entanto, só nas últimas duas décadas é que estas ferramentas foram adaptadas às correntes oceânicas de superfície e ao vento, o que traz um nível adicional de complexidade.
Esclareceu Rodrigo Duran, explicando que o oceano está sempre a mudar, "não é como as equações da gravidade, que se mantêm previsíveis durante muito tempo".
Usar a natureza a nosso favor
Para estudar as correntes imprevisíveis, os investigadores analisaram mais de 20 anos de observações por satélite e utilizaram dados de "drifters" - dispositivos flutuantes que se deslocam com as correntes e registam as suas trajetórias.
A partir deste conjunto de dados, a equipa descobriu 3,5 milhões de Transient Attracting Profiles, conhecidos como TRAP.
Estes TRAP não são manchas de lixo fixas, mas antes zonas temporárias onde as correntes se fundem e atraem objetos flutuantes. Estas zonas são criadas quando dois ou mais remoinhos - sistemas de correntes circulares - interagem de formas específicas.
Os remoinhos combinados podem reter resíduos durante vários dias.
Além disso, em média, os TRAP mantêm-se ativos durante cerca de seis dias antes de se dissolverem ou deslocarem. Ainda assim, essa janela oferece uma oportunidade para uma limpeza direcionada.

Fonte: Kunz, L., Griesel, A., Eden, C., Duran, R., and Sainte-Rose, B.: Transient Attracting Profiles in the Great Pacific Garbage Patch, Ocean Sci., 20, 1611–1630, 2024.
Entre os muitos TRAP identificados, alguns destacam-se pela sua eficiência. A equipa de investigação descobriu que a configuração mais estável e comum envolve quatro remoinhos, numa disposição especial.
Isto corresponde a quase 60% dos casos. Estes são comuns porque são os mais estáveis.
Este equilíbrio ajuda os TRAP a manterem a sua forma e a funcionar de modo mais fiável, oferecendo uma forma previsível de planear estratégias de limpeza.
Assim, em vez de reagir ao caos do oceano, os cientistas podem trabalhar com os padrões da natureza e preparar as redes com antecedência.
Apesar de o estudo se centrar na limpeza dos resíduos oceânicos, as aplicações vão além disso: ajudar em emergências ou em previsões científicas, orientar missões de salvamento, localizar derrames de petróleo e monitorizar perigos aéreos.
A colaboração por detrás desta investigação une instituições da Alemanha, dos Estados Unidos e dos Países Baixos.
A Universidade de Hamburgo lidera a ciência dos dados e a The Ocean Clean Up, uma organização sem fins lucrativos dos Países Baixos que desenvolve tecnologias de remoção de plástico, avança com soluções práticas.